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Jane Fonda é uma guerreira ecológica intergaláctica que não pensa em parar

Atriz comenta atos pela proteção do meio ambiente e sexo na terceira idade em entrevista

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Maureen Dowd
The New York Times

Eu queria que Jane Fonda me desse uma lição.

Havia uma probabilidade razoável de que terminássemos em uma rusga ao estilo de Megyn Kelly, quando eu esbarrasse em algum tópico que ela não estivesse disposta a discutir. Mas eu estava preparada para assumir o risco.

Eu queria que Fonda, uma espécie de versão glamorosa de Forrest Gump que está há mais de meio século na linha de frente da cultura, da política, do mundo fitness e de Hollywood, me contasse sobre tudo.

Dos Panteras Negras ao Green New Deal, de uma vida sexual lendária a vida sexual nenhuma, da cirurgia plástica às algemas plásticas em suas detenções, de “Barbarella” a Quentin Tarantino, de Richard Nixon a Donald Trump, de Marilyn Monroe ao TikTok, da fama negativa como Hanoi Jane aos bons vibradores.

E lá estava ela no Zoom, cativante em seu novo penteado curto e grisalho, falando de sua casa elegante em Los Angeles.

“Eu decidi adotar o grisalho na hora certa”, ela diz. “Não sabia que a Covid estava por vir. Cansei dos produtos químicos e do tempo e dinheiro de que precisava para me manter naquele tom específico de loiro que você conhece —chega disso! Por isso conversei com os produtores de ‘Grace and Frankie’ e disse que estava pensando em ficar grisalha, mas isso significaria que Gracie também teria de ficar grisalha. Eles aprovaram na hora."

Aos 82 anos, ela continua a ter a intensidade que valeu a ela dois troféus no Oscar e fez dela uma ativista contra a guerra e um símbolo sexual intergaláctico. E também um repetidor.

“Você sabe o que é um repetidor”?, perguntou Fonda, me encarando com seus olhos azuis como o Pacífico. “Os repetidores são as antenas colocadas no topo das montanhas.” Ela prosseguiu. “Elas não originam os sinais, mas os sinais que vêm do piso dos vales são apanhados e conduzido pelos repetidores, dos vales para uma audiência muito mais ampla. É isso que as celebridades são.”

Fonda já se considerava ambientalista antes deste ano, “mas eu nunca tinha participado da causa na linha de frente”, ela disse. Fonda contou que “pesquei em alto mar com todos os homens importantes da minha vida, a começar do meu pai”.

Ela sabe que tartarugas marinhas estão sendo sufocadas e que os ursos polares estão morrendo de fome. Usa energia eólica e solar, adquiriu um BMW elétrico, recicla e reduziu seu consumo de carne vermelha e de plástico —mas ainda gosta de saborear costelas ocasionalmente. Fonda foi uma das produtoras e estrelas de “Síndrome da China”, filme de 1979 sobre os perigos da energia nuclear.

Mas pouco antes do feriado do Dia do Trabalho do ano passado —a primeira segunda-feira de setembro, nos Estados Unidos—, a caminho de Big Sur para fazer trilhas em companhia das amigas Rosanna Arquette e Catherine Keener, ela decidiu que era necessário batalhar mais.

“Eu estava tremendo”, ela escreve em “What Can I Do”?, seu livro mais recente. Inspirada por Greta Thunberg e pelo livro de Naomi Klein sobre o Green New Deal, ela decidiu tirar seu saco de dormir do armário, se mudar para Washington por um ano, e acampar diante da Casa Branca em protesto contra a inação do governo quanto ao controle da mudança no clima –o pai dela, o ator Henry Fonda, fez “Vinhas da Ira”, um filme sobre a seca na era da Grande Depressão e sobre a situação do dust bowl.

“Onde vou fazer cocô e xixi?", ela tentou imaginar. “Estou bem mais velha, e preciso me levantar mais vezes durante a noite para fazer essas coisas."

