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Profissionais de outros países precisam enfrentar barreiras culturais

Metade dos profissionais expatriados tiveram dificuldade para se adaptar ao novo país, diz uma pesquisa da consultoria Global Line, especializada em treinamento intercultural, que falou com 210 multinacionais em 2016.

Entre os principais problemas estão as diferenças culturais, que surgem nas interações e no modo de trabalhar dos outros povos.

Por isso, antes de deixar o país de origem, o profissional deve ser preparado para assimilar e aceitar as diferenças, afirma o psicólogo João Baptista Brandão, doutor em administração e professor de gestão de pessoas da FGV (Fundação Getulio Vargas).

"Ter disposição para tirar aspectos positivos da cultura do país de destino é fundamental para que se tenha uma boa experiência, e isso acontece com quem procura estabelecer consensos com os colegas", afirma.

O contador britânico Matthew Birtwistle, 26, está no país há um ano e meio e estranhou o fato de os brasileiros serem menos diretos que os ingleses na hora de relatar um problema no trabalho.

"Já fui um pouco abrupto em um comentário durante uma reunião e achei que soei grosseiro para os profissionais daqui, mas procurei entender essa particularidade local", conta.

A doutora em antropologia e sociologia Carmen Migueles, professora da FGV, explica que, culturalmente, o brasileiro "doura a pílula" por medo de ofender seus colegas e gestores, traço causado pelo histórico de autoritarismo vivido pelo país ao longo de sua história.

"Temos mais dificuldade de demonstrar autonomia do que povos anglo-saxões, por exemplo, acostumados a uma proximidade maior das estruturas de poder", afirma.

Marcelo Justo/Folhapress
SAO PAULO, SP, BRASIL, 13.abr.2017, 11h30: O britanico Matthew Birtwistle, consultor de M&A da Deloitte, está ha um ano e meio no Brasil. (Foto: Marcelo Justo/Folhapress) "CARREIRAS*
O britânico Matthew Birtwistle, que trabalha no Brasil há um ano e meio

Não se trata de conflito, mas da distância natural entre as culturas, diz o doutor em administração e professor da FIA (Fundação Instituto de Administração) Joel Dutra.

"Pode haver um desconforto, mas a solução passa por aproximar mais esses profissionais, para que todos transitem melhor no ambiente a despeito das diferenças", avalia Dutra.

O próprio gestor tem um papel vital nessa integração, segundo Brandão, da FGV. "Ele deve agir como uma espécie de zelador da área, mediando as interações em caso de ruído na comunicação."

Para a empresa e para o funcionário, essa troca é positiva na medida em que pode indicar aperfeiçoamentos de comportamento e de processos de trabalho, afirma Sócrates Melo, administrador e gerente regional da consultoria de RH Randstad.

"É preciso propor que os colegas aprendam entre si, já que um traz características que o outro não conhece."

O jeito brasileiro pode ter suas vantagens. A economista colombiana Amalia de la Torre, 40, que passou por Venezuela, México e Alemanha antes de se instalar no Brasil, há quatro anos, tornou-se próxima dos colegas na empresa onde trabalha, em São Paulo, e atribui o bom relacionamento à cultura local.

"Aqui, o ambiente é mais amistoso, e fica gostoso trabalhar. Na Alemanha, tínhamos campanhas constantes para melhorar o clima organizacional porque as pessoas se relacionavam pouco", diz.

Mas é preciso saber separar diferenças culturais de conflitos interpessoais, afirma a psicóloga e consultora Andréa Fuks, da Global Line.

"Não dá pra dizer que todos que compartilham a mesma nacionalidade são iguais, já que até entre brasileiros pode haver interferências de cultura", diz Fuks.

*

JEITINHO BRASILEIRO
Como trabalham os profissionais no país, segundo pesquisa

DISTÂNCIA DO PODER
O Brasil é um país com forte hierarquia. Nas empresas, é comum ter um gestor que assuma responsabilidade total sobre o trabalho da equipe. São valorizados símbolos de status ou poder, que indicam a posição social e necessidade de mostrar respeito

CÓDIGOS CLAROS
A sociedade tem estrutura elaborada de regras e sistemas jurídicos mas, no trabalho, são permitidos momentos de relaxamento, como a pausa para o cafezinho e os almoços fora da empresa. Os brasileiros prezam por um bom relacionamento com os colegas

COLETIVISMO E INDIVIDUALISMO
No trabalho, buscam a construção de relações de confiança por muitos anos e optam por conhecer os membros da equipe antes de fazer negócios. Para se comunicar, priorizam conversas mais longas e com grande contextualização das atividades propostas pela área

VITÓRIA OU EQUILÍBRIO
A lógica de "vencedores" e "perdedores" tem menos espaço por aqui, já que o consenso entre os membros da equipe é mais valorizado e a negociação em geral privilegia o "ganha-ganha"

ORIENTAÇÃO DE LONGO PRAZO
A adaptação rápida às mudanças de regras, que pode ser vista como o 'jeitinho', é importante na hora de criar soluções para problemas surgidos nas funções e no setor em que a empresa está inserida

O levantamento foi feito com base em dados de 70 países colhidos a partir de 1967 usando pesquisas internacionais sobretudo da IBM, onde Hofstede trabalhou

27%
dos expatriados foram indicados para a experiência por seus próprios gestores

41%
relatam ter vivido os maiores obstáculos culturais entre o primeiro e o terceiro ano no novo país

63%
apontam a possibilidade de avanço na carreira como motivo para aceitar uma transferência internacional

46%
dos expatriados no Brasil ocupam cargos de gerência

Fonte: Geert Hofstede, psicólogo e consultor holandês e Global Line, consultoria de mobilidade para profissionais

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