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Apple desenvolve alternativa a buscas do Google após processo antitruste nos EUA

Empresa se movimenta caso as autoridades regulatórias bloqueiem sua lucrativa parceria com a big tech

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Londres | Financial Times

A Apple está acelerando seus esforços para desenvolver tecnologia de buscas própria, agora que as autoridades antitruste dos Estados Unidos estão ameaçando os pagamentos de bilhões de dólares que o Google realiza para garantir posicionamento privilegiado no iPhone ao seu serviço de buscas.

Em uma mudança que não chamou muita atenção na versão mais recente do sistema operacional do iPhone, o iOS 14, a Apple começou a oferecer resultados de busca próprios e links diretos para sites, quando os usuários digitam buscas na tela inicial do smartphone.

Essa capacidade de busca na Web representa um importante avanço no desenvolvimento interno de buscas pela Apple e pode servir de base a um ataque mais amplo ao Google, de acordo com diversas pessoas do setor.

Logo da Apple em uma loja em Pequim, China - Greg Baker/AFP

A companhia do Vale do Silício é notória pelo sigilo que guarda sobre seus projetos, mas a modificação vem se somar às provas crescentes de que ela está desenvolvendo um rival para o serviço de buscas do Google.

Dois anos e meio atrás, a Apple contratou John Giannandrea, o vice-presidente de pesquisa do Google. A contratação ocorreu ostensivamente para reforçar suas capacidades de inteligência artificial e a assistente virtual Siri, mas também levou à empresa os oito anos de experiência que ele teve no comando do serviço de buscas mais popular do planeta.

A capacidade de busca crescente que a Apple oferece representa uma alternativa caso as autoridades regulatórias bloqueiem sua lucrativa parceria com o Google. Quando o Departamento da Justiça americano abriu um processo na semana passada sobre os pagamentos que o Google faz à Apple para ser o programa de buscas padrão em seus smartphones, a iniciativa ganhou urgência.

“Eles [a Apple] contam com uma equipe respeitável que eu acredito ter a experiência e a profundidade necessárias a construir um serviço de buscas mais geral, se eles assim desejarem”, disse Bill Coughran, ex-vice presidente de engenharia do Google e agora sócio da Sequoia Capital, uma empresa de capital para empreendimentos do Vale do Silício.

Os frequentes anúncios de empregos para engenheiros de busca na Apple não demonstram falta de ambição, convidando candidatos interessados em “definir e implementar a arquitetura da inovadora tecnologia de buscas da Apple”.

Os especialistas em marketing de buscas apontam para atividades ampliadas do Applebot, o “web crawler” antes obscuro do iPhone, que é usado para acumular o vasto banco de dados de material online que serve de fundação a qualquer serviço de buscas.

Suganthan Mohanadasan, consultor de marketing digital, disse que o Applebot apareceu “um número ridículo de vezes” nos sites de seus clientes, nas últimas semanas. “Quando o ritmo de ação do ‘crawler’ cresce, isso nos revela que eles estão tentando recolher mais informação”.

O mais significativo é que o iOS 14 descartou o Google para certas funções de busca. Buscas feitas na janela de buscas quando o usuário desliza a tela para a direita, na página inicial do iPhone —o que a Apple define como “Today’s View”—, mostram uma lista gerada pela Apple de sugestões de busca, em lugar de resultados do Google. Os resultados incluem sugestões acionadas pelo termo de busca que está sendo digitado geradas pela Apple, demonstrando que a empresa está aprendendo com os termos de busca mais utilizados pelo seu bilhão de usuários.

A Apple se recusou a comentar.

Logo do Google - Fabrice Coffrini/AFP

Criar um rival real para o serviço de buscas do Google pode demorar anos. Mas com lucros que devem exceder os US$ 55 bilhões este ano e uma reserva de caixa de US$ 81 bilhões, na mais recente avaliação, a Apple pode arcar com investimentos de longo prazo.