Ela não queria ser descartada como “uma estrela envelhecida de Hollywood fazendo uma visita”. Mas decidiu que era hora de “tirar o traseiro da cadeira”, adquiriu um elegante casaco vermelho na Neiman e se mudou para Washington.

Ela acreditava que compreendia Donald Trump, porque reconhecia nele uma dinâmica que talvez fosse parecida com a da criação de Ted Turner, seu terceiro marido.

“Eu achei que ele tinha sido traumatizado na infância, como Ted, e há coisas que eu compreendo sobre esse tipo de homem”, ela disse. “Eu achei que tudo bem, seria fácil encontrar quatro das mulheres mais bonitas, mais sexy e mais preocupadas com o clima, e iríamos lá, nos ajoelharíamos, imploraríamos e defenderíamos nossa causa."

Para essa missão ecológica ao estilo “As Panteras”, ela convidou Pamela Anderson, “e ela aceitou”, disse Fonda, que continuou pensando sobre quem mais convidar —talvez Sharon Stone.

“Nós diremos a ele o que precisa ser feito, e como a crise é séria, e diremos que ele será o maior herói do planeta, e coisas assim”, ela disse. “Eu cheguei a ligar para Jared [Kushner], ou sei lá como se chama, e contei a ele sobre a ideia. Ele respondeu que Ivanka [Trump] era a ambientalista da família. Então tá. Ela me ligou e falei a ela da ideia. Ela riu e nunca mais me procurou."

Fonda conseguiu o apoio de Annie Leonard, diretora-executiva da Greenpeace nos Estados Unidos, que disse a ela que acampar diante da Casa Branca era má ideia —“vai haver ratos”, segundo disse Leonard—, mas que havia outras maneiras de praticar a desobediência civil.

Fonda apareceu numa foto famosa em 1970, que mostrava sua detenção em Cleveland por acusações forjadas pela Casa Branca de Richard Nixon. O presidente estava furioso com os protestos da atriz contra a Guerra do Vietnã, e é ouvido resmungando, em uma das gravações de suas conversas na Casa Branca, “qual é o problema dessa Jane Fonda?” e "ela é bonita, mas, rapaz, está errada o tempo todo”.

Como disse Troy Garity, filho de Fonda com Tom Hayden, num tributo do Instituto de Cinema Americano à sua mãe em 2014, “ela nunca precisou contratar uma babá para cuidar de mim, o FBI se encarregava disso”.

Por quatro meses, ela desempenhou seu papel como repetidor, e se tornou a estrela das Fire Drill Fridays, um protesto ecológico realizado diante da sede do Congresso americano. Fonda foi detida cinco vezes e se certificou de que as algemas plásticas pretas usadas para isso pela polícia fossem recicláveis.

De volta a Los Angeles, Fonda decidiu continuar a agir online, onde a reação favorável que encontrou foi uma surpresa agradável. “Continuamos a crescer”, ela diz, sobre o número de espectadores da série de vídeos "Fire Drill Fridays", que ela produz com a Greenpeace.

“Eram 100 mil, depois 300 mil, 400 mil, agora chegamos a 600 mil.” Ela recebe convidados, entre os quais Mary Trump, que falou sobre o que ela vê como motivo para a negação do presidente quanto à mudança do clima.

Fonda publicou um novo livro, no qual oferece muitas dicas úteis para as pessoas que não sabem como se engajar ecologicamente. “Coma menos peixe!”, ela aconselha —e, se tiver de fazer isso, opte pelas variedades que ficam em posição mais baixa na cadeia alimentar, como as sardinhas.

O tempo que passou presa atraiu a atenção do presidente Trump, que declarou, num comício no estado americano de Louisiana, “prenderam Jane Fonda, nada muda”. “Ela está sempre algemada, pessoal. Gosta de acenar para as pessoas algemada. Não consigo acreditar”, ele declarou. “A cada 25 anos, ela termina presa." Ela riu quando mencionei o assunto.

