Na COP15, ONU elege mata atlântica entre as 10 maiores referências em restauração

Com reconhecimento, bioma ganha prioridade para receber financiamento

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Montreal (Canadá)

A mata atlântica, bioma que já preencheu boa parte da costa brasileira e ainda se estende por Paraguai e a Argentina, é uma das dez referências mundiais em restauração, segundo o anúncio feito na manhã desta terça-feira (13) pelo Pnuma (Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente) e a FAO (Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura).

O evento aconteceu como parte da COP15, a conferência da biodiversidade da ONU, que até o próximo dia 19 visa a concluir o próximo acordo global sobre o tema, prioritário para a agenda das Nações Unidas, que definiu o período de 2021 a 2030 como Década da Restauração.

Com o reconhecimento, o bioma ganha prioridade da ONU para receber financiamento e apoio técnico para a restauração.

Pássaro amarelo em árvore
Canário-da-terra-verdadeiro (Sicalis flaveola) ao lado de um ninho de joão-de-barro, no parque Ibirapuera, em São Paulo, em área de mata atlântica - Rubens Cavallari - 21.jan.2022/Folhapress

"Agora não se trata mais de conservar o que restou, mas restaurar para garantir serviços ecossistêmicos. Lá atrás, falava-se na proteção das espécies ameaçadas, agora há essa nova visão sobre como esses ecossistemas garantem água, alimento, e até energia em alguns lugares, além de sequestrar carbono", avalia o diretor-executivo da Fundação SOS Mata Atlântica, Luís Fernando Guedes Pinto.

"Essa nomeação ajuda a alavancar a restauração e a função dos ecossistemas para a humanidade, com uma ligação direta entre a restauração, a economia e o bem-estar das pessoas", ele aponta.

A mata atlântica já havia sido reconhecida como um "hotspot" da biodiversidade —ou seja, uma das regiões prioritárias para a conservação global, devido à alta concentração de diversidade biológica e de espécies endêmicas, associada ao alto risco de extinção— e também já foi nomeada como uma Reserva da Biosfera pela Unesco.

Cerca de 700 mil hectares já foram restaurados na mata atlântica e o objetivo do Pacto pela Restauração da Mata Atlântica é chegar a 1 milhão de hectares em 2030 e 15 milhões em 2050. Além do Pacto —rede que articula atores nacionais pela conservação do bioma—, a meta também conta com esforços internacionais da Rede Trinacional de Restauração, concentrada no Alto Paraná, envolvendo também a Argentina e o Paraguai.

Segundo análise divulgada em novembro pela SOS Mata Atlântica, o bioma é responsável pela produção de 50% dos alimentos consumidos pela população brasileira. O estudo também destaca que a mata atlântica emite somente 26% dos gases de efeito estufa do setor agropecuário do país.

Nos últimos anos, porém, o desmatamento na mata atlântica voltou a crescer.

Em relação ao período de 2017-18, quando o desmate no bioma registrou as menores taxas históricas, o aumento entre 2020 e 2021 foi de 90%, revertendo a tendência de zerar a derrubada da floresta, segundo o Atlas da Mata Atlântica publicado no último maio, a partir dos dados do Inpe e da Fundação SOS Mata Atlântica.

Ainda segundo o atlas, o desmate no bioma cresceu 66% entre 2020 e 2021 se comparado ao período anterior (2019-2020). Cerca de 89% do desmate ficou concentrado em cinco estados: Minas Gerais, Bahia, Paraná, Mato Grosso do Sul e Santa Catarina.

Segundo dados do Mapbiomas, a cobertura flore stal da Mata Atlântica caiu de 27,1% em 1985 para 25,8% em 2020. Hoje, um quarto do território é ocupado por pastagens, outros 15% pela agricultura, e 16% por uma mistura de ambos.

Para chegar aos dez biomas de referência, a ONU criou um comitê de pesquisadores para avaliar cerca de 20 critérios, como envolvimento de comunidades locais nas tomadas de decisão, formação de coalizões, contribuição para os acordos internacionais de redução de emissões e potencial de crescimento e replicabilidade. Em todo o mundo, 156 iniciativas se candidataram ao título de referência em restauração ("flagship", no termo em inglês).

Juntas, as dez iniciativas "carro-chefe" da restauração visam a restaurar mais de 68 milhões de hectares e devem criar quase 15 milhões de empregos.

Além da mata atlântica, foram eleitos como referência: a restauração marinha em Abu Dhabi; a Grande Muralha Verde da África; o rio Ganges, na Índia; as montanhas da Sérvia, Quirguistão, Uganda e Ruanda; as pequenas-ilhas de Vanuatu, Santa Lúcia e Comores; as estepes de Altyn Dala, na Ásia Central; o Corredor Seco da América Central e a iniciativa Shan-Shui, na China.

Segundo o diretor-geral da FAO, Qu Dongyu, essas são as dez iniciativas mais ambiciosas, visionárias e promissoras de restauração de ecossistemas.

"Transformar nossa relação com a natureza é a chave para reverter a tripla crise planetária de mudança climática, perda da natureza e da biodiversidade, poluição e resíduos", afirmou a diretora-executiva do Pnuma, Inger Andersen.

No evento desta terça, junto ao anúncio das dez referências mundial em restauração, o Ministério do Meio Ambiente da Alemanha anunciou o acréscimo de US$ 7 bilhões (R$ 37 bilhões) às contribuições atuais do país —que atualmente somam U$S 48 bilhões (R$ 252 bilhões)— para o Fundo da Década da Restauração da Biodiversidade.

A reportagem Ana Carolina Amaral viajou a Montreal a convite da ONG Avaaz.

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