Descrição de chapéu Acordo de Paris clima

Brasil presidirá grupo dos países megadiversos para negociar biodiversidade na ONU

Articulação brasileira com Indonésia e RDC consertou final antidiplomático da COP15

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Montreal (Canadá)

O Brasil foi eleito na noite desta segunda-feira (20), no final da COP15 da biodiversidade, presidente do grupo dos países megadiversos com posições afins na Convenção de Diversidade Biológica da ONU —que também acaba de aprovar o novo marco global da biodiversidade, estipulando que os países conservem 30% da biodiversidade global até 2030.

O bloco concentra entre 60% e 70% da biodiversidade global e é formado por 18 países em desenvolvimento: Bolívia, Brasil, China, Colômbia, Costa Rica, República Democrática do Congo (RDC), Equador, Índia, Indonésia, Quênia, Madagascar, Malásia, México, Peru, Filipinas, África do Sul, Etiópia e Venezuela.

Após duas semanas de negociações, a COP15 da biodiversidade da ONU adotou o novo marco global da biodiversidade na madrugada desta segunda-feira (19).
Após duas semanas de negociações, a COP15 da biodiversidade da ONU adotou o novo marco global da biodiversidade na madrugada desta segunda-feira (19). - Divulgação/ UN Biodiversity

Apelidado de megadispersos nos bastidores das negociações da biodiversidade da ONU, o grupo não tem se manifestado conjuntamente nos últimos anos por dificuldades em encontrar posições comuns. A presidência atual, comandada pela Etiópia, não conseguiu reunir o bloco.

Alguns países, como Colômbia, Costa Rica e México, são membros da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) e tendem a se alinhar com posições do bloco desenvolvido sobre a conservação global, enquanto outros grandes detentores de biodiversidade, como Brasil e Índia, priorizam as circunstâncias nacionais sobre a conservação e o agronegócio.

O Brasil já havia conseguido contornar as diferenças ao presidir o bloco em 2010, quando os megadiversos mantiveram posições conjuntas sobre a repartição de benefícios do uso da biodiversidade, em uma negociação que levou à aprovação do Protocolo de Nagoia.

Agora, o Brasil espera elevar o perfil do bloco e ganhar destaque na implementação do novo marco global da biodiversidade. A diplomacia brasileira não prevê uma solução única para os megadiversos, mas investe justamente na tese que as soluções devem ser customizadas para a biodiversidade de cada local.

Uma aposta da coordenação brasileira é no fortalecimento dos produtos da sociobiodiversidade, ressaltando a promoção de benefícios sociais, econômicos e ambientais. A diretriz remonta à defesa histórica do uso sustentável da biodiversidade feita pelo Itamaraty nas negociações do tema.

A Convenção de Diversidade Biológica da ONU tem três pilares: conservação, uso sustentável e repartição de benefícios. Enquanto o bloco dos países desenvolvidos investe no tema da conservação, priorizando metas ligadas à criação de áreas de proteção ambiental, os países em desenvolvimento, puxados pelo Brasil, buscam fortalecer os outros dois pilares, que tratam formas sustentáveis de aproveitar os territórios biodiversos.

O protagonismo brasileiro nas negociações de biodiversidade ficou mais evidente após as eleições presidenciais. A expectativa é que a prioridade sinalizada pelo governo eleito de Luiz Inácio Lula da Silva às questões ambientais reflita na liderança do país no bloco dos megadiversos.

Aliás, uma das parcerias desejadas pela equipe de Lula foi adiantada pelo Itamaraty ainda sob Bolsonaro ao longo deste ano: a aliança entre Brasil, Indonésia e RDC, os três maiores detentores de florestas tropicais do mundo.

Assinada no último mês, durante a COP-27 do Clima, a parceria foi acionada ao final da COP-15 da Biodiversidade. Nesta segunda (19), o secretariado da COP pediu ao Brasil que intermediasse a conversa com o RDC, que havia protestado contra a adoção do novo marco global da biodiversidade na plenária final da COP15.

A China, que preside a COP15, bateu o martelo e ignorou a objeção congolesa, criando um clima tenso e gerando dúvidas sobre a legitimidade da decisão. Juntos, o Brasil e a Indonésia convenceram os congoleses a reconhecer a adoção do documento, em troca de uma fala na plenária sobre as reservas do país em relação ao texto acordado.

O combinado costurado pela diplomacia brasileira incluiu até a fala de resposta do presidente da COP15, Huang Runqiu, que elogiou a relevância do RDC para a COP.

Após a correção do incidente antidiplomático, Runqiu passou a perguntar "posso adotar?" antes de bater o martelo sobre os documentos seguintes na fila de decisões da COP, mudando o humor da plenária e provocando risadas.

A COP-15 terminou um pouco depois da meia-noite desta terça (20), apesar das principais decisões terem sido definidas na madrugada de segunda.

A nomeação de representantes regionais para o bureau que cuida dos procedimentos da COP ficou travada por bloqueio de países europeus às candidaturas russas. O desentendimento, por causa da guerra na Ucrânia, obrigou todos os 153 países presentes na plenária a depositar seus votos, um a um, para eleger um representante da região.

Diferentemente das negociações do clima, que são anuais, a COP da biodiversidade é bianual e os países só voltam a negociar em 2024, na Turquia. Com o novo marco aprovado, as nações passarão a discutir estratégias de implementação, mobilização de recursos financeiros e o funcionamento do mecanismo global de repartição de benefícios, também aprovado na COP15.

A jornalista viajou a convite da Avaaz.

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