“Eu acredito que atos malévolos, como os que Trump está cometendo, são a linguagem dos traumatizados”, disse. “E você pode odiar os atos. Mas não odeie a pessoa, porque ela terá vencido se você a odiar. Não dê tanta energia a ela."

“A verdade é que sinto empatia por ele. Olho para aquela pessoa e vejo uma criança assustada e muito, muito perigosa, porque tem as mãos em todos os botões."

Como Trump se compara a Nixon? “Ele é muito mais perigoso”, diz Fonda. “Mal posso acreditar que estou dizendo isso. Na década de 1970, eu nem pensava nas coisas positivas a respeito de Nixon. Mas ele assinou a Lei do Ar Limpo e fez coisas ótimas pelas nações tribais. Ele fez coisas realmente boas, e era um cara inteligente, conhecia política externa. Não era tão perigoso quanto alguém que não tem absolutamente qualquer limite no que se disporia a fazer para derrubar o país."

Embora tenha se declarado “eleitora de Elizabeth Warren”, ela gostou da escolha de Kamala Harris como candidata a vice-presidente ao lado de Joe Biden e organizou um evento de arrecadação de fundos para a campanha do democrata, em parceria com Lily Tomlin.

“Minha atitude é que é melhor pressionar um moderado a mudar do que lutar contra um fascista”, diz. “Porque é possível levar [um moderado] a mudar”, afirma sobre Biden. “Ele já avançou muito com relação ao clima."

“Temos de reduzir as emissões geradas por combustíveis fósseis à metade, até 2030, e isso será difícil para ele. Temos de os forçar a fazer isso e temos essa capacidade. É aí que entra a desobediência civil. E serei uma das pessoas a sair às ruas, assim que ‘Gracie and Frankie’ acabar”, ela acrescenta.

Quando ela ainda morava com o pai e convivia com os Panteras Negras, Henry Fonda disse a ela “se eu um dia descobrir que você é comunista, serei o primeiro a entregar você”. No começo da década de 1980, ela adotou extraoficialmente Mary Williams, filha de dois integrantes do grupo que já não podiam tomar conta da menina.

Ela aponta que existe “um sentimento de amor” em torno dos protestos do Black Lives Matter que “faltava aos Panteras Negras na década de 1970". "Acho que um dos motivos é porque há mulheres na liderança.”

Fonda diz que, no momento dos distúrbios em Ferguson, no estado americano de Missouri, “um dia recebi no correio panfletos do Black Lives Matter ensinando as pessoas a se cuidar e pensei comigo mesma que agora temos um movimento que aconselha os ativistas a se cuidarem". "Isso é novidade.”

Num momento em que estamos vivendo um reexame cultural de algumas obras de arte clássicas, fiquei curiosa por saber a opinião dela sobre o debate em torno de “... E o Vento Levou”, um filme muito apreciado por seu ex-marido, Ted Turner.

“Ted comprou a MGM para se tornar dono de ‘... E o Vento Levou’”, diz Fonda. “Ele vive de acordo com aquelas ideias. Só a terra importa, Scarlett. Só a terra perdura. É por isso que ele é dono de 800 mil hectares, por causa de Scarlett O’Hara."

“Ele recitava diálogos do filme, muitas vezes. Era obcecado por Scarlett O’Hara. Sabe aquele quadro do filme, o quadro grande da casa de Scarlett? Ele o comprou."

O quadro do filme mesmo ou uma réplica? “Bem, Rhett jogou um drinque em uma cópia e acabou com ela”, explica. “Ou seja, é um quadro que não foi destruído na filmagem. Ou uma cópia feita antes da destruição." Ela acredita que o filme não deva ser cancelado, mas que “o contexto precisa ser oferecido”.

Outro assunto em debate é a reputação de John Wayne, bom amigo de seu pai, por causa de um histórico de declarações horríveis sobre raça.

