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Cinema

João de Deus merece um retrato documental à sua altura, mas não foi desta vez

Sem pontos de tensão, documentário sobre o médium ruma para a idolatria

O médium João de Deus, tema de documentário - Divulgação

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Naief Haddad

João de Deus - O Silêncio É uma Prece

Avaliação: Regular
  • Quando: Estreia na quinta (31/5)
  • Classificação: Livre
  • Produção: Brasil, 2017
  • Direção: Candé Salles

Veja salas e horários de exibição.

Pelo que mostra, “João de Deus - O Silêncio É uma Prece” causa surpresa, espanto até. 
Mas um documentário também deve ser avaliado pelo que escolhe deixar de fora a respeito do seu tema central, pelo que não se interessa em buscar. Visto por esse ângulo, o filme do diretor Candé Salles se revela acanhado, dócil.

Pode parecer um paradoxo, mas é, na verdade, mais simples do que isso. O caminho escolhido para retratar o médium é o da idolatria, o que pressupõe ausência de pontos de tensão.

O filme acompanha as cirurgias espirituais realizadas pelas entidades incorporadas por João de Deus. Há diversos registros de intervenções do médium com instrumentos cortantes em que o paciente aparentemente não sente dor.

Na Casa de Dom Inácio de Loyola, comandada por João de Deus na pequena cidade de Abadiânia, em Goiás, uma paciente conta que sua doença desapareceu. Um milagre, diz ela. Outros, menos enfáticos, afirmam que a saúde melhorou depois dos encontros com o médium.

Ainda que se veja casos pontuais com ceticismo, é difícil negar a capacidade de transcendência de João de Deus.

O médium, no entanto, não é do tipo que proclama sua onipotência. Ele recomenda aos pacientes que conciliem o tratamento médico convencional e as experiências espirituais. Acredita na fé em aliança com a ciência. 

Também fala o tempo todo que o poder não é dele, é de Deus. A essa constatação está ligada a maior fragilidade do documentário. 

O médium é tratado como uma semidivindade, uma reverência que nem mesmo ele parece estimular.

A filantropia promovida por João de Deus só é possível graças às suas atividades econômicas bem-sucedidas, mas o filme só arranha essa faceta. Convém perguntar: falar em dinheiro no filme macula a nobreza do médium?

Milhares de pessoas, brasileiros e estrangeiros, visitam a Casa de Dom Inácio toda semana. É razoável supor que alguns saiam insatisfeitos do lugar, mas o filme só ouve quem enaltece o médium.

Ao vê-lo assim, praticamente sem contradições, o documentário abafa a riqueza humana e se encolhe. 
Grande personagem que é, João de Deus merece um retrato documental à sua altura. Não foi desta vez. 

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