Descrição de chapéu The New York Times

EUA afrouxam regras sobre metano, gás que causa efeito estufa

Governo Trump planeja uma série de medidas para reduzir regulação do setor industrial

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Lisa Friedman Carol Davenport
Nova York | The New York Times

​O governo Trump anunciou na quinta-feira um plano abrangente para reduzir a regulamentação das emissões de metano, um dos gases que mais contribuem para o aquecimento global.

A regra proposta pela Agência de Proteção Ambiental (EPA, na sigla em inglês), pretende eliminar requisitos federais de que as companhias de petróleo e gás natural adotem tecnologia que detecte e conserte vazamentos de metano em poços, oleodutos e instalações de armazenagem. Também reabriria a questão da autoridade legal da EPA para regular o metano como poluente.

O plano de desregulamentação é especialmente notável porque companhias importantes do setor de energia na verdade se pronunciaram contra ele –se unindo às montadoras de automóveis, empresas de eletricidades e outros gigantes da indústria que opuseram a iniciativas do governo para revogar regras sobre a mudança do clima e de proteção ao ambiente.

Sede do EPA (Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos)
Sede do EPA (Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos) - AFGE/WikiMedia Commons

O enfraquecimento dos padrões sobre o metano é o passo mais recente na sucessão de revogações de regulamentos ambientais pelo governo Trump, concebidas para afrouxar a regulamentação da indústria.

Trump quer abrir milhões de hectares de terras e águas públicas à prospecção, o que inclui a Reserva Nacional de Fauna e Flora do Ártico, e suspendeu uma moratória adotada no governo Obama que desautorizava o arrendamento de terras públicas para minas de carvão. Este mês, o Departamento do Interior americano completou um plano que reduz as proteções oferecidas pela Lei de Espécies Ameaçadas. Daqui a alguns meses, a EPA planeja cancelar alguns regulamentos contra a poluição da água que afetam riachos e terras alagadas.

Dirigentes da EPA dizem que a nova regra sobre o metano, que pode substituir a norma adotada no governo Obama, é uma resposta aos apelos de Trump por uma redução na regulamentação que bloqueia o crescimento econômico ou mantém o país dependente de energia importada. O plano "remove o ônus regulatório desnecessário e duplicado que pende sobre o setor de petróleo e gás natural", disse Andrew Wheeler, administrador da EPA. "O governo Trump reconhece que o metano é valioso e que o setor tem incentivo para minimizar os vazamentos e maximizar seu uso".

Wheeler apontou que, desde 1990, a produção de gás natural nos Estados Unidos quase dobrou, enquanto as emissões de metano no setor caíram em 15%.

Anne Idsal, diretora interina de controle de poluição do ar na EPA, disse que a eliminação das regras da era Obama teria "benefícios ambientais mínimos".

Os defensores do meio ambiente descrevem a proposta como grande revés no esforço para combater a mudança do clima. O metano é um potente gás causador do efeito estufa.

"A EPA de Trump está ansiosa por dar passe livre à indústria do petróleo e gás natural para que ela mantenha grande quantidade de poluição na atmosfera", disse David Doniger, advogado do Conselho de Defesa de Recursos Naturais, uma organização ativista. "Se a EPA levar adiante essa proposta irresponsável e sinistra, nós trataremos do assunto nos tribunais".

Nos termos da proposta, o metano, principal componente do gás natural, seria regulado apenas de maneira indireta. Uma categoria separada mas correlata de gases, conhecida como compostos orgânicos voláteis, continuaria a ser regulamentada, sob a nova regra, e as restrições teriam o benefício colateral de restringir algumas emissões de metano.

A nova regra também terá de passar por um período de comentário e revisão pública, e provavelmente será concluída no ano que vem, disseram analistas.

No geral, o dióxido de carbono é o mais significativo dos gases causadores de efeito estufa, mas o metano vem logo abaixo. Persiste na atmosfera por período menor, mas seu efeito é mais forte enquanto dura. De acordo com algumas estimativas, o metano tem 80 vezes o poder de retenção de calor do dióxido de carbono, em seus primeiros 20 anos na atmosfera.