“Eu pessoalmente não acho que devamos cancelar John Wayne”, ela disse. “Seria muito mais importante decidirmos o que fazer sobre o sistema bancário, a segregação habitacional, as hipotecas, a polícia, todas essas coisas que tornam impossível que os negros ascendam."

No seu livro, ela expressa surpresa depois de um encontro com uma jovem de Hanói que jamais tinha ouvido falar de sua encarnação ativista como “Hanoi Jane”. “Eu estive lá algumas vezes”, ela conta ter dito à jovem, com humor seco.

Não importa quantas vezes Fonda tenha se desculpado por uma foto em que posa ao lado de um canhão antiaéreo norte-vietnamita, e explicado que ser contra a guerra não a fazia ser inimiga dos soldados americanos, ela sabe que muita gente na direita jamais permitirá que ela esqueça.

“Eu acho que, da mesma maneira que existem pessoas que acham que Trump está fazendo um bom trabalho e cumpriu todas as suas promessas, existirão pessoas que acreditam que sou contra os soldados e que aquilo que fiz foi traição, e isso provavelmente não mudará”, afirma. “Jamais permiti que isso me detivesse. Peço desculpas. Tento explicar o contexto. E sigo em frente."

Jane Fonda está no TikTok. Sim. Fico imaginando o que ela acha sobre o movimento MeToo e Hollywood. Qual foi sua experiência?

“Um ator me estuprou, certa vez”, diz, “e um diretor, um diretor francês, uma vez me disse que meu personagem tinha que ter um orgasmo, e ele precisava ver como eram meus orgasmos". "Eu fingi que não entendi, porque ele estava falando em francês.”

Será que “Barbarella”, dirigido pelo primeiro marido de Fonda, Roger Vadim, seria produzido hoje?

“O filme poderia ser feito, mas eu seria uma das produtoras e o filme seria feminista”, afirma. “Era quase um filme feminista. Ela pilotava a espaçonave, certo? Foi ela que o presidente encarregou de ir ao planeta e salvar o cientista. Ela já era bem boa, OK?”

Se Fonda voltasse ao planeta, que abrigava um lago feito de ódio e medo derretidos, ela disse que retornaria como matriarca e acompanhada por um exército de mulheres, para resgatar sua filha, nascida de um ovo que ela põe depois de um encontro com um anjo cego.

Ainda que o passado de Fonda seja fascinante, e ainda que ela mesma tenha escavado esse passado de forma intensa, a atriz enfaticamente não vive nele.

A mulher que revolucionou o mercado de exercícios físicos domésticos com seus vídeos e roupas na década de 1980 agora está brincando com o TikTok, realizando um vídeo que representa uma homenagem brincalhona aos seus vídeos fitness, em uma época de quarentena, na qual as pessoas estão presas em casa e engordando.

Ela fez um comercial para os produtos de maconha da Uncle Bud’s. “Meu médico me recomendou abandonar as pílulas para dormir e usar só canabidiol [CBD]”, ela conta.

Fonda pergunta educadamente que pronome a pessoa a que está sendo apresentada prefere que seja usado para se referir a ela. “Trabalho com pessoas muito jovens”, ela disse. “Quando você é apresentado a elas, elas informam os pronomes que preferem. Eu estou chegando aos 83 anos. Será que preciso mesmo dizer que pronomes devem ser usados para mim? A resposta é sim. Preciso me acostumar."

Ainda que um batalhão de mulheres grisalhas tenha aparecido nas Fire Drill Fridays, dizendo terem sido “convocadas por Jane”, como se a conhecessem, a atriz tem amigos de todas as idades. Ao contrário da maioria das pessoas, ela não tem opinião negativa sobre a geração millennial. “Acho que eles são ótimos, e estão fazendo muita diferença. Sinto muita esperança."

Ela observa, em tom brincalhão, que uma das vantagens de ser ativista é entrar em contato com homens antenados com os modos modernos.

Será que Fonda, que costumava passar seu tempo com Marlon Brando e Warren Beatty, acha que a Netflix deixou no passado o glamour da velha Hollywood?

