Siga a folha

Estudantes boicotam volta às aulas e protestam contra ditador da Belarus

Lukachenko se aproxima ainda mais da Rússia, e oposição tem raro desentendimento público após formação de novo partido

Continue lendo com acesso ilimitado.
Aproveite esta oferta especial:

Oferta Exclusiva

6 meses por R$ 1,90/mês

SOMENTE ESSA SEMANA

ASSINE A FOLHA

Cancele quando quiser

Notícias no momento em que acontecem, newsletters exclusivas e mais de 200 colunas e blogs.
Apoie o jornalismo profissional.

Minsk e Moscou | Reuters

Milhares de estudantes boicotaram o início do ano letivo na Belarus, nesta terça-feira (1º), e realizaram manifestações contra o ditador Aleksandr Lukachenko —que ocupa o cargo desde 1994.

Os manifestantes marcharam pelas ruas de Minsk levando bandeiras da oposição e coletando assinaturas em várias faculdades para um abaixo-assinado que pede a renúncia do líder do país, segundo a agência Reuters. Vídeos publicados em redes sociais mostram alguns dos estudantes sendo presos.

A mídia local também registrou protestos em duas grandes plantas industriais de tratores, que representam o modelo econômico de estilo soviético de Lukachenko. Trabalhadores do Parque de Alta Tecnologia de Belarus, nos arredores da capital, também se juntaram aos protestos desta terça.

Estudante é detido por forças de seguranças bielorrussas durante protestos contra o governo do ditador Aleksandr Lukachenko - Tut.by/Reuters

Os atos atendem a mais um chamado de uma das principais líderes da oposição, Svetlana Tikhanovskaia, exilada na vizinha Lituânia após ser derrotada nas eleições presidenciais de 9 de agosto. Os resultados, que atribuíram 80% dos votos a Lukachenko foram muito contestados na Belarus e por grande parte da comunidade internacional.

Para Tikhanovskaia, o boicote dos estudantes é necessário para "mostrar que os jovens não podem se manter afastados dos eventos acontecendo na Belarus".

O início do ano escolar também foi usado por Lukachenko para tentar marcar um limite aos protestos que ocorrem há mais de três semanas no país. Em visita a uma faculdade na região sudoeste, o ditador "enfatizou que o verão cheio de acontecimentos está terminado", segundo a agência estatal de notícias Belta.

"É hora de canalizar a energia na direção da criatividade", disse ele.

Nesta terça, investigadores de direitos humanos da Organização das Nações Unidas pediram às autoridades da Belarus que parem com os abusos, em referência a relatórios que apontam centenas de casos de tortura e espancamentos de manifestantes por forças policiais.

O grupo afirma ter recebido 450 casos documentados de tortura e maus-tratos, incluindo violência contra mulheres e crianças, abuso sexual e estupro com cassetetes.

"Estamos extremamente alarmados com as centenas de alegações de tortura e maus-tratos sob custódia policial", disseram os especialistas em um comunicado conjunto.

Os investigadores exigiram que o país garanta as salvaguardas legais, incluindo o registro imediato de detenções, supervisão legal dos casos e notificação das famílias dos presos. O objetivo é prevenir "desaparecimentos forçados" —quando as autoridades negam a detenção de alguns indivíduos.

O governo bielorrusso nega os abusos. Serguei Kabakovich, representante do Comitê de Investigação da Belarus, afirmou que não estava a par de qualquer caso de tortura ou maus-tratos.

"Continuamos trabalhando para estabelecer todas as circunstâncias objetivas", disse à agência Reuters. "Atividades de averiguação estão acontecendo."

Também nesta terça, seis jornalistas que cobriam os protestos contra Lukachenko passarão a noite presos e serão julgados na quarta (2) por "violação da ordem de organização ou realização de eventos de massa", segundo a polícia.

