Siga a folha

Descrição de chapéu Coronavírus

Anvisa diz que decisão de suspender testes foi técnica e ocorreu por informações incompletas

Diretores dizem que agência não é parceira de desenvolvedores e que mantém decisão

Continue lendo com acesso ilimitado.
Aproveite esta oferta especial:

Oferta Exclusiva

6 meses por R$ 1,90/mês

SOMENTE ESSA SEMANA

ASSINE A FOLHA

Cancele quando quiser

Notícias no momento em que acontecem, newsletters exclusivas e mais de 200 colunas e blogs.
Apoie o jornalismo profissional.

Brasília

O diretor-presidente da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), Antonio Barra Torres, disse nesta terça (10) que a decisão de suspender os testes da vacina Coronavac foi técnica e ocorreu após a agência receber informações incompletas do Instituto Butantan, o que teria deixado dúvidas sobre o caso.

O estudo continuará suspenso até que todos os dados sejam avaliados. "Não temos evidências nem dados que tragam confiança para que o estudo pode continuar", afirmou o gerente-geral de medicamentos, Gustavo Mendes.

O diretor-presidente da Anvisa, Antonio Barra Torres, durante entrevista coletiva para falar sobre a interrupção dos testes da Coronavac - Pedro Ladeira/Folhapress

A paralisação dos testes foi anunciada pela agência na noite de segunda (9) e atribuída ao registro de um evento adverso grave com um voluntário (evento adverso é toda ocorrência inesperada nos protocolos de teste, como uma morte ou uma reação aguda, mesmo que a relação com o imunizante não esteja clara de início).

A Anvisa alegou que precisa analisar os dados e avaliar a relação risco/benefício envolvida no caso. "Vamos tomar decisão quando for comprovada que não há causalidade", disse Mendes.

A Folha apurou que o evento em questão foi a morte de um voluntário, um químico de 32 anos, ocorrida em 29 de outubro. A principal suspeita dos investigadores é que ela decorra de suicídio ou overdose, e autoridades de saúde do governo de São Paulo afirmam ser impossível haver relação com a vacina.

Questionado, Barra Torres negou que a agência tenha sido informada da causa antes de decidir pela suspensão. "As informações veiculadas ontem [segunda] foram consideradas insuficientes e incompletas para continuar permitindo o desenvolvimento vacinal", afirmou.

"Não é brincadeira atestar que uma vacina pode ser dada a uma pessoa. Isso não pode ocorrer em sede de dúvidas. E documentos claros, precisos e completos têm que ser enviados a nós, o que não aconteceu."

Embora tenham sido divulgadas mais informações sobre o caso, Barra Torres diz que as decisões da Anvisa devem se basear em dados do comitê independente que acompanha o estudo.

O monitoramento dos 13.060 voluntários do ensaio da Coronavac no Brasil, já em sua terceira e última fase, é feito por centros estaduais abertos sob o convênio e têm o Butantan como patrocinador. Eles alimentam um comitê de auditoria externa com dados sobre a evolução clínica dos pacientes, e incidentes têm de ser informados à Anvisa.

"Se não vem de um comitê independente, essa informação não tem valor", disse Barra Torres.

Há também uma série de pontos contraditórios entre a Anvisa e o Butantan.

Integrantes da agência negam ter recebido documento detalhado sobre o caso, embora o diretor do Instituto Butantan, Dimas Covas, afirme que estes foram enviados na sexta (6). Segundo a agência, medidas de segurança adotadas após a suspeita de ataques cibernéticos a órgãos do goveno fizeram com que esses dados só chegassem às 18h da segunda (9).

Dimas Covas também afirmou que não não recebeu comunicação prévia da interrupção dos testes, e a Anvisa afirma que comunicou o instituto sobre a suspensão às 20h47, por e-mail, 30 minutos antes da emissão da nota pública.

Mendes afirmou ainda que, embora a agência tenha recebido mais informações, faltam os dados completos pelos canais esperados. "Uma situação de politização põe em xeque o nosso trabalho", disse. "O que nós pedimos é que o trabalho técnico seja respeitado. Estamos zelando por melhores informações."

A Coronavac, produzida dentro de convênio entre o Butantan, ligado ao governo paulista, e a farmacêutica chinesa Sinovac cristaliza o cabo-de-guerra político entre o governador João Doria (PSDB) e o presidente Jair Bolsonaro (sem partido), prováveis adversários nas eleições presidenciais de 2022.

Bolsonaro vinha reiterando que o governo federal não comprará o imunizante antes de ele receber o aval da Anvisa, e chegou a esvaziar um protocolo de intenção de compra selado entre o Ministério da Saúde e a gestão Doria. Nesta terça (10), o presidente comemorou a suspensão dos testes da Coronavac no Brasil e disse que o episódio é "mais uma que Jair Bolsonaro ganha".

Ainda assim, a Anvisa insiste que sua decisão é técnica, e Mendes lembra que é natural que interrupões em testes ocorram –ocorreram, recentemente, nos ensaios da vacina de Oxford, coproduzida pela farmacêutica AstraZeneca e testada em convênio dom a Fiocruz e o governo federal.

Em outro caso, quando a agência foi informada da morte de um voluntário durante esses mesmos ensaios clínicos, decidiu manter os testes após o comitê independente apontar segurança.

Os integrantes da agência enfatizam que "não são parceiros" de desenvolvedores –laboratórios ou institutos– e que a Anvisa se coloca, nas palavras de Barra, como árbitro, apolítica.

"O que o cidadão brasileiro não precisa hoje é de uma Anvisa contaminada por guerra política. Ela existe? Claro que existe. Está aí. Mas tem de ficar deste muros para fora", disse Barra, que nega ter tratado da suspensão com o presidente antes de comunicá-la publicamente.

O Congresso vai discutir a suspensão dos estudos clínicos. O presidente da comissão mista do Congresso, senador Confúcio Moura (MDB-RO), convocou nesta terça audiência extraordinária para tratar da questão, na qual pretende colocar para debater Covas, do Butantan, e Barra, da Anvisa. A previsão inicial é que o evento ocorra na sexta (13).

“Nós já fizemos reuniões com várias fundações e instituições que pesquisam no Brasil. Já discutimos muito sobre a natureza das vacinas, a necessidade delas para o mundo e para o país e neste momento não podemos de maneira nenhuma que se politize uma das vacinas. Todas serão bem-vindas para o país e para o mundo”, afirmou o presidente da comissão.

Colaborou Renato Machado

Receba notícias da Folha

Cadastre-se e escolha quais newsletters gostaria de receber

Ativar newsletters

Relacionadas