Descrição de chapéu The New York Times

Grande depósito de lixo do Pacífico contém 87 mil toneladas de plástico

Estudo quantificou a dimensão do lixão oceânico: três vezes o estado da Bahia

Amostras plásticas coletadas pela The Ocean Cleanup's Mega Expedition, em 2015

Amostras plásticas coletadas pela The Ocean Cleanup's Mega Expedition, em 2015 Divulgação

Livia Albert Ripka
New York Times

No oceano Pacífico, entre a Califórnia e o Havaí, a centenas de quilômetros de distância de qualquer cidade grande, garrafas plásticas, brinquedos, aparelhos eletrônicos quebrados, redes de pesca abandonadas e milhões de outros fragmentos e resíduos estão flutuando na água --pesquisadores calculam que o volume de lixo em questão é de pelo menos 87 mil toneladas.

Nos últimos anos, essa notória pilha de sujeira veio a ser conhecida como a Grande Ilha de Lixo do Pacífico, um cemitério oceânico móvel ao qual objetos de uso cotidiano chegam arrastados pelas correntes marítimas. O plástico termina por se desintegrar em forma de partículas minúsculas, muitas das quais são comidas por peixes e podem vir a ingressar em nossa cadeia alimentar.

Um estudo publicado nesta quinta (22) pela revista Scientific Reports quantificou a dimensão completa do grande depósito de lixo oceânico: ele é entre quatro e 16 vezes maior do que se calculava anteriormente, ocupa uma área equivalente a três vezes o tamanho do estado da Bahia, e abriga um total estimado em 1,8 trilhão de pedaços de lixo.

Lixo plástico é encontrado no oceano; há toda sorte de material: brinquedos, capacetes, restos de construção e redes de pesca, por exemplo
Lixo plástico é encontrado no oceano; há toda sorte de material: brinquedos, capacetes, restos de construção e redes de pesca, por exemplo - Divulgação

No passado, a região era vista como uma espécie de sopa feita de microplásticos quase invisíveis, mas os cientistas agora acreditam que o lixo encontrado na região exista principalmente em forma de pedaços maiores. E eles dizem que o crescimento do volume de lixo é "exponencial".

"É uma situação bastante alarmante, porque esse lixo todo fica bem distante da porção continental dos EUA", disse Laurent Lebreton, principal autor do estudo e oceanógrafo da Fundação de Limpeza Oceânica, uma organização sem fins lucrativos que está desenvolvendo sistemas para remover lixo do mar, e bancou o estudo. "Não há pessoas por perto, e ainda assim aparecem objetos de uso cotidiano, como caixas e garrafas." Em resumo: plástico e mais plástico.

No final do terceiro trimestre de 2015, Lebreton e seus colegas mediram o volume de detritos plásticos na área afetada, recolhendo lixo por meio de redes e voando por sobre o local para tirar fotos aéreas. Ainda que eles também tenham encontrado vidro, borracha e madeira, 99,9% daquilo que os pesquisadores recolheram do oceano era plástico.

Eles também recolheram total surpreendente de redes de pesca plásticas abandonadas, disse Lebreton. Essas "redes fantasmas" respondem por quase metade do peso total dos detritos na área. (Uma explicação está na proximidade entre a área em que o lixo se acumula e águas bastante usadas por pescadores; outra é que o material de qual são feitas as redes foi projetado de maneira a resistir aos efeitos do mar, e por isso ele se preserva por mais tempo do que outros objetos.)

"Encontramos alguns objetos inesperados", disse Lebreton. "Entre eles havia brinquedos plásticos, o que me entristeceu, porque alguns deles podem ter vindo como resultado do tsunami no Japão", ele disse, em referência ao maremoto de 2011, que arrastou milhões de toneladas de destroços para o oceano.

Os pesquisadores também encontraram a capa plástica de um Game Boy dos anos 90, capacetes de construção civil e uma tampa de vaso sanitário, além de diversos objetos com inscrições em japonês e chinês. Lebreton disse que outros objetos traziam "pequenas marcas de mordidas de peixes".Algumas tartarugas marinhas apanhadas perto dos destroços estavam comendo tanto plástico que ele respondia por cerca de 75% de sua dieta, de acordo com a fundação.

Método tradicional de captura de lixo nem sempre é eficaz
Método tradicional de captura de lixo nem sempre é eficaz - Divulgação

MASSA FLUTUANTE

O lixo flutuante não forma uma ilha. Depois de ser descoberto, no final dos anos 90, o Grande Depósito de Lixo do Pacífico passou a ser visto na imaginação popular como uma ilha ou até mesmo um sétimo continente feito de lixo. Esse mito já havia sido negado, e o entendimento quanto à área que predominava até recentemente a descrevia como uma região parecida com o resto do oceano, a olho nu, mas poluída por microplásticos.

No entanto, o novo estudo afirma que os microplásticos, embora continuem a ser problema, respondem por apenas 8% da massa de lixo na área. Até agora, a maior parte das operações de coleta de amostras usava redes oceânicas projetadas para recolher pequenas partículas, e por isso, disse Lebreton, o método subestimava o número de pedaços maiores de lixo que flutuam na área, por exemplo garrafas, boias e redes de pesca.

"A maior parte da massa é formada por lixo em pedaços grandes, que estão a caminho da decomposição em microplásticos", disse Lebreton.

Mas ainda assim, "o lixo não forma uma ilha", disse o oceanógrafo. "Fica muito disperso". (Um modelo visual, porem, demonstra de que maneira os detritos se concentram em uma dada área do oceano.)"

"Acho que usar o termo 'ilha de lixo' causa alguma confusão", Nancy Wallace, diretora do programa de detritos marinhos da NOAA (agência federal americana para atmosfera e oceanos), que não participou do estudo. Essa descrição, disse ela, causa a impressão equivocada de que seria fácil recolher o lixo.

A preocupação é que, dentro de algumas décadas, os pedaços de lixo maiores se decomponham em forma de microplásticos, que são muito mais difíceis de remover do oceano. "É como uma bomba relógio tiquetaqueando", disse Joost Dubois, porta-voz da Fundação de Limpeza Oceânica.

A fundação diz que seria quase impossível remover o plástico já acumulado na área por métodos tradicionais, como barcos equipados com redes. O grupo em lugar disso desenvolveu um sistema mecânico que flutua na água e concentra os plásticos em áreas mais densas, nas quais eles possam ser recolhidos por barcos e transportados de volta à terra para reciclagem.

A fundação planeja lançar o primeiro sistema desse tipo na metade deste ano, em Alameda, Califórnia. 

Rede de pesca abandonada sendo içada do oceano
Rede de pesca abandonada sendo içada do oceano - Divulgação

Tradução de PAULO MIGLIACCI

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