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Em nova portaria, Moro abranda regras de deportação sumária de estrangeiro

Medida aumenta prazos de recurso e defesa para 5 dias e proíbe repatriação que coloque em risco vida do estrangeiro

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Brasília

Após sofrer críticas de especialistas em direitos humanos e em políticas de imigração, o ministro da Justiça, Sergio Moro, publicou nova portaria que ameniza as regras de deportação de estrangeiros considerados perigosos pelo governo brasileiro.

A medida, publicada nesta segunda-feira (14) no Diário Oficial da União, amplia de dois para cinco dias o prazo de apresentação de defesa, ou seja, de deportação sumária.

Além disso, o prazo para apresentação de recurso de uma decisão aumenta de um para cinco dias.

O novo texto também proíbe a repatriação ou deportação que possa colocar em risco a vida ou integridade pessoal do estrangeiro, trecho não contemplado na redação anterior.

A portaria não se aplica a residentes no Brasil que estão com registro regularizado.

Sergio Moro, Ministro da Justiça - Amanda Perobelli/Reuters

As regras se aplicam a estrangeiros que tenham praticado atividades que desrespeitam os princípios constitucionais, como envolvimento em terrorismo, associações criminosas, tráfico de drogas e exploração sexual de crianças e adolescentes.

Pela portaria, o estrangeiro será “pessoalmente notificado” para que apresente defesa ou deixe o país voluntariamente. 

Segundo o Ministério da Justiça, os motivos de deportação sumária poderão ser avaliados “pela autoridade migratória por meio da difusão ou informação oficial em ação de cooperação internacional”.

A Lei de Migração estabelece que o deportando tem prazo não inferior a 60 dias para regularizar a sua situação migratória. A deportação pode ser executada se a regularização não ocorrer nesse período.

Há um dispositivo na regra que prevê a redução desse prazo para as pessoas que tenham "praticado ato contrário aos princípios e objetivos dispostos na Constituição Federal", mas não havia especificação sobre como determinar quem se enquadra nesse item.


COMO É?

A deportação é tratada na Lei de Migração (13.445, de 2017). Após notificação, o deportando tem prazo não inferior a 60 dias para regularizar sua situação migratória. Se não se regularizar nesse período, a deportação pode ocorrer. O prazo pode ser reduzido para pessoas que tenham "praticado ato contrário aos princípios e objetivos dispostos na Constituição Federal". Mas a lei não especifica como determinar quem se enquadra nesse item.

COMO FICA?

A portaria de Moro regulamenta a Lei de Migração. Pela nova norma, ficam sujeitos à deportação sumária estrangeiros suspeitos de terrorismo, de integrar grupo criminoso organizado ou organização criminosa armada; suspeitos de tráfico de drogas, pessoas ou armas de fogo; e suspeitos de pornografia ou exploração sexual de crianças e adolescentes. A primeira versão da portaria de Moro também incluía membros de torcida com histórico de violência em estádios, mas esse trecho foi suprimido pela norma publicada nesta segunda-feira (14). O estrangeiro alvo da medida deverá apresentar defesa ou deixar o país voluntariamente no prazo de até cinco dias —inicialmente, o limite era de 48 horas. O recurso, que tem efeito suspensivo, precisa ser protocolado em até cinco dias.


A primeira portaria foi editada em julho e gerou polêmica. Ela foi publicada em meio às divulgações do site The Intercept Brasil, que revelou, em trocas de mensagens privadas entre o ex-juiz da Lava Jato e procuradores da força tarefa, ingerência do atual ministro da Justiça sobre as investigações da operação.

O jornalista americano Glenn Greenwald, do Intercept Brasil, é cidadão dos Estados Unidos e mora no Rio de Janeiro. Ele é casado com um brasileiro, o deputado federal David Miranda (PSOL-RJ), com quem tem dois filhos adotivos, também nascidos no país.

A portaria também foi questionada pela PGR (Procuradoria-Geral da República). A então procuradora-geral Raquel Dodge pediu a suspensão da norma por considerá-la inconstitucional. 

A ação está com a ministra Rosa Weber, do STF (Supremo Tribunal Federal), que ainda não proferiu uma decisão. 

Como a nova portaria de Moro revoga a anterior, advogados ouvidos pela Folha argumentaram que essa ação da PGR pode perder o objeto. 

Especialistas em imigração e em casos de deportação e extradição dizem que as mudanças promovidas por Moro na nova portaria não resolvem problemas identificados na primeira versão. 

Primeiro, eles argumentam que o alargamento do prazo de defesa para cinco dias é insuficiente para garantir o amplo direito de defesa dos envolvidos. 

Para Marcelo Bettamio, advogado criminalista que atuou em processos de extradição, o novo prazo é "exíguo". "Eles estão criminalizando a imigração no Brasil", diz. 

Bettamio também argumenta que a lei de migração não prevê regulamentação e que, portanto, Moro não poderia tratar de questões migratórias por meio de uma portaria.

Camila Asano, coordenadora de programas da ONG Conectas, vai na mesma direção. "O prazo [de defesa] de fato aumentou, mas é um aumento significativo que permite a ampla defesa e o devido processo? Na nossa visão, não."

Ela critica ainda o que considera uma redação "subjetiva" que dá amplo poder para a autoridade migratória brasileira decidir quem é enquadrado como perigoso e, logo, passível da deportação. 

Na portaria original, por exemplo, Moro estabelecia que eram tidos como perigosos os estrangeiros "suspeitos" de envolvimento em terrorismo, grupo criminoso organizado, tráfico de drogas, armas ou pessoas, pornografia ou exploração sexual infantojuvenil e torcida com histórico de violência em estádios.

No texto publicado nesta segunda, além de excluir as torcidas violentas, o ministro da Justiça usa a expressão "pessoa sobre a qual recaem razões sérias que indiquem envolvimento" nessas atividades.

"Você ainda deixa na mão do agente migratório a arbitrariedade para aplicação de uma medida tão dura", afirma a coordenadora da Conectas.

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