Descrição de chapéu Planeta em Transe desmatamento

Desmatamento na Amazônia tem queda de 61% em janeiro, aponta Inpe

Dados também recuaram em relação a dezembro, em meio a período de chuvas na região

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São Paulo

O desmatamento na Amazônia em janeiro deste ano caiu 61% em comparação com o mesmo período anterior. Foram 167 km² desmatados, contra 430 km² em 2022. Ainda, houve queda em relação a dezembro de 2022, que registrou 229 km² derrubados.

Os alertas foram divulgados nesta sexta-feira (10) pelo Deter, sistema do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) que reúne informações para o combate ao desmatamento em tempo real. O número confirma as reduções parciais de janeiro e é o quarto mais baixo da série histórica recente do Deter, iniciada em 2015.

A diminuição ocorre em meio ao período de chuvas na região, que dificulta a derrubada da vegetação. Os números altos nesta época são considerados pontos fora da curva.

Foto aérea mostra área com muita fumaça e, ao fundo, floresta remanescente nas laterais.
Queimada em Lábrea, no Amazonas, às margens da rodovia BR-230, a Transamazônica - Lalo de Almeida - 4.set.22/Folhapress

A última queda no mês de janeiro tinha sido registrada em 2021, quando os números foram de 284 km² para 83 km², uma redução de quase 78%. No ano seguinte, no entanto, veio o pico na série histórica, iniciada em 2015.

Márcio Astrini, secretário-executivo do Observatório do Clima, diz que os números recentes são uma boa notícia, mas pondera que uma parcela da queda pode ser consequência do clima, já que janeiro teve muitos dias com cobertura de nuvens na Amazônia.

"Cerca de metade da região analisada estava com cobertura de nuvens, o que pode ter impedido satélite de fazer a leitura correta", afirma.

Pela forma como é elaborado e prevendo esse tipo de variação, o dado do Deter é usado para analisar tendências, que são consolidadas a cada três meses. Ou seja, os números que darão um diagnóstico mais sólido sobre o começo de 2023 devem sair apenas ao final do primeiro trimestre.

Ainda assim, Ane Alencar, diretora de ciência do Ipam (Instituto de Pesquisa da Amazônia), ressalta que a queda de 61% em relação a janeiro de 2022 é expressiva.

"O ano passado também foi chuvoso em janeiro e mesmo assim [o desmatamento] foi o recorde da série histórica para o mês", explica. "Agora tem uma diferença muito grande nessa redução e isso provavelmente indica uma mudança de comportamento naqueles que estão ou estavam pensando em desmatar."

Os indicadores para janeiro são os primeiros no governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e da volta de Marina Silva (Rede) ao comando da pasta de Meio Ambiente, 15 anos depois de sua primeira passagem pelo cargo e em um contexto muito mais complexo para o combate ao desmatamento.

O governo Lula precisa enfrentar o cenário deixado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) para cumprir as promessas de desmatamento zero e redução de emissões, reforçadas no discurso de posse e ainda durante a campanha.

Alencar afirma esperar que essa queda já seja um reflexo do sinal que o governo federal tem dado em relação ao combate ao desmatamento. "O que tem acontecido na Terra Indígena Yanomami, as operações que têm sido feitas, já dão um sinal importante de que o governo está preocupado com essas questões."

Astrini concorda, mas pondera que ainda é cedo para apontar uma relação certeira de causa e consequência. "A gente precisa de um arco temporal de leitura um pouco maior", diz.

Tanto o discurso antidesmate adotado pelo alto escalão do governo quanto as primeiras operações de combate a crimes ambientais moldam a imagem do país e as possibilidades de atrair recursos para essas ações. Os Estados Unidos, por exemplo, estão considerando sua primeira contribuição para o Fundo Amazônia.

Um possível anúncio é esperado durante reunião de Lula com Joe Biden na Casa Branca nesta sexta-feira, disseram duas autoridades dos EUA com conhecimento direto do assunto.

O fundo tinha sido congelado na gestão Bolsonaro, devido a sua postura avessa à proteção ambiental. O governo anterior acumulou recordes de destruição da floresta, problema que deve ser importado para este terceiro mandato do petista.

A primeira questão é que os números oficiais do desmate, do sistema Prodes (Projeto de Monitoramento do Desmatamento na Amazônia Legal por Satélite), são contados de agosto a julho —e 2022 teve índices altíssimos de derrubada da mata de agosto a dezembro. Isso significa que essa devastação já está encomendada para o relatório do Prodes de 2023.

Mas os desafios vão além. "A minha percepção é que vai influenciar muito na área queimada, porque talvez nem tudo que foi desmatado já tenha sido queimado —e isso também depende de como vai ser a estação seca", avalia a pesquisadora do Ipam.

Além disso, Alencar aponta que áreas muito distantes, como no sul do Amazonas e em algumas regiões do Pará, vêm sofrendo com desmatamento recentemente. Essa estrutura já instalada pode facilitar a derrubada de mais vegetação nesses pontos que antes eram muito preservados.

Astrini ainda afirma que, mesmo que seja algo mais intangível, a retórica empregada ao longo dos últimos quatro anos também pesa nessa equação.

"O Bolsonaro fez um discurso de que a lei ambiental estava errada e o crime ambiental estava certo. Isso criou uma espécie de orgulho na atuação do crime ambiental e ajudou na capacidade de mobilização e organização do crime ambiental como um propósito, inclusive de defesa do próprio país", analisa. "É o criminoso dizendo que o crime dele é a favor do país e a lei é que está errada".

O especialista aponta que isso cria, entre os desmatadores, uma sensação de que estão sendo injustiçados por políticas de combate ao crime. "A prática do crime virou uma luta por justiça em muitos lugares no Brasil por conta do discurso do governo Bolsonaro. Desmobilizar isso leva muito tempo."

O projeto Planeta em Transe é apoiado pela Open Society Foundations.

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