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Rompido com Maia, Guedes se enfraquece e deixa reformas com Planalto e Congresso

Ministro decide se recolher à função de formular propostas e assessorar Bolsonaro, sem contato com Câmara

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Brasília

Em meio a processo de fritura no governo e diante de atrito com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), o ministro Paulo Guedes (Economia) decidiu se afastar da tarefa de negociar as reformas estruturantes apresentadas por ele ao Congresso. A missão deve ficar nas mãos da ala política do Planalto.

Com o rompimento dessa aliança e a aproximação entre Maia e o Palácio do Planalto, o ministro da Economia perde poder e deixa as principais propostas econômicas do governo (reformas tributária e administrativa), que começam a ser analisadas pela Câmara, nas mãos de outros negociadores.

Nas últimas semanas, Guedes também tem passado por um processo de fritura dentro do governo, sendo criticado publicamente pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido).

O presidente suspendeu o anúncio do novo programa social do governo, batizado de Renda Brasil, por não concordar com a proposta da equipe econômica.

Em evento, ele afirmou que não aceita "tirar de pobre para dar para paupérrimo", em referência à ideia de extinguir programas como o abono salarial para criar o Renda Brasil.

Presidente da Câmara, Rodrigo Maia, e ministro da Economia, Paulo Guedes - Pedro Ladeira/Folhapress

Guedes também está no centro de uma disputa orçamentária. Ele é criticado por ministros das alas política e militar, que defendem uma ampliação de investimentos públicos para acelerar a retomada da economia.

Quando estavam alinhados, Guedes e o presidente da Câmara se articulavam para colocar em votação propostas da agenda liberal.

A aliados Guedes relatou afirmação de Bolsonaro de que o ministro da Economia não entende de política. Por isso, afirma que o diálogo de Maia com o governo será feito a partir de agora com ministros do Planalto e interlocutores de Bolsonaro no Congresso, como o líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR).

Barros é ligado ao centrão —grupo de partidos que se aproximou de Bolsonaro após a liberação de cargos e emendas.

Em reunião com assistentes nesta sexta-feira (4), Guedes afirmou que o cenário do governo mudou. Antes, segundo ele, Bolsonaro não tinha base aliada nem lideranças articuladas no Congresso, o que demandava uma atuação maior de todo o governo.

Agora, sob o diagnóstico de que há maior apoio ao governo no Legislativo, o ministro afirma que vai se recolher ao papel de formular propostas e assessorar o presidente.

Geralmente, cabe à equipe econômica ir a campo nas negociações para ponderar sobre a importância de aprovar pautas impopulares, que, na avaliação da área técnica, resultará em crescimento econômico e geração de empregos.

Entrevista de Maia à GloboNews na noite de quinta-feira (3) foi o estopim do atrito entre as duas autoridades. O presidente da Câmara disse que Guedes proibiu seus auxiliares de conversar com ele.

"A gente tinha um almoço com o Esteves [Colnago, assessor especial da Economia] e com o secretário do Tesouro [Bruno Funchal] para tratar do Plano Mansueto, e os secretários foram proibidos de ir à reunião", disse Maia.

O presidente da Câmara diz que, apesar das divergências com Guedes, que têm se tornado mais comuns ultimamente, a pauta das reformas será preservada.

"Para mim, é importante aprovar as matérias, não falar com o Paulo Guedes", disse o deputado à Folha no fim da noite de quinta.

Na tentativa de colocar panos quentes no desentendimento, Guedes tem afirmado a colegas que Maia sempre ajudou nas reformas e continuará fazendo isso em um novo formato de articulação.

No entanto, integrantes do Ministério da Economia dizem acreditar que, sem uma relação firme com Maia, há um risco maior de as propostas reformistas não se adequarem ao ritmo e formato desejados pelos responsáveis pelas medidas de estímulo à atividade.

A relação com Guedes não ficou desgastada apenas com Maia, mas também com outras lideranças da Câmara.

Congressistas com posições importantes na condução de projetos de interesse do ministro não o pouparam de críticas reservadamente. Um deles avaliou que Guedes perdeu a mão ao ver sua agenda liberal esbarrar no perfil populista de Bolsonaro.

Com a decisão de Maia de romper com o ministro da Economia, a pressão é para que o ministro da Secretaria de Governo, Luiz Eduardo Ramos, assuma o papel de único interlocutor do governo com o Congresso.

Depois que o rompimento se tornou público, Ramos conversou por telefone com Maia e com alguns outros congressistas, como o relator da reforma tributária, Aguinaldo Ribeiro (PP-PB).

Com Bolsonaro longe de Brasília, cumprindo agenda no interior de São Paulo, Ramos passou o dia sem compromissos públicos. Procurado, ele não se manifestou. Parlamentares disseram que iriam procurá-lo durante o fim de semana.

Apesar de Maia expor a intenção de aprovar a reforma administrativa até o fim do ano, técnicos de Guedes dizem que esse plano pode ser adiado para que o presidente da Câmara não se desgaste com bancadas partidárias, principalmente em eventual caso de ele tentar a reeleição ao cargo.

Guedes afirmou a auxiliares que as desavenças mais recentes estão relacionadas a planos para estados e municípios. Na primeira briga, no início da pandemia, Maia apoiou pedido de governadores para que a União pudesse compensar perdas estaduais de arrecadação. Guedes foi radicalmente contra.

Agora, o titular da Economia reclama, nos bastidores, que Maia estaria apoiando uma ideia de governadores para a reforma tributária que poderia trazer prejuízos à União.

Estados querem parte da arrecadação do novo imposto sobre consumo para compensar perdas com a reforma.

A interlocutores Maia nega e afirma que apenas ouviu a proposta de secretários estaduais de Fazenda, que prevê a destinação de recursos de um IVA amplo para ajudar estados mais pobres.

Na quinta, o secretário de Fazenda de Pernambuco, Décio Padilha, esteve reunido com o deputado para tratar da proposta de mudanças nos impostos.

De acordo com ele, Maia concordou com 11 dos 12 pontos apresentados e se mostrou favorável ao fundo de desenvolvimento regional, mas ressaltou não ter uma posição sobre a fonte de recursos.

O presidente da Câmara ficou de discutir o ponto com Aguinaldo Ribeiro, relator da reforma, e com os parlamentares. "Se não é o melhor caminho e se o governo federal não concorda, o caminho natural é o Congresso encontrar um meio-termo", disse.

Foi Maia quem assumiu o posto de principal fiador da reforma da Previdência. Após seguidos ataques da ala ideológica do governo, ele chegou a se afastar do trabalho de conversar com os líderes e convencer a maioria da Câmara a fazer a proposta avançar.

O mercado financeiro e analistas reagiram. Sem o apoio de Maia, viam com ceticismo a chance de a reforma ser aprovada. Guedes interveio e abafou a crise.

A crise agora, porém, é com o núcleo econômico do governo. Por isso, há a preocupação de técnicos do ministério.

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