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Começo, meio e fim de um amor

Três trechos inesquecíveis de livros sobre as fases de um relacionamento

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Uma obra puxa a outra. Três ótimos livros com menos de 200 páginas. Três trechos inesquecíveis (desses mesmos livros) sobre as fases de um relacionamento.

Três livros inesquecíveis sobre as fases de um relacionamento - Tati Bernardi

Para começar o namoro, um trecho da crônica “O apartamento dela”, do livro “Meio intelectual, meio de esquerda” de Antônio Prata- 174 páginas

“Ela chegava de trabalho de noite, dormíamos juntos e no dia seguinte partia, antes que eu acordasse. Mulher independente, orgulhosa, levou semanas para que me concedesse a alegria miserável de um brinco esquecido, um pé de meia, uma Bic que fosse. “Te dou uma gaveta”, eu insistia, “Bota seus cremes na bancada”, implorava, tentando mostrar que, se já tinha o meu amor, por que não também o apartamento? Nós dois sabíamos, contudo, que era cedo para um passo tão grande, de modo que um dia, como tinha de ser, ela alugou um apartamento só para ela.

De início, não me incomodei. Ajudei a buscar as tralhas em Cotia e até fui numa daquelas lojonas da Marginal comprar maçanetas, soquetes e quetais. Foi só na primeira manhã, quando a vi levantando-se da cama e caminhando até o banheiro, que senti penetrando em meu peito a broca do ciúme. Havia nos passos dela uma leveza inédita, como se o ar que seus pés atravessavam, no apartamento novo, fosse mais rarefeito do que o do meu quarto; seus braços pareciam balançar mais soltos, como se até então estivessem preocupados em não tocar as paredes, não resvalar nos objetos; até a camiseta de dormir parecia mais fina e solta em seu caminho da cama à pia. Percebi que em seus meses ela nunca havia se entregado a nós (eu e meu apartamento) da maneira que se entregava ao outro. Senti-me preterido, diminuído, levemente abandonado.”

Para chegar ao meio de uma relação, um trecho do texto “Sobre a intimidade”, do livro “A vida em análise” do psicanalista Stephen Grosz- 200 páginas

‘Contou-me que ele e Emma estavam juntos há oito anos e que ele nunca a tinha traído, até então. “Eu contei que ela chama o bebê pelo apelido pelo qual costumava me chamar?”

“Você está me contando que sempre foi fiel a Emma, mas alguma coisa mudou. Acho que você está traindo sua mulher porque se sente traído.”

“Você se lembra de eu ter contado das férias que tiramos no verão, há dois anos? Alugamos aquele chalé espetacular à beira-mar durante quase um mês. Sem internet nem televisão. Um sujeito numa caminhonete aparecia duas vezes por semana com peixe fresco. Eu cozinhava para nós toda noite. Emma se apaixonou pelas crianças da casa vizinha, e pronto! Ela queria crianças, então nós queríamos crianças- não é o que se espera de todos nós?”

“Mas talvez quando vocês decidiram ter um bebê você não soubesse como isso o faria se sentir.”

“Eu não sabia que me sentiria tão sozinho.”

Joshua estava se sentindo sozinho. Talvez mais do que isso: estava com ciúme da proximidade que a mulher e o filho compartilhavam. Incapaz de imaginar uma maneira de entrar, Joshua não conseguia encontrar seu lugar como pai. Ele experimentava essa incapacidade como um abandono por parte de sua mulher. O que proclamava animadamente como um ato de loucura era, na realidade, um ato de vingança.’

Para o fim do amor, um trecho da crônica “Desculpe o transtorno, preciso falar da Clarice”, do livro “Caviar é uma ova” de Gregório Duvivier- 176 páginas

“Um dia, terminamos. E não foi fácil. Choramos mais que no final de ‘How I Met Your Mother’. Mais que no começo de “Up”. Até hoje, não tem um lugar que eu vá em que alguém não diga, em algum momento: cadê ela? Parece que, pra sempre, ela vai fazer falta. Se ao menos a gente tivesse tido um filho, eu penso. Lavaria pra sempre ela comigo.

Essa semana, pela primeira vez, vi o filme que a gente fez juntos- não por acaso uma história de amor. Achei que fosse chorar tudo de novo. E o que me deu foi uma felicidade muito profunda de ter vivido um grande amor na vida. E de ter esse amor documentado num filme- e em tantos vídeos, músicas e crônicas. Não falta nada.”

Tati Bernardi

Escritora e roteirista de cinema e televisão. Pela Cia das letras lançou "Depois a Louca sou eu" e "Você nunca mais vai ficar sozinha".

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