Os repórteres foram detidos para "verificar documentos" às 17h (horário local, 11h no Brasil) quando acompanhavam manifestações perto do estádio olímpico nacional. Estavam identificados com coletes azuis e a palavra imprensa e tinham crachás individuais.

Se forem considerados culpados, estão sujeitos a multa ou prisão administrativa.

Lukachenko enfrenta o maior desafio de seu regime, que já dura 26 anos, desde sua contestada vitória nas eleições. Ele nega fraude eleitoral e não demonstra que irá recuar apesar das ameaças de sanções contra seu país.

Nesta segunda (31), Lituânia, Letônia e Estônia impuseram proibições de viagens a Lukachenko e outras 29 autoridades bielorrusas.

Em resposta, o ditador da Belarus sugeriu que deve redirecionar cargas dos portos dos países bálticos para portos russos. A Belarus não tem saída para o mar e depende dos portos desses países.

"Claro, seria um pouco desvantajoso para nós, mas podemos negociar tarifas com os russos", disse Lukachenko.

A União Europeia também está trabalhando em uma lista de indivíduos que serão alvos de sanções —mas Lukachenko não deve ser incluído, por temor de provocar uma intervenção russa.

O ditador da Belarus já ameaçou cortar rotas europeias que passam por seu país em retaliação a quaisquer sanções. Oleodutos e gasodutos herdados do império comunista transformaram o país numa escala vital para a exportação de gás russo à Europa.

Passam por dutos na Belarus um quinto do gás que a Rússia fornece aos europeus e um quarto do petróleo que vai pelo mesmo caminho —40% do gás e 30% do petróleo que a UE consome saíam da Rússia antes da pandemia, segundo o órgão de estatísticas do bloco, a Eurostats.

A Belarus é o aliado mais próximo da Rússia entre as repúblicas da antiga União Soviética, e seu território é central na estratégia de defesa de Moscou em relação à Europa —porque o país separa a Rússia das forças ocidentais da Otan, o bloco militar liderado pelos EUA.

Lukachenko é um inconveniente aliado, dada a habilidade do bielorrusso de extrair vantagens de Moscou. Mas as opções do ditador vêm se estreitando, e a Rússia tem ampliado sua esfera de influência sobre a Belarus.

O presidente Vladimir Putin fez um convite para que Lukachenko visite a Rússia, e os dois países estão discutindo o refinanciamento da dívida bielorrussa, segundo a agência russa Interfax.

CHOQUE NA OPOSIÇÃO

Enquanto Lukachenko vai estreitando ainda mais os laços com a Rússia, a oposição bielorrussa apresentou um raro desentendimento público nesta semana. Em nota divulgada nesta terça, Tikhanovskaia, principal candidata de oposição na última eleição, criticou a estratégia de um outro grupo opositor com o qual se aliou durante a campanha.

Quando se exilou na Lituânia, Tikhanovskaia lançou um conselho de oposição com o objetivo de garantir uma transferência pacífica de poder no país. Na nota pública, a ex-candidata afirmou que o conselho "não deve ser dominado por nenhum partido político".

O comunicado surge após outra líder opositora Maria Kalesnikava e a equipe de Viktor Babariko, candidato à Presidência que foi preso antes das eleições, anunciarem a criação do partido Juntos.

Tikhanovskaia afirmou também que o objetivo de promover uma reforma constitucional, anunciado pelo novo partido, é uma distração do objetivo principal que é a derrubada de Lukachenko e a realização de novas eleições.

Em resposta, o grupo ligado a Kalesnikava emitiu uma nota em tom conciliatório afirmando que não deseja atrapalhar o trabalho do conselho e que apoia o pedido de Tikhanovskaia por novas eleições, assim como seu programa eleitoral.

"Nenhum bielorruso duvida da vitória de Svetlana Tikhanovskaia, e que sua vitória foi roubada", diz o comunicado.

Receba notícias da Folha

Cadastre-se e escolha quais newsletters gostaria de receber

Ativar newsletters

Relacionadas