Descrição de chapéu desmatamento

Cientistas estão mais perto de resolver o mistério das algas marinhas do Caribe

Esgoto humano, chorume agrícola, mudança climática e desmatamento podem estar associados

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Jake Spring
Reuters

Cientistas ficaram perplexos quando uma faixa de algas marinhas mais longa que toda a costa brasileira surgiu em 2011 no Atlântico tropical —uma área que normalmente carece de nutrientes que alimentariam esse crescimento.

Um grupo de pesquisadores dos Estados Unidos identificou um dos principais suspeitos: esgoto humano e chorume agrícola transportados pelos rios até o oceano.

A conclusão ainda não é definitiva. Esse fluxo cheio de nutrientes é um dos vários prováveis culpados pela explosão de algas marinhas nas águas quentes das Américas. Seis cientistas disseram à agência Reuters que suspeitam que uma complexa combinação de mudança climática, destruição da Amazônia e poeira que sopra do deserto do Saara, na África, pode estar alimentando o megaflorescimento da alga marrom-escura conhecida como sargaço.

Algas acastanhadas em meio a um mar azulado
Sargaço no litoral da Ilha de Guadalupe, no Caribe - Helene Valenzuela/AFP

Em junho de 2018, os cientistas registraram 20 milhões de toneladas de algas marinhas, um aumento de 1.000% em comparação com a floração de 2011 no mesmo mês.

Provavelmente há vários fatores que promovem o crescimento, disse o oceanógrafo Ajit Subramaniam, da Universidade de Columbia. "Eu ficaria surpreso se houvesse uma causa específica."

Ainda assim, um estudo recente que examinou a química das algas marinhas da década de 1980 até 2019 oferece a evidência mais forte de que a água proveniente do escoamento urbano e agrícola tem sido um grande fator para a expansão do chamado Grande Cinturão de Sargaços do Atlântico, que agora se estende por quase 9.000 quilômetros.

Chorume de nitrogênio

O estudo, de coautoria do biólogo Brian Lapointe, da Universidade Atlântica da Flórida, descobriu que o sargaço coletado recentemente em águas costeiras desde o Brasil até o sul dos Estados Unidos, incluindo vários países caribenhos, continha níveis de nitrogênio 35% mais altos em média do que amostras coletadas mais de três décadas antes. As descobertas foram publicadas em maio na revista Nature Communications.

O nitrogênio é encontrado em resíduos humanos e animais, e em fertilizantes. Os resultados sugerem que o esgoto e o chorume das plantações que fluem para os rios das Américas e depois para o oceano alimentam o crescimento de sargaço costeiro. As correntes carregam grande parte dessas algas marinhas para o Mar do Caribe, onde estão prejudicando as economias costeiras da região, dependentes do turismo.

As amostras também mostraram, por exemplo, um aumento de 111% na proporção de nitrogênio para fósforo no mesmo período. Essa proporção tem sido quase constante em todos os oceanos do mundo há décadas. A mudança sugere que a química da água foi radicalmente alterada.

Os pesquisadores escolheram o rio Amazonas para uma análise específica.

Mudança climática

Com o aumento das temperaturas globais, os cientistas observam que as tempestades estão se intensificando em certas regiões do globo, inclusive na Amazônia. Essas tempestades aumentam a frequência de fortes inundações, que provavelmente carregam mais chorume rico em nitrogênio para o mar, disse Lapointe à Reuters, em uma sequência que ele chama de "maldição dupla".

Os especialistas observam que o pico das cheias do rio Amazonas empurra uma pluma de nutrientes com centenas de quilômetros para o mar em março e abril, coincidindo com a proliferação de grandes florações de sargaço. De lá, as correntes conduzem as algas ao redor da costa da Venezuela para o Mar do Caribe e, às vezes, mais ao norte, até o Golfo do México.

A mudança climática também está produzindo furacões mais fortes, que no mar puxam mais nutrientes do fundo do mar, o que potencialmente fertiliza o sargaço.

Os cientistas também teorizaram que a poeira do deserto do Saara, junto com fumaça e cinzas, podem estar contribuindo para o crescimento de algas marinhas. À medida que as partículas são sopradas para oeste sobre o Oceano Atlântico, elas se transformam em nuvens e caem em chuva, em depósitos de ferro e fósforo que fertilizam a água.

Provar exatamente quanto cada um desses fatores pode estar contribuindo para o crescimento do sargaço exigirá anos de financiamento e pesquisa. Mas os cientistas dizem que isso não significa que os governos não possam agir agora para reverter a tendência.

"Esse fenômeno vai continuar até que haja uma mudança nas políticas públicas", disse Carlos Noriega, oceanógrafo da Universidade Federal de Pernambuco. O Brasil, por exemplo, poderia desacelerar o desmatamento, que levou a um boom da pecuária que permite que solo solto, esterco e fertilizantes cheguem aos rios.

Ele também observou o crescimento da população humana na região amazônica do Brasil. As cinco maiores cidades cresceram quase 900 mil habitantes desde 2010, e grande parte da região carece de tratamento de esgoto suficiente.

"Tratar o esgoto e parar o desmatamento é a única maneira de controlar isso", disse Noriega.

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves

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