Entre o aeroporto internacional de São Paulo e a rodovia Presidente Dutra, fica um marco da habitação social do país. Projetado pelos arquitetos João Batista Vilanova Artigas, Fábio Penteado e Paulo Mendes da Rocha, o Conjunto Habitacional Zezinho Magalhães Prado, conhecido como Cecap, é uma cidade dentro da cidade de Guarulhos.
São 62 blocos, formados por dois prédios de três andares cada um, que totalizam 3.720 apartamentos. No projeto modernista, pensado por Artigas em 1967, o bairro teria infraestrutura completa de educação, saúde, lazer e comércio.
"A ideia não era só fazer apartamentos populares, mas unidades de convivência que promovessem o contato entre as pessoas", diz o historiador Tiago Guerra, um dos autores do livro "Cecap Guarulhos - Histórias, Identidades e Memórias".
A obra, no entanto, foi entregue incompleta pela Cecap (Caixa Estadual de Casas para o Povo). Os primeiros moradores, que chegaram ao bairro em 1972, não tinham sequer equipamentos básicos, como iluminação, asfalto, comércio e transporte público. No entorno, só mato.
A construção foi finalizada somente no início dos anos 1980. A previsão inicial, de 24 condomínios, não se confirmou. Foram erguidos dez, que têm nomes de Estados brasileiros: São Paulo, Paraná, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Espírito Santo, Bahia, Sergipe e Alagoas.
| Acervo pessoal | ||
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| Vista aérea do Cecap, ainda em construção, em 1975 |
Uma das principais reivindicações dos moradores, que eram contra a chegada do aeroporto internacional à região em 1985, não foi atendida. "O conselho comunitário organizou um abaixo-assinado para tentar impedir a construção. Havia o medo de que caíssem aviões ali ou que o barulho estourasse as janelas", conta Guerra.
Naquele momento, o crescimento urbano de Guarulhos chegou até o bairro, que deixou de ser uma área periférica e passou a se integrar à cidade. E isso provocou uma mudança no perfil dos moradores do Cecap.
"Concebido para ser moradia para a população de baixa renda, acabou não atingindo seu alvo", diz o arquiteto e urbanista Daniel Carlos de Campos, da Universidade de Guarulhos. "Hoje, a maioria das pessoas que vivem lá são de classe média."
PROJETO
A característica principal da arquitetura do Cecap é a planta livre dos apartamentos, que têm 64 m² e paredes internas independentes da estrutura do prédio.
Isso permite que os moradores adaptem mais facilmente a configuração do imóvel às suas necessidades.
"O apartamento é um caixote que você deixa do jeito que quiser", diz a dona de casa Maria Aparecida Elisiario, 58, moradora do condomínio Rio Grande do Sul. Quando se mudou para lá, em 2002, ela diminuiu o número de dormitórios de três para dois, com tamanhos diferentes.
"Se visitar dez apartamentos, cada um terá uma divisão diferente", afirma Guerra.
Outro ponto importante é a sustentação dos edifícios por pilotis -pilares de concreto armado que criam um vão livre no térreo. "O objetivo de Artigas era dar permeabilidade ao edifício e promover o convívio", diz Campos.
Atualmente, o espaço é utilizado como estacionamento pelos moradores.
"Mesmo com os carros, dá para visualizar os outros blocos. O Cecap é diferente de outros conjuntos de prédios, porque não é uma cidade de pedra, é aconchegante", afirma a empresária Rosana Feriotti, 52, moradora há 29 anos do condomínio Alagoas, que fica em frente à praça Mamonas Assassinas.
BERÇO DOS MAMONAS
Na praça, inaugurada em 1996, ano em que a banda de Guarulhos morreu em um acidente aéreo, há um monumento de uma mamona verde com um rosto sorridente, o símbolo do grupo.
Nenhum dos cinco integrantes -Dinho, Júlio, Bento e os irmãos Sérgio e Samuel- morou no Cecap, mas o bairro era o ponto de encontro deles, conta Ana Paula Rasec, irmã do tecladista Júlio.
Foi numa praça do Cecap que o vocalista Dinho conheceu Bento, Sérgio e Samuel, durante um show do trio, ainda na banda Ponte Aérea.
"A vida deles como Utopia [primeiro nome da banda] foi lá. Como Mamonas Assassinas, eles levaram Guarulhos e o Cecap para todo o Brasil."