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Serafina

Amigo de Dalí e beijado por Stálin, Paco Rabanne fala sobre sua vida

Michel Bechet
Paco Rabanne
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Este texto foi originalmente publicado na Serafina de agosto de 2010

Calça e camisa de seda preta -cor que ele adora por concentrar todas as cores- e, no peito, à esquerda, a medalha da Légion d'Honneur (Legião de Honra), mais alta condecoração francesa criada por Napoleão Bonaparte. Foi assim que Paco Rabanne, 76, o anticonformista e paradoxal arquiteto, designer de moda, pintor e artesão, me recebeu. Sem dúvida, uma força da natureza.

Bonito, interessante, sedutor, é um dos poucos, nesse estranho mundo que envolve moda e perfume, que tem uma personalidade vibrante, diz o que quer e, às vezes, também se contradiz, o que dá mais charme a seu personagem. Esse espanhol não conheceu seu pai, fuzilado pelas forças do ditador Franco. Foi criado pela avó, feiticeira, pela mãe, que trabalhou com o estilista Balenciaga, e por duas irmãs, uma muito ajuizada e outra um pouco louca.

Foi pela vida fazendo de tudo: da escola de belas-artes aos sapatos de Roger Vivier, trabalhou para Balenciaga e Courrèges e foi o primeiro -e único- a criar moda com materiais que, até então, nunca haviam sido usados: pedaços de espelho, metal, fibras ópticas. Quando encurtou as saias, foi logo imitado por Courrèges.

O que ele mais gosta mesmo de fazer é inventar, e seus vestidos enlouqueceram as mulheres nos anos 60. Vestidas por Rabanne, elas não podiam se sentar. Mas isso não foi um problema: elas ficaram em pé, e as festas se tornaram ainda mais animadas, com as Barbarelas circulando e dançando. Chanel o chamava, com sarcasmo, de "costureiro metalúrgico".

Paco adora as mulheres; afirma que são os seres mais inteligentes, mais intuitivos e mais belos do planeta, infinitamente superiores aos homens, que são uns bobos. Para ele, perfume é objeto de primeira necessidade, e cada mulher deve saber qual é o que mais condiz com sua personalidade. Como saber? Qualquer uma é capaz disso, diz ele, não deve nem precisa se aconselhar com ninguém, mas existem perfumes para as diversas horas do dia e também para cada ocasião. E mais: elas não devem ser fiéis a nenhum, nem a nada.

Qual é seu ponto forte? Ele responde, sem pensar: minha conta no banco. Um pouco adiante, diz que não liga, absolutamente, para dinheiro. Mora sozinho numa pequena casa em frente ao mar, encravada nos rochedos da Bretanha, na França, e seus vizinhos e amigos são os pescadores da região. Seu ponto fraco? Não tem; defeitos também não e ponto final. Salvador Dalí, seu amigo, considerava Paco o segundo gênio da Espanha. O primeiro Dalí, é claro. Se é feliz? Ele prefere dizer que não é infeliz e que sua maior felicidade é o trabalho. Segundo Rabanne, alguns homens apenas suportam a vida, e alguns, privilegiados como ele, a vivem em sua plenitude. Acorda todos os dias antes do amanhecer para ver o sol nascer, o que considera uma ode à vida e ao amor, e agradece por estar vivo. Conversa com Deus e, muitas vezes, já o ouviu rir. Sua religião são todas, e sua nacionalidade também. Já fez a volta ao mundo 38 vezes e, em cada país em que esteve, sentiu-se em casa. Não acredita na sorte, e sim no trabalho. No momento, pinta -também- e diz que os artistas são como o vento, mudam o tempo todo.

A coisa que mais o aborrece é a estupidez humana; mas logo pensa e se corrige: não existem pessoas burras, apenas pouco informadas. E volta a seu assunto preferido: as mulheres. Diz que todas são um monumento, um universo, que têm uma dimensão divina. Para um homem que foi beijado no rosto por Stálin aos 14 anos (seu pai era general, e sua mãe, uma das fundadoras do Partido Comunista da Espanha), a política não interessa. Mas emenda dizendo que seu novo perfume, Lady Million, é puro Sarkozy. O que quer dizer isso? E quem sabe?

Paco Rabanne diz que só voltará a fazer moda, quando existirem tecidos -que já estão sendo criados em laboratórios- nos quais os pássaros voem, os desenhos se mexam; nisso, sim, ele gostaria de trabalhar.

E as mulheres devem ter um estilo? Nãããão, nunca, jamais. Um dia elas acordam se sentindo uma burguesa dona de casa, em outro querem ser uma executiva, à noite desejam ser louras fatais e extravagantes, prontas para seduzir todos os homens. Nesse dia, devem pintar seus cabelos, usar um vestido muito sexy e sair com as piores intenções do mundo. Se existe uma mulher com um só estilo, é urgente que ela mude.

Qual é o pecado imperdoável, em matéria de elegância? Ele não hesita um só minuto ao responder: andar na moda. Nada pior no mundo do que seguir a moda. Rabanne diz que jamais venderia seu nome, "que horror!", mas sabe que, depois de morrer, algum histérico vai se apossar dele. Sobre a moda atual, refere-se a Galliano dizendo, sem escolher as palavras, que ele deveria voltar ao circo de onde veio ou ao asilo de loucos de onde deve ter fugido.

E, mostrando sua ousadia na provocação e seu culto ao paradoxal, ao ser indagado se as mulheres perfumadas atraem os homens, é categórico: é claro que sim. E, quase em seguida, confessa que, para ele, o melhor perfume que existe no mundo inteiro é o cheiro das axilas suadas de uma mulher loura.

Paco Rabanne é corajoso; nos anos 90, podia ser visto todos os domingos num café em frente ao Beaubourg anunciando que o mundo iria acabar. Não tem medo de ser contraditório, e é isso que o faz singular e único, em seu eclético mundo.

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