Grupos estudam candidaturas coletivas para 'desafiar o sistema'

Ideia é ter diversas pessoas fazendo campanha com um número só

Conteúdo restrito a assinantes e cadastrados Você atingiu o limite de
por mês.

Tenha acesso ilimitado: Assine ou Já é assinante? Faça login

Joelmir Tavares
São Paulo

Em busca de inovar não só no conteúdo, mas também na forma, movimentos que pregam renovação política preparam o lançamento de candidaturas coletivas para o Legislativo, numa espécie de "contestação" do sistema vigente.

"Você vota em um e leva 18", diz Cesar Santos, 38, do Mandato Conjunto 18, grupo de São Paulo que pretende lançar uma chapa com filiados a vários partidos para concorrer ao Senado. Membros da Rede, do PV e do PSB estão participando das discussões.

A ideia é ter várias pessoas fazendo campanha como se fossem uma coisa só, divulgando um mesmo número de urna. Uma das 18 pessoas que devem compor a candidatura estará registrada perante a Justiça Eleitoral, como é hoje.

Na prática, essa pessoa será tão candidata quanto as outras. Se a empreitada for vencedora, o postulante para fins legais terá que cumprir o compromisso de levar os colegas para o gabinete. E aí se iniciaria uma gestão compartilhada, com participação de todos nos rumos e decisões.

Proposta semelhante tem a Bancada Ativista, grupo mais à esquerda que engatilha candidaturas coletivas para a Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo. O plano é unir de dez a 15 pessoas sem experiência eleitoral e tentar assumir uma cadeira na Casa.

Parece diferente? E é. Tanto que o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) trata o tema no campo da hipótese. A corte diz que o assunto "pode ser submetido à apreciação" no futuro. Hoje não há um parecer sobre implicações do modelo.

Questionamentos incluem a eventual caracterização dessas campanhas como coligações. Os grupos estão se cercando de consultoria jurídica para evitar problemas.

Uma das regras expressas em lei é que o filiado a um partido só pode aparecer na propaganda do membro de outra legenda se as duas siglas estiverem oficialmente coligadas.

Campanhas teriam que deixar claro para o eleitor que na urna apareceria a foto de uma pessoa, mas que, caso ela se eleja, arrastará o grupo todo.

Empurrão

Num esforço para estimular a ideia de subverter a lógica atual, o Mandato Conjunto 18 quer chamar outros movimentos e propor que tenham candidaturas coletivas. "Vamos conversar com lideranças do Agora!, do Acredito, do RenovaBR", afirma Santos.

Na Bancada, integrantes falam em "desafiar" o modelo posto e veem sua proposta como uma "experimentação" para mostrar que as formas atuais de campanha e de representação estão esgotadas.

O grupo tem um sucesso no currículo: a eleição, em 2016, de Sâmia Bomfim (PSOL) como vereadora na capital.

A diferença é que na campanha municipal a organização funcionou mais como "curadora" de candidaturas. As campanhas se ajudavam e se divulgavam, mas cada concorrente tinha o próprio registro.

Embora deva ficar de fora do novo projeto da Bancada (ela cogita tentar a Câmara dos Deputados), Sâmia aprova a evolução do esquema. "Abre uma fissura no sistema", diz.

As discussões nos movimentos já abordam até a remuneração no gabinete. O Mandato Conjunto 18 cogita somar os salários do senador “oficial” com os dos “senadores paralelos” e dividir o valor por igual, para que todos tenham o mesmo salário.

A preocupação nos movimentos é formar equipes coesas, que tenham o máximo de entrosamento, para evitar o risco de atritos no caso de elas conseguirem chegar à Assembleia ou ao Senado.

'Horizontalidade'

Os discursos de entusiastas da ideia incluem expressões como “quebra de hierarquia”, “gestão compartilhada”, “democracia participativa” e “horizontalidade”.

Uma inspiração para as iniciativas é o grupo mineiro Muitas, que em 2016 elegeu duas mulheres para a Câmara de Belo Horizonte. 

Eram 12 candidatos, que, nas propagandas, pediam voto para si e para os colegas de grupo. Só que todos eram registrados individualmente e filiados à mesma sigla, o PSOL —duas diferenças em relação ao proposto agora e que acabavam facilitando o modelo.

Depois de ganharem, Áurea Carolina e Cida Falabella tiraram divisórias que separariam suas salas na Câmara e criaram um ambiente conjunto (que chamam de “Gabinetona”), onde parte dos outrora candidatos hoje trabalha.

Para 2018, o Muitas articula repetir o modelo, com uma rede de pessoas disputando a Assembleia de Minas e a Câmara dos Deputados.

Outro exemplo vem de Alto Paraíso (GO), onde um grupo de cinco “cocandidatos” conseguiu uma cadeira de vereador na Câmara em 2016.

Relacionadas