Obra de arte criada a partir de algoritmos vai a leilão na Christie's, em Nova York

Processo criado por coletivo francês analisou 15 mil retratos produzidos entre os séculos 14 e 20 para criar nova tela

Quadro “Portrait of Edmond Belamy”, feito por algoritmo, com a fórmula matemática aplicada (no canto inferior direito) - Divulgação

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Danielle Brant
Nova York

O coletivo francês Obvious acaba de materializar o que poderia ser o enredo de um episódio da série nerd “The Big Bang Theory”: e se pesquisadores de inteligência artificial se reunissem para criar, por meio de algoritmos, obras de arte?

No caso dos três amigos —Pierre Fautrel, Hugo Caselles-Dupré e Gauthier Vernier, todos com 25 anos—, a trama terminaria com um dos trabalhos sendo leiloado na tradicional casa Christie’s entre os dias 23 e 25 de outubro.

O quadro em questão, “Portrait of Edmond Belamy”, faz parte da coleção batizada "La Famille Belamy" , conta o artista e empreendedor Pierre Fautrel.

Nele, aparece a imagem de um homem jovem em baixa definição. No canto inferior da tela, está a fórmula matemática aplicada para se chegar ao resultado.

O projeto começou a ser desenvolvido um ano atrás, após a descoberta do Generative Adversarial Networks, ou GANs, as redes contraditórias generativas, um algoritmo de aprendizagem de máquina que gera imagens.

“Ficamos surpresos com o que poderia fazer, e pensamos que poderia fazer parte de um trabalho criativo”, diz Fautrel, que conheceu o engenheiro Hugo Caselles-Dupré e o economista Gauthier Vernier na adolescência.

O primeiro trabalho produzido pelo trio foi vendido a um museu de Paris, o Art42, especializado em arte de rua. Antes de fechar negócio, eles testaram a recepção entre o público no Ebay.

O preço oferecido ficou próximo a € 10 mil, cerca de R$ 48 mil. Para o museu, a obra foi vendida por um valor próximo a esse, diz Fautrel, que não revela a cifra exata.

Para criar a obra que será leiloada na Christie’s, o algoritmo analisou 15 mil retratos produzidos entre os séculos 14 e 20, diz Fautrel.

“Dessas imagens, o algoritmo aprendeu as regras do retrato, que tem alguém olhando na tela, que há dois olhos, um nariz, uma boca”, diz. “Ele aplica essa verdade e cria um novo exemplar, com a ajuda do artista no processo de criação.”

O algoritmo tem duas partes —uma geradora e a outra que diferencia uma imagem feita por humanos de uma criada pelo gerador. O objetivo é "enganar" a parte discriminadora, para que ela pense que se trata de um retrato real.

Fautrel faz questão de deixar claro que o resultado matemático que gerou o retrato é parte do processo, mas a composição final não pode ser atribuída apenas a ele. O francês afirma que o objetivo maior é democratizar o uso de arte criada com ajuda da inteligência artificial

Ele reconhece que alguns ainda torcem o nariz para o projeto, enquanto outros se mostram verdadeiros entusiastas.

O leilão na Christie’s vai ajudar a medir a temperatura do mercado em relação ao futuro da inteligência artificial na arte.

“Não sabíamos o que esperar do mercado. As reações são polarizadas. Muitos dizem que não há arte por causa da inteligência artificial, outros dizem que é ótimo e que cria um cenário para a arte”, comenta.

“Temos outras reações, muitos amam, outros odeiam, mas ninguém está indiferente, o que é bom.”

Outra proposta do trio é abordar a aplicação da criatividade com a ajuda da inteligência artificial e contrastar com a natural. “Queremos fazer esse questionamento, e então faremos outra coleção”, diz.

O novo projeto deve envolver a criação de obras tridimensionais —”La Famille Belamy” foi 2D. Eles devem começar a se debruçar sobre o trabalho dois meses depois do leilão na Christie’s, que ocupa, no momento, toda a atenção dos jovens.

“Não achamos que isso ia acontecer. Estávamos fazendo isso para nos divertir, não para fazer dinheiro. Era um projeto de amigos em Paris”, afirma.

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