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Maioria de grandes obras contra enchente em São Paulo está atrasada

Há 17 intervenções em curso; algumas, promessas que se arrastam há anos

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São Paulo
Há quase 20 anos no mesmo lugar, a loja de peças de carro da comerciante Rosane Carneiro, 53, no Tremembé (zona norte de SP), é tomada pelas águas no verão. Desde dezembro último, já foram três vezes. 
 
As vitrines e estantes com produtos ficam suspensas, em uma altura em que a água não chega. "Mas, mesmo assim, a gente fica com água até o joelho, cheiro ruim, ratos. Aconteceu antes do Natal, antes do Ano Novo e em janeiro", diz ela. 
 
Perto dali, a canalização do córrego Tremembé, que passa ao lado da loja, está parada devido a questões burocráticas. Quase 400 metros de obras ao longo do curso d'água ficaram inacabados devido a desapropriações que não foram concluídas. 
 
A situação não é exceção. Obras municipais importantes para resolver problemas crônicos de várias regiões paulistanas vêm se arrastando por vários anos e gestões, por motivos que vão de problemas burocráticos a efeitos da crise econômica. 
Córrego Tremembé, que tem obra de canalização desde 2016 - Zanone Fraissat/Folhapress
A cidade tem ao menos 17 grandes obras de drenagem, de acordo com dados da Siurb (Secretaria de Infraestrutura Urbana e Obras). Se dependesse de previsões da atual gestão, do PSDB, ou da anterior, do PT, ao menos 14 delas já estariam prontas.
 

A atual gestão afirma que teve que refazer projetos da gestão Fernando Haddad. Já administração petista rebate dizendo que é prova da incompetência insistir em culpar a administração que acabou em 2016. 

Algumas dessas obras seguiram num ritmo de para-e-anda. É o caso de reservatórios na região da bacia do Aricanduva, área com problema histórico de enchentes. Ao menos dois reservatórios, parte de um pacote de obras previsto para aquela região, foram paralisadas e foram retomadas no ano passado. 

As intervenções ficam perto da casa da doméstica Zilda Teixeira, 63, que mora naquela região desde que tem 7 anos. 

A rua em que Zilda vive tem uma comporta para impedir que a 'maré' que toma a região nos dias de chuva tome conta das casas. Ali, à sombra da letargia do poder público, as obras antienchente são feitas pelos próprios moradores, habitantes de casas onde só se chega após subir escadas. 

Se a água não entra, eles também não conseguem sair. "Dependendo do tempo de chuva, leva até três horas para a água ir embora e as pessoas conseguirem sair de casa de novo", diz. 

Depois de tantas obras no rio Aricanduva, os moradores são céticos sobre os possíveis efeitos de mais intervenções. "Fizeram obras, mas até hoje a situação só piorou por aqui".

A bacia do Aricanduva é a que tem mais obras de drenagem pendentes atualmente, um total de cinco. Atrás, vêm as bacias do córrego Paciência (zona norte) e do riacho do Ipiranga (zona sul), com quadro cada. 

Há ainda obras em curso nas regiões dos córregos Zavuvus (zona sul) e Anhanguera (centro).

Moradores ajustam comporta usada em viela do Aricanduva para barrar a água - Luiz Carlos Murauskas/Folhapress/14.01.2016

Comitê Extraordinário de Chuvas e Enchentes, da Câmara Municipal, cobra as intervenções de macrodrenagem nas zonas leste, sul e centro. O relatório final feito pelos vereadores ressalta também a necessidade de realização de manutenção de córregos e galerias a medidas simples como recuperação de margens dos rios.

O vereador Gilberto Natalini (PV), secretário do Verde durante a passagem de João Doria pela prefeitura, afirma que as obras de saneamento acabam sendo deixadas de lado após a pressão inicial nos meses de chuva. 

"É um investimento enorme, e chuva só tem três meses. Como as demandas são muitas e o dinheiro é curto, o dinheiro acaba sendo usado para outras coisas. É muito pouco executado o orçamento de prevenção de combate a enchente", diz Natalini. 

Natalini afirma que a cidade está cada vez mais impermeabilizada, as margens dos rios são invadidas, e as galerias já não dão conta para o volume de água que cresceu nas últimas décadas. 

"O problema climático e a urbanização errônea vão de trem-bala e o poder público vai de maria fumaça atrás tentando consertar", afirma. 

OUTRO LADO

A gestão Bruno Covas (PSDB) afirma que a cidade ganhou cinco novos piscinões neste verão e culpa a gestão Fernando Haddad pelo atraso. 

"Os projetos herdados da gestão anterior tiveram que ser revisados. Um dos motivos é o fato de terem sido contratadas obras somente com projetos básicos", afirma nota da prefeitura. 

De acordo com a gestão, desde 2017 há negociação de recursos federais junto à Caixa Econômica Federal. Segundo a nota da prefeitura, a medida foi necessária devido a problemas em contratos. 

"Em 2019, as renegociações somaram mais de R$ 170 milhões de trechos de obras de drenagem nos córregos: Aricanduva, Ipiranga, Paciência, Zavuvus, Freitas e Tremembé. São construções de piscinões, canalizações de córregos, entre outras obras de drenagem", diz o comunicado. 

De 21 obras que estavam em andamento no ano passado apontadas pela reportagem, quatro foram entregues. As principais obras restantes, diz a prefeitura, devem ser entregues neste ano. 

A gestão afirma que as obras do córrego Paciência serão entregues no segundo semestre. As do córrego Tremembé foram parcialmente feitas e 372 metros de canalização aguardam desapropriação. Dois reservatórios foram entregues naquela região em outubro. 

Obras do córregos Zavuvus estavam paralisadas desde 2017 por problemas apontados pelo TCU (Tribunal de Contas da União) em contrato firmado pela gestão anterior, diz a administração atual. Elas foram retomadas no ano passado, com previsão de entrega no segundo semestre de 2020. 

As obras na bacia do Aricanduva foram paradas devido a atrasos em repasses federais e retomadas no ano passado. Parte delas, incluindo dois reservatórios, deve ser entregue neste ano.

As obras nos córregos Anhanguera e Ipiranga também devem ser terminadas em 2020, diz a prefeitura. 

Questionada sobre as críticas, a assessoria da gestão Haddad afirmou em nota que "passados mais de três anos da gestão Doria-Covas, fica claro que os atuais gestores ainda não se empoderaram das necessidades da cidade". 

"As obras de drenagem citadas estavam todas com projetos executivos aprovados e tiveram sim que enfrentar problemas de contingenciamento de verbas federais. O que parece é que depois de passado tanto tempo a atual gestão não conseguiu uma solução para este e outros problemas e agora insiste em atribuir responsabilidade a gestão anterior. Esta é a marca da sua incompetência", diz a nota.

 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 

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