Ao longo da história, a companhia sempre tentou controlar os componentes mais importantes de seus produtos, dos chips especiais que acionam toda espécie de coisa, do iPhone aos acessórios AirPods e Watch, à integração estreita entre software e hardware.

Mas a Apple persistiu com o Google como serviço de busca padrão do iPhone por mais de uma década.
Agora, no entanto, a Apple tem incentivo crescente a mudar essa situação, porque as autoridades regulatórias a estão forçando a escolher entre defender seu relacionamento com o Google ou se voltar contra seu parceiro duradouro nas buscas.

O Departamento da Justiça dos Estados Unidos colocou os pagamentos de entre US$ 8 bilhões e US$ 12 bilhões anuais do Google para que o seu serviço de busca seja o recurso padrão do iPhone em posição central em seu processo antitruste contra o grupo de internet.

Sharis Pozen, uma das diretoras da área antitruste do escritório de advocacia internacional Clifford Chance, e ex-procuradora assistente do Departamento da Justiça americano, disse que o caso “abre uma nova frente para a Apple”, além de suas disputas judiciais com a Epic Games e outras empresas sobre seu papel como guardiã do acesso aos usuários, via App Store. “A Apple terá papel central no caso”, ela disse, acrescentando que a empresa terá de “caminhar na corda bamba” para explicar por que recebeu bilhões de dólares do Google.

O Departamento da Justiça pode exigir o fim do acordo de exclusividade, ela disse, permitindo que outras empresas ganhem acesso igual à posição de serviço de busca padrão do iPhone.

A Apple já sofreu tropeços ao tentar criar alternativas ao Google, no passado. Quando ela lançou o Apple Maps, em 2012, o serviço era tão propenso a erros que Scott Forstall, um dos principais assessores de Steve Jobs, o fundador da companhia, foi forçado a se demitir.

Mas a Apple é uma das poucas empresas a dispor dos recursos necessários a indexar a web a partir do zero. A maioria dos rivais de menor porte do Google licencia seus índices do Bing, serviço de buscas da Microsoft, entre os quais a DuckDuckGo, uma empresa de buscas que privilegia a proteção da privacidade e que a Apple já oferece como alternativa ao Google em seu navegador Safari, e a Neeva, uma startup do Vale do Silício fundada por dois antigos executivos do Google.

“A posição da Apple é muito única porque ela tem o iPhone e o iOS. Controla o navegador padrão”, disse Sridhar Ramaswamy, um dos fundadores da Neeva e antigo vice-presidente de publicidade do Google. A expansão no ramo de buscas “parece natural” para a Apple, ele disse, porque ela tem a capacidade de recolher dados e de aprender com o comportamento dos usuários em larga escala.

Mais de 20 anos depois que o Google foi fundado, criar um serviço de buscas hoje continua a ser “tecnicamente muito difícil, mas já não é tão difícil quanto no passado”, disse Coughran, que está entre os investidores que colocaram US$ 35 milhões na Neeva. Isso acontece em parte porque a infraestrutura de computação em nuvem ficou mais barata, e há ferramentas de fonte aberta disponíveis tanto para a Apple quanto para startups como a Neeva.

Mas a escala do problema é imensa. “Qualquer serviço de busca razoável precisa ter de 20 bilhões a 50 bilhões de páginas em seu índice ativo”, disse Ramaswamy. Quando um usuário digita uma busca, o sistema de classificação precisa vasculhar imensa quantidade de dados e classificar os retornos em milésimos de segundo.

Alguns observadores continuam a descartar a ideia de que a Apple criará um rival completo para as buscas do Google.

Dan Wang, professor associado de negócios na Escola de Administração de Empresas da Universidade Columbia, disse que seria “extremamente difícil” para a Apple recuperar o atraso.

“A vantagem do Google vem da escala”, ele disse, porque o feedback ininterrupto dos usuários ajuda na sintonia fina dos retornos e identifica áreas que necessitam de melhora. “O Google recebe centenas de milhões de pedidos de busca por minuto, de usuários do mundo todo. Essa é uma imensa vantagem no que tange aos dados”.

Tradução de Paulo Migliacci

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