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Convenção republicana marcou divórcio entre Trump e velha guarda do partido

Nenhum ex-presidente, vice ou figura de destaque de gabinetes republicanos passados esteve presente no evento

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Adam Nagourney
The New York Times

A convenção republicana foi um desfile de policiais, soldados, líderes religiosos, mães, assessores da Casa Branca, membros da família Trump e estrelas republicanas em ascensão, todos cantando os louvores do presidente Donald Trump ao longo de quatro dias. Mas um grupo parece ter ficado de fora do show: o establishment republicano antes dominante que governou na era pré-Trump.

A presença prevista na noite de quinta-feira (27) de alguns líderes republicanos atuais –em especial, Mitch McConnell, líder da maioria no Senado, e Kevin McCarthy, líder da minoria na Câmara dos Deputados—serviu para lembrar aqueles que, em sua maioria, não receberam um espaço sobre o palco.

O presidente George W. Bush discursa ao lado de Robert Gates (à esquerda), secretário de Defesa dos Estados Unidos e Condoleezza Rice, secretária de Estado, em Washingon, capital dos EUA - Kevin Lamarque - 2.jan.2007/Reuters

Nenhum Bush, Cheney, Baker ou Doyle esteve na convenção. Não houve nenhum ex-presidente ou vice republicano, tampouco figuras de destaque de gabinetes republicanos passados, como Condoleezza Rice, que foram parte de Casas Brancas republicanas nas décadas anteriores à eleição de Trump.

De fato, dois nomes praticamente não foram mencionados ao longo de cerca de dez horas de discursos e vídeos da convenção: Bush e Reagan (muito menos alguém chamado McCain).

A ausência deles parece representar a assinatura final do divórcio entre a velha guarda republicana e Trump, além de ser uma prova, se ainda fosse preciso, do quanto Trump tomou controle do partido.

O sentimento é mútuo. A velha guarda –os representantes eleitos, membros de gabinetes e políticos—manifestaram pouco interesse em participar do show de Trump, assim como Trump não se interessou em contar com a participação dela.

“Não foi por apreço ao Partido Republicano que ele se candidatou”, comentou Torie Clarke, que serviu na Casa Branca nos governos de Ronald Reagan, George Bush e George W. Bush. “Não foi por conta do Partido Republicano que ele ganhou. Acho que isso não constitui surpresa.”

Matthew Dowd, que foi estrategista sênior de George W. Bush, comentou que a hostilidade é mútua. “Praticamente nenhuma das pessoas que discursaram na convenção republicana teriam sido convidadas para discursar na convenção de 2004, e isso inclui Donald Trump”, disse.

Assessores de Trump disseram que os organizadores fizeram questão de não promover figuras do establishment republicano. “A convenção buscou destacar vozes de pessoas reais, que se beneficiaram das políticas do presidente Trump”, explicou Tim Murtaugh, diretor de comunicações da campanha.

Em vez de ocuparem um lugar no pódio ou de se envolverem no planejamento da convenção e da campanha, esses nomes da velha guarda republicana acompanharam o evento a distância, se é que prestaram muita atenção a ele. Muitos dos republicanos da velha guarda, especialmente os mais próximos dos Bush e do senador John McCain, estão fazendo oposição ativa a Trump.

Alguns deles endossaram seu adversário democrata, Joe Biden.

Linda Fowler, professora de ciência política no Dartmouth College, disse que uma função importante de uma campanha é “reforçar o ‘nome de marca’ de um partido político, exibindo seus líderes anteriores e festejando suas raízes”.

“Considerando que nada foi discutido ou decidido na convenção, que ela não produziu nenhuma plataforma e não fez nada para promover os candidatos republicanos a cargos legislativos, é difícil entender por que foi realizada”, disse ela. “Foi um mero programa de televisão.”

Sempre há alguma tensão natural durante uma transição de poder, mesmo entre membros do mesmo partido. Os presidentes que estão de saída, especialmente os impopulares, às vezes mantêm distância de convenções que envolvem seus potenciais sucessores.

Em 2008, George W. Bush não compareceu à convenção republicana em que McCain foi nomeado candidato republicano para disputar a Presidência com Barack Obama.

Sig Rogich, que foi assessor importante de Reagan e de George Bush pai, disse que Bush chegou com sua equipe própria depois de conquistar a Casa Branca em 1988. Mas, disse a respeito dos dois campos republicanos, “eles ainda estavam muito alinhados e colegiados”.

Não é o que ocorre hoje. Trump já deixou muito claro seu desdém pela dinastia Bush. Ele não foi convidado a discursar no funeral de George Bush pai e demonstrou prazer em desancar Jeb Bush, ex-governador da Flórida, depois de derrotá-lo na disputa pela candidatura presidencial republicana em 2016.

E ele se abstém de aderir à reverência que o partido expressa por Ronald Reagan.

“Trump é alérgico aos republicanos do establishment, e não surpreende que estes tenham sido deletados da convenção”, disse Mark McKinnon, que foi assessor chefe de mídia de George W. Bush.

“Trump remodelou o partido completamente à sua imagem. Acho que ele não gosta de ser lembrado de qualquer coisa que o antecedeu.”

O presidente americano, Donald Trump, aceita formalmente a nomeação como candidato do partido à reeleição, na convenção republicana realizada na Casa Branca - Brendan Smialowski - 27.ago.20/AFP

Joe Gaylord, assessor sênior do ex-presidente da Câmara Newt Gingrich, disse que, sob a direção de Trump, o partido voltou para suas raízes históricas anteriores a Segunda Guerra Mundial –protecionistas e isolacionalistas—, distanciando-se do establishment que comandou o partido de 1980 a 2016.

Segundo ele, o processo se acelerou à medida que a influência de Trump tomou conta da liderança do partido nos Estados e condados do país.

“Os partidos políticos sempre assumem a imagem de seu presidente, e os partidos evoluíram muito”, comentou Gaylord. “Trump passou da evolução dos partidos para a revolução de nosso partido. Está muito claro que ele não fez parte da velha guarda, e esta não se relaciona muito com ele.”

Tradução de Clara Allain

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