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Hans fez relato falso à Procuradoria um ano antes de mentir à CPMI no Congresso

Ex-funcionário de empresa de disparos de mensagens deu declarações falsas ao Ministério Público Eleitoral

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São Paulo

Um ano e dois meses antes de prestar depoimento com mentiras à CPMI das Fake News, no Congresso, Hans River do Rio Nascimento já havia dado declarações falsas para procuradores em uma apuração do Ministério Público Eleitoral em São Paulo. 

Hans é ex-funcionário da empresa Yacows, especializada em disparos de mensagens em massa pelo WhatsApp, onde atuou nas eleições de 2018. Em 12 de dezembro do mesmo ano, ele foi questionado em ação que investigava disparos de mensagens em benefício de candidatos nas eleições.

Depoimento de Hans River Nascimento ao Ministério Público em dezembro de 2018 - Reprodução

Assim como ocorreu na semana passada em depoimento no Congresso Nacional, ele fez relatos mentirosos aos procuradores sobre seu contato com a repórter Patrícia Campos Mello, da Folha.

Patrícia é coautora de reportagem da Folha de dezembro de 2018 segundo a qual uma rede de empresas, entre elas a Yacows, recorreu ao uso fraudulento de nome e CPF de idosos para registrar chips de celular e assim conseguir o disparo de lotes de mensagens em benefício de políticos.

A reportagem teve como base documentos da Justiça do Trabalho, além de relatos de Hans e documentos entregues por ele à jornalista.

Ao falar sobre isso à CPMI, Hans mentiu e insultou a repórter da Folha ao dizer que ela havia se insinuado sexualmente com a intenção de obter informações para uma reportagem "a troco de sexo". Na Procuradoria Eleitoral, ​ele não difundiu diretamente os insultos, mas usou de uma série de mentiras.

Aos procuradores, por exemplo, Hans disse que a repórter havia entrado em contato com ele em razão de um livro que ele havia escrito. Mensagem enviada na época, porém, mostra que a reportagem procurou ele pela primeira vez para falar a respeito do processo trabalhista que ele movia contra a Yacows.

Nas mensagens trocadas com Patrícia na época, Hans ainda se mostrou disposto a falar sobre seu processo trabalhista e escreveu: "Tenho muito a dizer".

Nesta terça-feira (18), ao insultar a repórter da Folha, o presidente Jair Bolsonaro citou esse depoimento de Hans. "O depoimento do Hans River foi final de 2018 para o Ministério Público, ele diz do assédio da jornalista em cima dele", afirma o presidente, para, em seguida, aos risos, fazer o insulto com insinuação sexual. "Ela [repórter] queria um furo. Ela queria dar o furo a qualquer preço contra mim [risos dele e dos demais]."

No depoimento à Procuradoria, Hans também afirma que não sabe como a jornalista havia conseguido uma lista de 10 mil nomes de usuários do WhatsApp que seriam os alvos dos disparos de mensagens.

“A jornalista chegou lá comunicando sobre essa lista de 10 mil nomes. (...) Ela falou assim: 'Ah, vamos entrar na sua casa?' E eu peguei e falei para ela que minha mãe não aceitava mulher na minha casa e tal, toda aquela coisa, e não deixei ela entrar. E ela estava tocando muito a fundo nessa questão dessa lista dos 10 mil nomes, que eu não sei de que maneira chegou a ela, que eu não sei de que forma ela conseguiu ter uma ideia disso”, afirmou Hans, no depoimento.

O próprio Hans, porém, foi quem falou sobre a lista de 10 mil nomes e CPFs e enviou a lista à repórter por email e por WhatsApp, como demonstram as mensagens.

O ex-funcionário da Yacows também afirmou no processo eleitoral que Patrícia foi até sua casa, mas a repórter nunca foi ao local —eles se encontraram em uma padaria e depois Hans foi à Redação da Folha.

A apuração eleitoral na qual Hans foi testemunha em São Paulo deu origem a uma ação de impugnação de mandato contra 12 candidatos ao cargo de deputado em 2018. Neste ano, a ação foi considerada improcedente pelo Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo.