Ela diz que a pergunta é tola. “Eu não tenho esse sentimento sobre aquela época”, responde, secamente. “Não vejo filmes velhos, quase nunca. Sempre fiquei de fora. Não ligava para filmes. Não romantizo aquela época de maneira alguma, e acho que os atores atuais são brilhantes.”

Ela diz que curte especialmente o trabalho de Saoirse Ronan, Michaela Coel e sua série “I May Destroy You”, na HBO, e “Ramy”, série de Ramy Youssef no serviço de streaming Hulu. Fonda diz ter adorado “The Old Guard”, filme de super-heróis da Netflix, com Charlize Theron.

Ela cresceu em contato com John Ford, amigo de seu pai, e fez seu primeiro filme com Joshua Logan, mas os dois diretores com quem fantasia trabalhar agora são Quentin Tarantino e Wes Anderson.

“O que quero é que Wes Anderson me escale para alguma coisa que eu mesma jamais teria imaginado para mim”, disse a atriz. E o que ela gostaria de fazer com Tarantino? “Qualquer coisa que ele queira”, diz Fonda.

O casaco final

Em sua série na Netflix, a personagem de Fonda, Grace, é uma mulher conservadora e quadrada que termina formando um relacionamento do tipo “os opostos se atraem” com Frankie, uma mulher de espírito livre interpretada por Lily Tomlin, amiga de Fonda na vida real, depois que os maridos das duas se declaram apaixonados um pelo outro.

Tomlin diz que o lema de Fonda desde criança sempre foi “posso fazer melhor”. “Ela é sempre muito franca, e sempre bem-intencionada”, diz Tomlin, “mas mesmo assim diz em voz alta, no set, que ‘você precisa cortar o cabelo’, e sai procurando por alguém para cortar o cabelo da pessoa, e aí a pessoa volta e diz ‘você tinha razão, ficou bem melhor’”.

“Eu não tive pais muito presentes, e por isso aprendi a ser como sou com minhas amigas mulheres”, diz Fonda, cuja mãe se suicidou quando estava internada numa clínica psiquiátrica.

Como Fonda, Grace permite que os homens de sua vida a moldem, até que subitamente declara a um namorado que não gosta nem de golfe e nem de sanduíches e que não vai mais fingir. Frankie zoa Grace por sua alimentação muito moderada, dizendo que a amiga cabe num porta-luvas e zomba de suas cirurgias plásticas.

Pergunto a Fonda por que ela disse que está renunciando às plásticas. “Tenho quase 83 anos”, afirma. “Já deu, não é?”

Ela fala pungentemente de sua bulimia em “Jane Fonda in Five Acts”, documentário de Susan Lacy sobre sua vida, e diz que começou a vomitar suas refeições quando estava no segundo grau. Ela às vezes tentava sobreviver com um ovo cozido e um pouco de espinafre por dia e se sentia faminta o tempo todo.

Ela escreve em suas memórias sobre as críticas do pai ao seu peso na adolescência, e que isso lhe fez mal. Pergunto por que seu pai ainda reclamava, quando ela já era muito magra.

“Ele tinha problemas”, ela diz, resumindo muitas dores e muita psicanálise nessas três palavras. Mas mesmo depois de superar a bulimia, Fonda se manteve esbelta.

“Houve um período em que eu era anoréxica, mas jamais caí abaixo dos 50 quilos”, ela diz. “Não perco o controle do peso. Não estou no meu peso ideal agora. Estou com 58 quilos. O ideal seria 54. Por isso, quando estiverem faltando três semanas para começar a filmar ‘Grace and Frankie’, vou perder cinco quilos.”

Ela diz que sua alimentação é saudável e que trabalha com um preparador físico, usando máscara e luvas. “Sou ativista e me sinto bem, o que acho que é a parte mais importante. Se eu me sentisse ranzinza e deprimida, não teria uma aparência tão boa."

