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análise

Arquitetura de luxo tem janelas amplas e incentiva relação com a cidade

O luxo continua a ser o que é exclusivo, mas o que é de fato exclusivo mudou muito na última década. Na moda, o fenômeno aconteceu antes: a produção manual por especialistas foi substituída por linhas de montagem na Ásia, e as marcas emprestaram suas iniciais para qualquer acessório. Que luxo é esse?

No mercado imobiliário, o nome imponente (em inglês ou francês) do residencial lançado ontem vira o nome massificado (e cafona) de hoje.

Na construção em série, onde o suposto "chateau" tem apenas uma mão de tinta bege para imitar a pedra parisiense, os materiais acompanham a identidade fake: "piso que imita madeira", "porcelanato que imita ladrilho hidráulico" e uma série de imitações para quem as aceita.

Diante desse luxo desidratado, algumas poucas incorporadoras (Idea!Zarvos, Moby, Huma, Vitacon), de empresários jovens, começaram a desafiar o mercado nas áreas nobres de São Paulo. Com venezianas móveis e janelas e caixilhos maiores, para permitir a entrada de mais luz, no lugar das janelinhas minúsculas afrancesadas que na verdade só queriam economizar vidro. Artistas voltam a colaborar com projetos, que dispensam muros altos e grades.

A relação desse novo luxo com o entorno não é acidental. Para o arquiteto André Scarpa, do escritório Nitsche Arquitetos, "o luxo está na localização e relação franca com a cidade". "Acho um luxo sair pela porta de casa e estar na cidade sem precisar entrar num carro e dirigir por horas", disse à Folha.

Algo parecido com uma definição feita anos atrás por Paulo Mendes da Rocha, o mais premiado arquiteto vivo do país, que dizia que a única "virtude incontestável" de uma casa era o endereço. "Quando está próximo de tudo, eis aí uma residência invejável. Se eu te disser o que tem na minha casa, isso não a torna invejável. Se eu digo que está no bairro de Ipanema, tudo muda."

"Boas plantas, espaços amplos, conversa com a rua", diz Matteo Gavazzi, da imobiliária Refúgios Urbanos. "Vivemos sempre comprimidos, quem tem espaço bem pensado é rei."

QUESTÃO DE ESPAÇO

O luxo já teve que satisfazer outras demandas. Nos anos 40, quando surgiram os primeiros residenciais de luxo da cidade, o morar coletivo ainda era malvisto e a classe alta estava acostumada com casas sem economia de cômodos. Para combater o preconceito, ofereciam espaços generosos e materiais de qualidade. Projetado em 1944, o edifício Prudencia, na avenida Higienópolis, com seus apartamentos com mais de 300 m², projeto de Rino Levi e azulejos e jardins de Burle Marx, era o parâmetro de excelência em que o mercado de luxo se inspirava.

No mesmo ano, em plena Segunda Guerra, tinham sido lançadas as torres São Thomaz, Santa Rita e Santa Virgília, na esquina da recém-alargada avenida São Luís com a Praça da República (na primeira torre, as unidades têm 400 m²). Ao contrário do moderníssimo Prudência, as torres com nomes de santos seguiam o estilo neoclássico, com adornos afrancesados, uma linguagem já conservadora à época, mas que geraria diversos filhotes.

Se hoje o neoclássico está em baixa, vale a pena checar como o luxo tem se manifestado de Punta del Este a Miami, de Pequim a Tóquio. Saem os vidros fumês e espelhados que não dão transparência, nem visibilidade, e os terraços enormes com guarda-corpos desajeitados, e entram prédios com jardins abertos, materiais inusitados ou em novas leituras, trabalhos de artistas que os diferenciam do vizinho.

Desde os anos 2000, quando Nova York deixou para trás os recordes de violência e o m² se valorizou, os projetos residenciais voltaram a se diferenciar, depois de décadas de edifícios-commodities.

Os suíços do escritório Herzog & De Meuron, que tinham acabado de fazer o museu Tate Modern, em Londres, desenharam o 40 Bond, no bairro NoHo, com terraços-jardins, janelas de vidro do chão ao teto, e um portão escultural de alumínio retorcido, que faz um cruzamento entre as curvas de Gaudí com o grafite nova-iorquino.

Em março, começou a ser ocupado o Via 57 West, do badalado escritório dinamarquês BIG, um arranha-céu triangular com um pátio vertical escavado entre os andares. O luxo está na arquitetura _ todos os 709 apartamentos são de aluguel, e tem de quitinetes a quatro dormitórios.

Ao lado dele, começou a ser construída uma torre de luxo de 35 andares projetada pelo português Alvaro Siza. Ambos estão no bairro de Hell´s Kitchen, que já foi uma violenta e feia área da cidade. Hoje muita gente quer seu pedaço de luxo ali.

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