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Serafina

Ronda, a cidade que encantou Madonna, Orson Welles, Ernest Hemingway e Rilke

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Depois de provocar pânico com sua transmissão radiofônica de "A Guerra dos Mundos" e de estrear no cinema com "Cidadão Kane", Orson Welles chegou ao fundo do poço. Mais precisamente ao fundo do poço da casa do toureiro Antonio Ordóñez, em Ronda, na Andaluzia. É nesse poço que está enterrada a caixa de madeira com as cinzas do cineasta, exatamente como ele queria.

Welles (1915-1985) foi muito amigo de Ordóñez (1932-1998) e um apaixonado por touradas e pela Espanha –tanto que chegou a filmar sua própria versão de "Dom Quixote", clássico da literatura espanhola de 1605, escrito por Miguel de Cervantes. O americano costumava dizer que viveu em Ronda os momentos mais felizes de sua vida. Talvez por isso tenha pedido para ficar por lá mesmo depois de morrer.

Mas a localização da cova do cineasta é um enigma tão grande quanto o Rosebud em "Cidadão Kane". "Orson quem?", perguntam os rondenhos, quando indago sobre o lugar onde ele estaria enterrado. Hoje, pouca gente na cidade ouviu falar do tal tipo ou do tal poço. Ele fica numa finca (fazenda) chamada Recreo de San Cayetano, no km 6 da estrada entre Ronda e Campillos, fechada para visitas.

Mas a caseira, Hortensia, acostumada com curiosos, me deixa acompanhá-la até o jardim e o poço onde Welles se encontra desde 1987 e onde está escrito "al maestro de maestros" (ao mestre de mestres).

Do cineasta americano há quase nada para se visitar além da fazenda (que nem é lá muito visitável), mas Ronda é uma linda cidade com outros tantos atrativos menos mórbidos e que, há séculos, atrai turistas de todo canto do mundo.

A cidadezinha de 36.000 habitantes fica no alto de um despenhadeiro de cem metros, no meio do caminho entre Sevilha e Málaga, e seu centro histórico se espalha no topo de duas montanhas ligadas pela impressionante "ponte Nova", que de nova nada tem: feita nos anos 1700, de pedra e com 98 metros de altura, foi considerada uma obra-prima da arquitetura na época.

Já no século 16, Ronda, lá no alto e de difícil acesso, era vista como um ótimo lugar para se esconder. Assim, virou ponto de encontro de uma legião de bandoleiros (bandidos errantes com um quê romântico). As lendas dos bandoleiros atraíram escritores. E as histórias dos escritores atraíram turistas. Bandoleiros, escritores e turistas também chegaram por conta da "cultura
taurina".

Ronda é considerada um dos berços da tauromaquia moderna (quando a disputa "vertical", homem em cima do cavalo e touro no chão, passa a ser "horizontal" –com o toureiro também no chão, olho no olho com o bicho). E tem uma das praças de touros mais antigas da Espanha, de 1785. É lá que acontece, em setembro, a Corrida Goyesca, em que os toureiros vestem trajes inspirados nas pinturas de Goya.

Michelle Obama e a filha Sasha visitaram Ronda e conheceram a arena há alguns anos. Foi também lá que Madonna gravou o clipe de "Take a Bow", em 1994. Mas o turista das touradas mais ilustre foi o escritor americano Ernest Hemingway (1899-1961).

Apaixonado pelo tema, o autor de "O Velho e o Mar" chegou à cidade por conta do toureador Cayetano Ordóñez (1904-1961), pai do Antonio da finca lá do início. Assim como Orson Welles, Hemingway virou amigo da família de toureiros, e era chamado por Antonio de "papá Ernesto".

TOURADAS LITERÁRIAS

E papá Ernesto usou a cidade como inspiração para seus livros "Por Quem os Sinos Dobram" e "Death in the Afternoon", dedicado às touradas. Em troca da publicidade, Ronda deu a um de seus caminhos mais bonitos, com vista para o desfiladeiro, o nome de "Paseo de E. Hemingway". Sobre Ronda, o autor escreveu: "É para onde você deve ir se um dia for à Espanha em lua de mel ou se você se enganchar com alguém. A cidade inteira e tudo que você conseguir avistar é um cenário romântico".

Se Hemingway não é bem um ícone do romantismo, usemos outro escritor para justificar os encantos de Ronda. "Tenho procurado em todos os lugares pela cidade dos meus sonhos e finalmente encontrei-a em Ronda. O espetáculo desta cidade... separada pelo estreito, profundo desfiladeiro do rio, corresponde à imagem daquela cidade revelada em meus sonhos", escreveu o poeta austríaco Rainer Maria Rilke (1875-1926).

Rilke morou e escreveu em Ronda por alguns meses, entre 1912 e 1913, no hotel Reina Victoria. O quarto dele era mantido como um minimuseu rilkeano até que, um ano atrás, o hotel se modernizou. Diz o gerente que muitos hóspedes ainda pedem para ficar no quarto do poeta (o 208), mas dele pouco restou além da linda vista. As sobras de Rilke descansam num cantinho do lobby, atrás de um vidro –uma mesa, uma cadeira e uma estante (com livros decorativos, que não eram dele).

Mas, se o poeta deixou pouco mais que uma mesa como recordação, Ronda deu um jeito de fincar o visitante ilustre por ali. Pois se chama Rilke a imobiliária mais famosa da cidade, que vende e aluga casas, apartamentos e fincas –com ou sem poço.

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