 
Ex-funcionário de empresa de disparos em massa, Hans Nascimento (à dir.) presta depoimento nesta terça (11) na CPMI das Fake News - Jane de Araújo/Agência Senado

Entenda abaixo as principais informações falsas dadas pelo ex-funcionário da Yacows. ​

“Ela conversou comigo num dia, porque eu sou cavaquinista de escola de samba e tudo mais, que é a única coisa que realmente eu sei fazer, e eu acabei escrevendo um livro. Eu não sei de que maneira ela descobriu do livro. Eu não sei de que maneira ela conseguiu descobrir meu telefone, meu endereço. Bateu na minha casa falando do conteúdo do processo trabalhista que eu tinha aberto. Nessa que ela foi lá, ela sentou para conversar alegando que ficou sabendo do livro, que tinha gostado do livro, ela falava duas palavras comigo e a terceira era: mas você fez propaganda do Bolsonaro e do Doria? Eu falei não, mas eu não cheguei a fazer propaganda do Bolsonaro e do Doria. Aí ficou nessa insistência”

Mentira. A repórter falou desde o início que queria falar com Hans sobre o processo trabalhista, que é público. Ele se mostrou disposto a falar e disse: "Tenho muito o que falar" sobre isso. A repórter perguntou a ele de quais candidatos eram os conteúdos dos disparos.

Primeira troca de mensagens entre a reportagem da Folha e Hans River do Rio Nascimento - Reprodução

 
“A jornalista chegou lá comunicando sobre essa lista de 10 mil nomes. A lista que acho que vocês vão me perguntar agora. Ela chegou me perguntando dessa lista, e ela quis ir na minha casa, entrar na minha casa, não sei por que motivo, ela falou, ah, vamos entrar na sua casa, e eu peguei e falei pra ela que minha mãe não aceitava mulher na minha casa, toda aquela coisa e não deixei ela entrar. E ela estava tocando muito a fundo nessa questão dessa lista de 10 mil nomes, que eu não sei de que maneira chegou a ela, não sei de que forma que ela conseguiu”
 

Mentira. Quem falou sobre a lista de 10 mil nomes e CPFs foi o próprio Hans, que enviou a lista à repórter por email e por WhatsApp, como demonstram as mensagens.

Em troca de mensagens com a reportagem da Folha, Hans River do Rio Nascimento envia arquivos e fotos sobre o trabalho de disparo de mensagens em massa
Hans agradece à repórter por fazer a reportagem sobre o processo trabalhista e manda materiais
Hans envia à reportagem link de planilha com 10 mil nomes e CPFs - Reprodução


"Eu tive uma jornalista que curiosamente foi me procurar pelo WhatsApp, pela minha casa, bateu na minha casa para fazer uma busca, querer saber o que estava acontecendo e tudo mais."

Mentira. A repórter nunca fez uma busca na casa de Hans, ela o encontrou na padaria.

“Quando eu vi essa matéria no jornal, ela falou que eu tinha falado um monte de coisa, falou que eu tinha entregue um monte de coisa, que tinha gravações do que conversou comigo, o que ela me perguntou sobre o conteúdo da Yacows, era conteúdo que estava no processo. E ela mencionou sobre essa lista de 10 mil nomes. Tanto que quando eu estava mostrando pra ela, ela parecia que ia me ajudar a lançar o livro.“

Mentira. Hans concordou em falar com a repórter e ter seu nome divulgado. Toda a conversa está gravada. Ele agradeceu a repórter por o estar ajudando com o processo trabalhista (ele acabou fechando um acordo e recebendo R$ 10 mil da empresa, após a repórter da Folha ligar para a Yacows para ouvir a empresa sobre o caso). Ele enviou à repórter dezenas de fotos e prints que não estavam no processo. Foi Hans que mencionou a existência da lista de 10 mil nomes, e ele que passou o documento à repórter, como mostram as mensagens, autenticadas em atas notariais.

Primeira troca de mensagens entre a reportagem da Folha e Hans River do Rio Nascimento - Reprodução
Mensagem em que Hans envia à repórter áudios e fotos que não constam do processo trabalhista
Hans envia à reportagem link de planilha com 10 mil nomes e CPFs - Reprodução

 “Era campanha de todo mundo, menos do Bolsonaro e do Doria”

Mentira. Hans River deu várias versões diferentes à repórter sobre quais candidatos faziam disparos, e, depois, afirmou que não sabia e não tinha acesso aos conteúdos. A reportagem não menciona nenhum nome de político, porque Hans não forneceu nenhuma evidência concreta.​

 

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