“E outra coisa é que tenho uma boa postura. Isso é crítico, pode acreditar. Trabalhei duro para ter costas bem firmes."

Para manter seu foco ecológico, ela renunciou às compras e disse que seu famoso casaco vermelho das Fire Drill Fridays foi a última coisa que comprou na vida.

Mesmo? “Mesmo”, ela responde. “Não compro mais nada. Tenho dois closets cheios de roupas. Tenho roupas que usava há 30 anos e ainda servem. Isso é uma vantagem de não engordar muito. E quando não posso mais usar alguma coisa, eu a vendo, agora."

Ela diz ter vendido 40 de seus 50 jeans, duas semanas atrás.

“Bem, permita que explique”, diz Fonda. “Quando conheci Ted, ele tinha seis residências. Quando nos separamos, ele tinha 23. E tínhamos roupas em todas elas. Isso me forçava a comprar peças repetidas. Eu me lembro de ir à Saks Fifth Avenue uma vez e a vendedora perguntar se tudo aquilo era para presente. E eu respondi que não, era tudo para mim."

Ainda que ela namore muito em “Grace and Frankie”, e se envolva na venda do lubrificante íntimo à base de mandioca criado pela personagem de Tomlin, bem como na de vibradores para mulheres mais velhas, com instruções em letras graúdas e uma base que não agrava a artrite, Fonda declarou dois anos atrás que “a loja fechou, lá embaixo”.

Depois de ser uma camaleoa a vida inteira, mudando para satisfazer seu pai e três maridos muito diferentes, Fonda diz despreocupadamente, agora, que “não tenho mais interesse”.

“Não tenho tempo”, afirma. “Tenho uma vida bem completa, com filhos, netos e amigos. Não quero mais saber de romances. Não tenho tempo para isso."

Ela se lembra de que, quando era casada com Turner, tinha de fugir com seu laptop no meio das viagens de pesca que eles faziam, para poder escrever.

“A verdade é que praticamente todo dia, quando estou fazendo alguma coisa, penso comigo mesma que não teria tempo para aquilo se estivesse tentando manter um bom relacionamento."

Mas ela com certeza é paquerada. Eu disse a ela que meu pesquisador, Shawn McCreesh, tinha acabado de assistir a “Barbarella” pela primeira vez. Ele viu a atriz no elevador do The New York Times quando Fonda visitou a redação durante as Fire Drill Fridays e a acha muito, muito atraente.

“E isso é bom ou ruim?”, ela brinca. Fonda diz que ninguém mais a aborda para esse tipo de coisa. “Zero”, ela diz. “E não, não sou sozinha. Jamais estive sozinha. Jamais me senti sozinha ou entediada em minha vida."

Se ela tivesse uma noite de sábado livre, o que faria? “Leria”, Fonda responde. “E, por estar sozinha e mais a Covid, estou descobrindo ótimos programas de TV."

Depois que a história sobre sua companhia vender brinquedos eróticos entrou na trama de “Grace and Frankie”, e depois de ela falar no programa “Ellen” sobre um vibrador que pode ser usado como pingente em uma corrente e se parece com uma peça de bijuteria, fãs começaram a mandar a ela vibradores de presente.

“Tenho uma gaveta cheia de vibradores”, ela diz. “É maravilhoso”. Perguntei se ela teria medo de experimentar um vibrador recebido de um fã pelo correio. “Não sei”, ela diz, sorrindo. “Talvez eu peça que alguém teste primeiro."

*

Antes de você disparar o vídeo de exercícios, um pingue-pongue rápido

The New York Times: Seu maior arrependimento foi nunca ter feito sexo com Che Guevara.
Jane Fonda: Não, não penso sobre ele. Um homem sobre quem eu penso, com arrependimento, é Marvin Gaye. Ele queria, e eu não quis. Era casada com Tom. Estava me reunindo com muitos cantores para organizar shows para a campanha de Tom, e a mulher que estava me ajudando nisso me apresentou a Marvin Gaye.