O metano no momento responde por cerca de 10% das emissões de gases causadores de efeito estufa nos Estados Unidos. Porção significativa dele vem do setor de petróleo e gás natural. Outras fontes incluem o gado e a agricultura.

A análise econômica da EPA sobre a nova regra estimou que ela economizaria entre US$ 17 milhões e US$ 19 milhões ao ano para o setor de petróleo e gás natural. Em comparação, a receita anual do setor petroleiro americano como um todo costuma variar entre US$ 100 bilhões e US$ 150 bilhões.

As regras do governo Obama sobre o metano são alvo do governo Trump desde os primeiros dias do novo presidente no posto. Em março de 2017, Scott Pruitt, então administrador da EPA, tentou suspender as regras enquanto a agência estudava uma alternativa, mas um tribunal federal de recursos decidiu que isso era ilegal.

O presidente Trump descartou repetidamente o consenso cientifico de que as atividade humanas contribuem para a mudança do clima, ainda que cientistas do governo federal tenham lançado um alerta detalhado sobre os danos que o aquecimento global já está causando à economia dos Estados Unidos.

A Avaliação Nacional do Clima de 2018 concluiu que o aquecimento causado pelos gases causadores de efeito estufa já levou ao agravamento dos incêndios em áreas de vegetação e ao fracasso de safras, entre outras coisas, e que pelo final do século efeitos como esses poderão reduzir em até 10% o tamanho da economia dos Estados Unidos.

Erik Milito, vice-presidente do Instituto Americano do Petróleo, uma organização que representa o setor de petróleo e gás natural, elogiou a nova regra, dizendo que "acreditamos que seja uma maneira mais inteligente de lidar com as emissões de metano".

Mas diversas das maiores companhias de petróleo e gás natural apelaram ao governo Trump por restrições mais severas ao metano, e não por um afrouxamento das regras existentes. Foram empresas menores que solicitaram um afrouxamento das regras, argumentando que inspecionar vazamentos era caro demais,

As empresas de energia de maior porte investiram milhões de dólares para promover o gás natural como opção mais limpa ao carvão, nas usinas nacionais de energia, porque o gás natural produz cerca de 50% menos dióxido de carbono ao ser queimado. Elas temem que remover as restrições aos vazamentos de metano solape sua mensagem de marketing e reduza a demanda.

A Exxon escreveu à EPA no ano passado instando a agência a manter elementos chaves das normas de Obama. E este ano, Gretchen Watkins, presidente do conselho da Shell nos Estados Unidos, declarou que a EPA deveria impor regras que "tanto regulem as emissões existentes de metano como regulem as futuras emissões".

Susan Dio, presidente do conselho e presidente da BP America, escreveu um artigo de opinião para o jornal Houston Chronicle, em março, afirmando que regular o metano "é a coisa certa a fazer pelo planeta" e pelo setor de gás natural. "Para maximizar os benefícios climáticos do gás - e enfrentar o duplo desafio de produzir mais energia com menos emissões - precisamos tratar desse calcanhar de Aquiles e eliminar as emissões de metano", ela escreveu.

Ben Ratner, diretor sênior do Fundo de Defesa Ambiental, uma organização que trabalha em estreito contato com empresas de petróleo para rastrear e reduzir emissões de metano, disse que à medida que fontes de energia renovável como a solar e a eólica se tornam mais acessíveis, a mensagem do setor de que o gás natural é uma alternativa mais limpa começa a sofrer. "A reputação do gás natural americano está à beira do precipício, e o afrouxamento das regras sobre o metano pode ser o empurrão que a derrube", disse Ratner.

Idsal, a diretora interina de controle da poluição do ar na EPA, disse que s empresas que se opõem à desregulamentação de Trump estariam livres para continuar seguindo as regras de Obama, se assim desejarem. "Não impedimos que alguém vá acima e além do esperado, se é isso que eles pensam que precisam do ponto de vista de negócios ou fiscalização", ela disse.

The New York Times, tradução de Paulo Migliacci

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