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As mentiras de Trump: uma lição para os meios de comunicação

Será que as mídias deixarão de colocar a propaganda trumpista acima de tudo, nas próximas semanas, meses e anos?

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Federico Finchelstein

Professor de história na New School, em Nova York, doutor pela la Cornell University, lecionou na Brown University. Autor de obras sobre fascismo, populismo, o Holocausto e ditaduras

Latinoamérica21

Donald Trump perdeu as eleições dos Estados Unidos, mas ainda prefere viver no mundo alternativo que sua própria propaganda criou. Nesse universo bizarro, ele é considerado um herói invencível de proporções míticas, que decide o que é o bem e o que é o mal, o que é falso e o que não é.

Na verdade, Trump primeiro mentiu dizendo ter vencido as eleições, e depois passou dias negando sua derrota inegável, mas no “trumpworld” o líder continua a ser considerado vencedor. Essa negação fanática da realidade é uma essência chave do trumpismo.

É necessário pensar nas causas que tornaram possível que os Estados Unidos produzissem, elegessem e agora despedissem um líder que apresentou uma combinação populista de direita tão desastrosa de negação da ciência com relação à Covid-19, somada a racismo, violência, corrupção e posições e ações falhas em termos de economia, política, saúde, mudança climática e desigualdade de renda.

Uma parte chave da explicação são as mentiras. Em resumo, Trump e os seus fabricaram, fizeram circular e venderam mentiras, e muitos americanos as compraram. A fabricação de desinformações será recordada como a marca registrada do trumpismo.

Mas não devemos esquecer que uma lição igualmente significativa é a de que o trumpismo teve sucesso porque as notícias reais foram constantemente minimizadas nas mídias pela amplificação da propaganda governamental.

O republicano Donald Trump, derrotado na tentativa de se reeleger para a Presidência dos EUA pelo democrata Joe Biden, durante pronunciamento na Casa Branca, em Washington - Mandel Ngan - 4.nov.2020/AFP

Como candidato em 2016, Trump recorreu ao “birtherism” (mentiras racistas que sustentam que o presidente Barack Obama não nasceu nos Estados Unidos) e a outras teorias da conspiração a fim de se apresentar como ator político chave. Como presidente, ele atingiu um nível inédito de propaganda, com suas falsidades sobre minorias, imigrantes e, por último mas não menos importante, o coronavírus.

Por isso, de todas as coisas que foram ditas sobre Donald Trump, a comparação com um dos mentirosos mais infames da história, Joseph Goebbels, o ministro da Propaganda nazista, continua a ser a mais extrema e, ainda assim, a mais exata. A razão para isso é simples: Trump mente com técnicas de propaganda fascista.

Ao explicar por que o presidente Trump mente tanto, Joe Biden, o presidente eleito, recorreu recentemente a uma comparação histórica adequada, dizendo que Trump “mente como Goebbels. Se você disser uma mentira um número de vezes suficiente, e continuar repetindo, repetindo, repetindo a mentira, ela se torna conhecimento comum”.

Como muitos historiadores do fascismo e do populismo, acredito que Biden esteja certo, ainda que, como explico em meu trabalho sobre as mentiras fascistas, Goebbels nunca tenha afirmado que repetir mentiras era parte de sua estratégia. Mesmo assim, como Trump, ele acreditava nas mentiras que inventava.

A maioria dos políticos mente, sem dúvida, mas, como mentiroso, Trump joga em uma liga diferente.

De uma perspectiva histórica, não resta dúvida de que Trump participa de uma tradição de mentiras totalitárias que nada tem a ver com as mentiras convencionais dos políticos comuns, tanto de esquerda como de direita. E quanto a isso a crítica de Biden está correta.

Trump mente como o líder de uma seita. Acredita que suas mentiras estão a serviço de uma verdade mais ampla baseada em uma fé que ele mesmo personifica.

A história do fascismo apresenta grande número de casos de mentirosos desse tipo, que acreditam e querem mudar o mundo de forma a ajustá-lo às suas mentiras, de Benito Mussolini a Adolf Hitler e muitos outros políticos e ideólogos.

Há uma cronologia de mentiras totalitárias. Os fascistas expandiram e dominaram a fabricação de mentiras depois de passarem anos no poder. O mesmo aconteceu com o trumpismo, e o paroxismo da mentira chegou ao seu ponto culminante nos últimos dias, com as mentiras sobre fraudes e votos ilegais.

Mas a verdadeira notícia é que Trump já não poderá fabricar e difundir mentiras da Casa Branca. E pelo menos nos últimos dias o ciclo de notícias deixou de ter Trump como centro. A circulação pela mídia das mentiras criadas por Trump foi moeda corrente nos últimos quatro anos, mas isso mudou com a derrota dele.

Será, porém, que as mídias aprenderam a lição e deixarão de colocar a propaganda trumpista acima de tudo, nas próximas semanas, meses e anos?

Essa lição também se aplica aos aliados de Trump em escala internacional.

A exemplo de Trump, populistas pós-fascistas como Jair Messias Bolsonaro, no Brasil, ou Narendra Modi, na Índia, vêm mentindo há muitos anos, mais recentemente sobre o coronavírus, e, de novo como Trump, utilizaram essas mentiras como desculpa para promover suas vocações totalitárias.

Não é por acaso que a repressão e violência aumentaram nos Estados Unidos, no Brasil e na Índia ao mesmo tempo em que os três países se tornaram os mais atingidos pelo vírus.

Biden tem razão: Trump mente como Goebbels. Se essa lição não for aprendida, e se mentiras de tipo fascista como as dele forem colocadas em circulação de forma acrítica, a democracia voltará a se ver ameaçada por formas futuras de trumpismo.

www.latinoamerica21.com, um projeto plural que difunde conteúdo produzido por especialistas em América Latina.

Tradução de Paulo Migliacci

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