Seria ótimo se a cantada dele tivesse incluído o verso 'sexual healing'.
Eu bem precisava de uma cura sexual, mas ele não propôs, não. Mas li posteriormente que ele tinha uma foto minha na geladeira. Só descobri depois que ele morreu.

Você foi a uma festa de aniversário na casa de Christina Crawford e pendurou o casaco em cabides de arame.
Eu era jovem demais para saber sobre cabides de arame. Acho que nunca tinha visto um cabide de arame na vida. Éramos muito jovens. Todas tínhamos governantas de uniforme. E havia uma roda gigante e um elefante.

Joan Crawford a apavorou.
Eu não sabia quem era ela, exceto que tinha sobrancelhas escuras e espessas e parecia muito alta e imponente, e era responsável pela coisa toda. Tive de fazer uma mesura.

Simone Signoret é a mulher mais sexy que você já conheceu.
Ava Gardner foi a mulher mais sexy que conheci. Sem dúvida. Ela era uma verdadeira “mensch”, e era linda.

Você e Tom Hayden saíram no meio de 'O Último Tango em Paris'.
Sim. Mas foi por que o Vietnã do Norte estava sendo bombardeado. Kissinger começou a bombardear o norte e ficamos muito incomodados.

Você adora a canção 'Jane Fonda', de Mickey Avalon.
Eu a ouvi. Não sei se adoro.

Ted Turner se vestia de Rhett Butler, colocava a música de '... E o Vento Levou' e a carregava escadaria acima.
Não. Mas um dia, quando estávamos no jipe dele indo para uma das fazendas, em uma estrada esburacada, e meu irmão e a mulher dele estavam conosco, Ted parou o carro de repente, saiu, me puxou para fora, me tomou em seus braços e cantou “Don’t Fence Me In”.

Suas polainas são mais famosas que as de Jennifer Beals em 'Flashdance'.
Provavelmente. Porque minhas polainas entravam na casa das pessoas todo dia, todo santo dia. E se tornaram amigas das pessoas.

Você comprou um garanhão branco de Mike Nichols.
Eu comprei uma égua, uma égua baia, chamada Evita, de Mike Nichols.

Você descende de Jane Seymour, uma das mulheres de Henrique 8º.
Minha mãe sempre me disse isso, e por isso meu apelido até a quarta série era Lady.

Sua personagem em 'A Sogra' se vangloria num jantar de que se sentou ao lado do sultão de Brunei, Carrie Fisher e Snoop Dogg e eu em uma festa.
Não me lembro.

Você lamenta não ter aceitado o papel que Mia Farrow fez em 'O Bebê de Rosemary'.
Nem penso nisso.

Katharine Hepburn lhe deu um bom conselho na filmagem de 'Num Lago Dourado'.
Ela me viu errar diversas vezes minhas tentativas de fazer um mortal de costas e sabia que eu tinha medo de cair. E ela disse “deixe de ser molenga”, ou seja, sempre enfrente seus medos.

Marlon Brando era...
Decepcionante. Mas um grande ator.

Você estudou com Marilyn Monroe no curso de atuação de Lee Strasberg.
Sim. Ela gostava de mim. Acho que gostava de mim porque sentia minhas inseguranças e se deixava atrair pelas coisas vulneráveis. Nunca esquecerei de uma festa que Lee Strasberg deu. Ela chegou tarde, entrou, e todos os homens começaram a tremer. Eles ficaram fisicamente excitados e agitados pelo fato de ela estar lá. E ela veio diretamente até mim e queria conversar.

Marilyn não impressionava em pessoa.
Ela era radiante! Havia um brilho vindo dela que era inacreditável. Vinha de sua pele, de seu cabelo, de seu ser. Jamais vi algo parecido.

Maureen Dowd ganhou o Prêmio Pulitzer em 1999 como comentarista política e é autora de três livros que entraram na lista de best-sellers do The New York Times. Ela é colunista do The New York Times desde 1995.

Tradução de Paulo Migliacci

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