ONU aprova Brasil como sede da COP30 do clima

Prevista para novembro de 2025, conferência deve acontecer em Belém, no Pará

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São Paulo

A ONU aprovou a candidatura do Brasil para sediar a COP30 do clima, conferência de mudanças climáticas da ONU que negocia a implementação do Acordo de Paris, aprovado em 2015. Previsto para novembro de 2025, o evento deve acontecer em Belém, no Pará.

A informação foi divulgada nesta sexta-feira (26) pelo presidente Lula, em um vídeo junto ao ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, e o governador do Pará, Helder Barbalho.

A aprovação das Nações Unidas aconteceu no último dia 18, através de um comunicado do Grulac (grupo dos países da América Latina e Caribe), que endossou a candidatura brasileira para sediar a COP30.

Helder Barbalho, o presidente Lula e o chanceler Mauro Vieira, da esquerda para a direita, posam para foto. lula segura um documento com as duas mãos
O governador do Pará, Helder Barbalho, o presidente Lula e o chanceler Mauro Vieira anunciam Belém como sede da COP30 - Ricardo Stuckert/PR

A decisão aguardava a aprovação do Grulac, já que a COP30 estava prevista para acontecer em um país da região latino-americana. O endosso cita a cidade de Belém.

Embora tenha sido oficializada há uma semana, a aprovação do Brasil para sediar a COP-30 foi comunicada apenas nesta sexta-feira pelo governo brasileiro, em meio a uma crise na política ambiental do governo, que colocou Lula e Barbalho em um polo oposto ao do Ministério do Meio Ambiente.

A tensão foi iniciada no último dia 17, quando o Ibama indeferiu pedido da Petrobras de perfuração de poço de petróleo na foz do Amazonas. Dois dias antes, o governador do Pará havia defendido a exploração de petróleo na região, sugerindo que a transição energética para fontes renováveis de energia pudesse acontecer daqui a 50 anos.

"O Brasil vai abrir mão disso [exploração de combustíveis fósseis] pelas próximas décadas? Talvez seja uma discussão que a gente possa fazer daqui a 50 anos. Mas neste momento o Brasil tem condição de abrir mão de uma oportunidade de exploração sustentável de combustível fóssil?", questionou Barbalho em evento com empresários.

Segundo o painel do clima da ONU, o mundo precisa derrubar as emissões de gases-estufa, cuja principal fonte são os combustíveis fósseis em 55% até o final da década, zerando as emissões líquidas nos próximos 30 anos.

Lula, que estava no Japão para o encontro do G7 naquela semana, teria se sentido traído por não ter sido comunicado antes sobre a decisão do Ibama, conforme a Folha apurou com interlocutores do governo.

Nesta semana, o Congresso promoveu uma séries de votações que enfraquecem agenda ambiental e indígena do governo Lula, como a retirada de competências do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima e do Ministério dos Povos Indígenas em medida provisória aprovada em comissão na Câmara.

Na última quarta, foi aprovada também medida provisória que enfraquece o funcionamento do CAR (Cadastro Ambiental Rural) e da proteção da mata atlântica. No mesmo dia, houve ainda a aprovação de urgência para votar o marco temporal das terras indígenas no Congresso.

"Já participei de COP no Egito, em Copenhague, e o pessoal só fala de Amazônia. Por que então não fazer uma COP em um estado da Amazônia?", disse Lula, sobre a escolha de Belém como sede do evento.

O anúncio da capital paraense como anfitriã foi feito ainda no início de janeiro, após Barbalho ter protagonizado o apoio de governadores ao presidente, em reunião com mandatários de todos os estados brasileiros no dia seguinte aos ataques golpistas de 8 de janeiro.

"Estamos trabalhando para mostrarmos que a Amazônia está preparada para receber o planeta e, por outro lado, mostrar a construção do desenvolvimento sustentável em favor da nossa região", afirmou Barbalho.

