Descrição de chapéu Financial Times mudança climática

Como a corrente de jato está ligada a ondas de calor simultâneas no mundo todo

Cientistas correm para entender a mudança de formato das correntes de ar que controlam o clima nas latitudes médias

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Leslie Hook
Financial Times

As ondas de calor letais que estimularam incêndios e causaram interrupções no transporte na Europa, nos Estados Unidos e na China neste mês têm uma coisa em comum: um formato peculiar na "jet stream" (corrente de jato) chamada de "número de onda 5".

Os cientistas estão correndo para entender se a corrente de ar em rápido movimento que controla o clima nas latitudes médias está mudando de uma maneira que torna as ondas de calor mais frequentes e duradouras.

"A corrente de jato é o principal motor do nosso clima", explica Paul Williams, professor de ciência atmosférica na Universidade de Reading (Reino Unido). "A corrente de jato é como uma correia transportadora, que nos traz tempestades uma após a outra."

Incêndio destrói floresta perto da vila de Pumarejo, no norte da Espanha; uma onda de calor atinge a região há semanas
Incêndio destrói floresta perto da vila de Pumarejo, no norte da Espanha; uma onda de calor atinge a região há semanas - Miguel Riopa - 18.jul.22/AFP

Ela também pode gerar ondas de calor quando assume uma forma de U, chamada de "bloco ômega" porque se assemelha à forma da letra grega ômega.

Neste momento, um padrão global de cinco grandes ondas está circulando o mundo, causando ondas de calor simultâneas em todos os continentes. Esse padrão, conhecido como número de onda 5, pode durar semanas, fazendo com que áreas quentes permaneçam quentes por muito tempo.

Na China, mais de 900 milhões de pessoas estão enfrentando ondas de calor e mais de 70 estações meteorológicas bateram recordes este mês. Os estados americanos de Texas e Oklahoma estão experimentando temperaturas diárias recordes, e mais de 20 estados emitiram alertas de calor.

O Reino Unido também registrou sua temperatura mais alta de todos os tempos nesta semana, 40,3°C, enquanto a França e a Espanha lutam contra incêndios florestais após uma onda de calor extrema que durou semanas e estabeleceu recordes de temperatura.

"Como acontece com frequência na atmosfera, está conectado: se vemos um evento extremo num lugar, ele pode estar conectado a eventos extremos em outro", diz Stephen Belcher, cientista-chefe do Departamento Meteorológico do Reino Unido (Met Office). "Os meteorologistas do Met Office estão olhando muito de perto esse padrão de número de onda 5 para ver quanto tempo ele persiste", acrescentou.

Belcher diz que três fatores contribuíram para a onda de calor na Europa: o padrão de onda 5 na corrente de jato; o aumento das temperaturas médias globais; e os solos secos, particularmente em torno do Mediterrâneo, resultantes do clima quente prolongado.

Dim Coumou, cientista climático da VU Amsterdam, diz que existem dois padrões importantes na corrente de jato no verão —com cinco ondas ou sete ondas— que tendem a permanecer no mesmo lugar quando se formam. "Se esses padrões de ondas ficarem estagnados e persistirem por períodos mais longos, normalmente veremos ondas de calor simultâneas."

Um crescente grupo de pesquisa tenta responder à pergunta de como exatamente a corrente de jato está sendo alterada pelo aquecimento global e o que isso significa para os padrões climáticos futuros. As temperaturas já aumentaram cerca de 1,1°C desde os tempos pré-industriais devido à atividade humana.

A própria corrente de jato parece estar mudando seu comportamento em longo prazo e desacelerando no verão, o que pode aumentar a probabilidade do padrão de "bloco ômega".

Jennifer Francis, cientista atmosférica do Centro de Pesquisa Climática Woodwell, diz que o rápido aquecimento da região ártica parece ser a causa dessa desaceleração.

"Há uma diminuição geral dos ventos no verão", diz Francis. "A razão pela qual existe uma corrente de jato é porque faz frio ao norte e calor ao sul, e essa diferença de temperatura cria [a condição para a corrente de jato]", disse ela.

Como o Ártico está se aquecendo muito mais depressa que o resto do planeta, há menos diferença de temperatura entre essas massas de ar agora.

Parte do comportamento da corrente de jato ainda não foi explicada: "Sobre o Atlântico, o jato mudou para o sul no verão", disse Tim Woollings, autor de "Jet Stream" e professor de física atmosférica em Oxford. "E nós esperávamos que ele mudasse para o norte em reação às mudanças climáticas."

A onda de calor que o Reino Unido experimentou recentemente é "apenas uma pequena amostra" do que ocorreu no resto da Europa, disse Woollings. "O verdadeiro evento está sobre Espanha e França."

O Reino Unido experimentou dois dias de temperaturas extremamente altas na segunda (18) e terça-feira (19) antes que o tempo esfriasse; Espanha e França têm visto temperaturas elevadas há semanas.

À medida que as temperaturas médias globais aumentam, os modelos climáticos mostram que as ondas de calor ficarão mais quentes. No entanto, pode levar anos até que os pesquisadores saibam exatamente como o aquecimento global está influenciando esses padrões da corrente de jato.

"Precisamos de um registro muito prolongado de observação", diz Williams. "Pode levar décadas, ou mesmo um século, antes de detectarmos de forma convincente quaisquer mudanças."

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves

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