Siga a folha

BC vê risco de lavagem em operações da Binance, maior corretora de criptomoedas do Brasil

Regulador pediu dados de clientes ao banco Acesso, responsável pelas transações da corretora no Brasil; empresa nega ter sido notificada

Assinantes podem enviar 5 artigos por dia com acesso livre

ASSINE ou FAÇA LOGIN

Continue lendo com acesso ilimitado.
Aproveite esta oferta especial:

Oferta Exclusiva

6 meses por R$ 1,90/mês

SOMENTE ESSA SEMANA

ASSINE A FOLHA

Cancele quando quiser

Notícias no momento em que acontecem, newsletters exclusivas e mais de 200 colunas e blogs.
Apoie o jornalismo profissional.

Brasília

O Banco Central notificou o banco Acesso, responsável pelas transações da corretora líder do mercado brasileiro de criptomoedas Binance, sobre o alto risco de lavagem de dinheiro nas operações e exigiu o envio de informações detalhadas sobre os clientes.

A pressão ocorre no momento em que o Congresso Nacional está prestes a votar o projeto de lei que cria regras para o mercado de criptoativos. O BC queria normas mais rígidas, mas cedeu como forma de garantir a aprovação da proposta antes do recesso parlamentar.

No entanto, em vez de cumprir a determinação, a Binance optou por trocar de parceiro. No lugar da Capitual, braço financeiro da empresa com o banco Acesso, escolheu a Latam Gateway, que opera com o banco BS2.

Em meio à pressão do BC, as empresas entraram em litígio. No centro dessa disputa há, pelo lado da Binance, acusações de coação e de roubo de clientes e, pelo lado da Capitual e do Acesso, suspeitas de operações de lavagem contra a corretora.

Ilustração sobre criptomoedas - Reprodução

Hoje, as corretoras de criptomoedas precisam ter um parceiro financeiro, como um banco (regulado pelo BC), para realizar as operações, mas o dinheiro movimentado pelos clientes não precisa circular em contas correntes individuais.

Todas as transações da Binance, por exemplo, passam por uma conta gráfica, uma espécie de conta corrente-ônibus que carrega todos os clientes lá dentro. Essa operação vinha sendo feita pela Capitual e pelo Acesso até ser rompida no mês passado.

O problema, segundo o BC, foi que a Binance movimentou R$ 40 bilhões em 2021 sem que o Acesso, a instituição regulada, tivesse qualquer controle sobre quem foram os clientes e se a origem dos recursos era lícita.

A Binance foi uma das empresas usadas no esquema fraudulento de pirâmide financeira atribuído ao ex-garçom Glaidson Acácio dos Santos, conhecido como "faraó do bitcoin". Ele foi preso pela Polícia Federal na operação Kryptos.

No documento enviado ao banco, ao qual a Folha teve acesso, o BC determinou, em maio deste ano, que o banco passasse a ter condições de identificar cada cliente da Binance, uma forma de evitar o uso das criptomoedas em operações fraudulentas, lavagem de dinheiro e até financiamento de organizações criminosas.

Por meio de sua assessoria, a Binance negou qualquer tipo de determinação do BC, tanto a ela diretamente quanto ao banco Acesso ou à Capitual.

Um processo judicial entre a Binance e a Capitual que tramita em São Paulo sob segredo de Justiça indica que a parceira da Binance vinha usando a notificação do BC ao banco Acesso para pressionar a Binance a abrir contas correntes individualizadas sob o argumento de que essa seria a única forma de atender à exigência do regulador.

Em vez de ter uma só conta, a Binance precisaria migrar para um novo modelo de uma conta para cada cliente. Se levasse isso adiante, teria sua carteira de clientes aberta para seus parceiros de operação, algo que ela não queria.

A empresa, que no Brasil concentra 52% das operações envolvendo criptomoedas, como o bitcoin e o ethereum, mantinha suspeitas de que a Capitual e o Acesso pretendiam tomar seus clientes.

Segundo relatos, alguns desses clientes mencionaram para a Binance que foram abordados por funcionários da Capitual, o que a empresa nega.

Em mensagens de executivos das empresas, transcritas na ação, um representante da Capitual afirma que, por exigência do BC sobre o Acesso, seria preciso individualizar as contas correntes.

A executiva da Binance respondeu que seria impossível ter aval de seus superiores fora do Brasil em 45 dias, prazo que, segundo a Capitual, tinha sido dado pelo BC.

Na conversa, o executivo da Capitual disse então que o sistema tecnológico para o sistema supostamente exigido pelo BC estava pronto, mas que seria preciso assinar um contrato de exclusividade, forma de evitar que os investimentos fossem perdidos posteriormente.

A Binance toma isso como coação na conversa e exige que os assuntos sejam tratados separadamente.

Nos bastidores, a empresa disse que não poderia tomar qualquer decisão sem saber se, de fato, o BC tinha exigido essa "individualização de contas".

No documento a que a Folha teve acesso, o regulador impõe a abertura de dados do cliente para o Acesso, não necessariamente para a Capitual.

Menciona, no entanto, somente a necessidade de conhecer o cliente, uma espécie de ficha cadastral, sem fazer menção à abertura de contras individuais.

O BC quer que o banco saiba, por exemplo, quem é o cliente, onde trabalha, quanto ganha e que tipo de transação costuma fazer, como forma de identificar possíveis práticas ligadas à lavagem de dinheiro.

O resultado dessa discussão é que a Binance conseguiu bloquear os recursos movimentados pela Capitual na Justiça, o equivalente a R$ 450 milhões, enquanto trocava de parceiros, o que ocorreu na semana passada.

A Binance considera que, em nenhum momento, foi solicitada para individualizar contas. A empresa afirma, por meio de sua assessoria, que "não é cliente do Acesso e que nunca foi informada sobre qualquer solicitação do Banco Central para individualização de contas".

A Binance diz ainda que possui ferramentas e processos robustos para garantir a segurança das operações para todos os usuários.

"A empresa tem uma equipe de investigação de renome mundial, com ex-agentes internacionais, que trabalha em constante coordenação com as autoridades locais no combate a crimes cibernéticos e financeiros, inclusive no rastreamento preventivo de contas suspeitas e atividades fraudulentas", disse a empresa via assessoria.

Sobre a Capitual, a Binance disse que a empresa não é mais sua provedora de pagamentos "por ações [da Capitual] que conflitam com os seus valores, e que tomou todas as medidas necessárias e cabíveis em relação à empresa para proteger os usuários e seus recursos e assegurar que eles não sejam afetados negativamente pela mudança".

No entanto, disse que não comentaria o processo, porque ele segue sob segredo de Justiça.

A Capitual também não quis comentar. Por meio de sua assessoria, a empresa informou que as medidas em discussão com a Binance tinham como objetivo adequar o Acesso às normas exigidas pelo BC.

Procurado, o banco Acesso não respondeu até a publicação desta reportagem.

Receba notícias da Folha

Cadastre-se e escolha quais newsletters gostaria de receber

Ativar newsletters

Relacionadas