Estado com o maior desmatamento do Brasil, o Pará responde por 34,6% do desmatamento acumulado na Amazônia Legal desde 1988, somando 166,7 mil km2 de áreas desmatadas, segundo dados do Prodes/Inpe.

No último ano, no entanto, o Pará também obteve a maior redução do desmatamento em comparação com os outros estados do bioma. De agosto de 2021 a julho de 2022, o desmate no estado despencou 21%, passando de 5.200 para 4.100 km2, ainda segundo o Prodes.

Nos primeiros cinco meses deste ano, o estado mantém o desmatamento em queda, com o acúmulo de 328 km2 de desmate entre janeiro e maio. No ano passado, o saldo do período era de 723,4 km2 desmatados.

Lula propôs que o Brasil sediasse a COP30 ainda antes de assumir a presidência. Logo após as eleições, ele fez sua primeira aparição internacional, na condição de presidente eleito, na COP27 do clima, que aconteceu em novembro no Egito. Na ocasião, já defendeu a candidatura do país a sediar a edição de 2025 da conferência.

Para especialistas e representantes de ONGs ambientalistas, a realização da COP na Amazônia põe a região no centro das discussões globais sobre clima. Por isso, precisa servir como cobrança da sociedade para o governo federal e os estados por urgência no combate ao desmatamento e às emissões de gases de efeito estufa, dizem especialistas.

"É favorável pela pressão extra sobre a agenda ambiental do país. Se, por exemplo, o Pará está com o desmatamento alto, então agora terá um motivo a mais para baixá-lo. Assim será também na área de energia, entre outras", diz Márcio Astrini, secretário-executivo do Observatório do Clima, rede formada por 94 organizações socioambientais.

Paulo Moutinho, do diretor do Ipam (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia), destaca que a "interação entre o desmatamento na Amazônia e no cerrado precisa ser debatida, porque hoje o cerrado contribui com uma quantidade expressiva de emissões pela destruição".

"Esperamos que até lá o Brasil, e em especial o Pará, tenham reduzido substancialmente suas taxas de desmatamento e que o país já tenha uma estratégia clara de transição energética, que leve o país para uma economia de baixo carbono no longo prazo, sem combustíveis fósseis", diz Alexandre Prado, especialista em mudanças climáticas do WWF-Brasil.

A diretora-executiva do Greenpeace Brasil, Carolina Pasquali, frisa que o Brasil precisa também assegurar direitos de povos indígenas e comunidades tradicionais enquanto ruma a uma transição energética. "Precisamos chegar em 2025 com uma redução drástica no desmatamento e um plano ambicioso para diminuição das nossas emissões, o que inclui não abrir novos campos de exploração de petróleo", afirma.

Lula e Helder em discurso
Lula e Helder Barbalho, governador do Pará, durante a COP27, no Egito, quando o Brasil apresentou candidatura à ONU para sediar o evento em 2025 - Joseph Eid - 16.nov.2022/AFP

O movimento de sediar a COP30 fez parte da série de gestos de Lula em contraposição a Bolsonaro. Em 2018, assim que foi eleito, Bolsonaro promoveu a desarticulação da candidatura brasileira para sediar a COP25, prevista para o ano seguinte e que acabou por acontecer em Madri, no final de 2019, sob presidência do Chile, já que a previsão era de que um país latino-americano conduzisse os trabalhos.

As edições da COP revezam as sedes entre as várias regiões do mundo, dando a oportunidade equilibrar perspectivas regionais sobre as responsabilidades climáticas. O país-sede também tem a responsabilidade de presidir a conferência, conduzindo as negociações.

Neste ano, a COP28 acontece nos Emirados Árabes Unidos. O presidente designado da COP28, Sultan Ahmed al-Jaber, tem sofrido críticas internacionais pelo aparente conflito de interesses: além de coordenar esforços governamentais em energias renováveis, ele também preside a estatal de petróleo do país, a Abu Dhabi National Oil Co.

O projeto Planeta em Transe é apoiado pela Open Society Foundations.

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