Descrição de chapéu Saiu no NP

1998: 'Disneylândia brasileira' em Ferraz de Vasconcelos tem Mickey e Minnie de verdade

Ratos e ratazanas aterrorizam moradores em bairro onde ruas têm nomes de personagens da Disney

Luiz Carlos Ferreira
São Paulo

“No mundo encantado dos desenhos animados, o simpático ratinho Mickey faz a alegria das crianças. Já na ‘Disneylândia brasileira’, enormes ratazanas invadem casas e apavoram até adultos.”

Foi o que mostrou a reportagem de Mariana Weber, publicada no Notícias Populares em 2 de agosto de 1998.

Com a manchete “Disney de SP tem rato de verdade”, o jornal informou sobre a omissão do poder público com o “mundo encantado” do Parque Dourado, bairro periférico de Ferraz de Vasconcelos (Grande São Paulo).

Na região, sete ruas e uma praça foram batizadas com nomes de personagens dos estúdios Disney, do cartunista, produtor e empresário americano Walt Disney (1901-1966).

Apenas uma rua destoa do grupo, a David de Rogatis, que fica entre a Banzé e a Tio Patinhas. O nome dela é uma honraria ao pai de um vereador. A via, onde atualmente funciona uma delegacia, se chamaria Irmãos Metralhas, mas o nome não agradou a um dos delegados da região na época.

A ideia de homenagear os personagens da Disney ocorreu em 1973, por iniciativa do então prefeito Makoto Iguchi, que era fã incondicional dos desenhos. O ex-prefeito, que morreu nesta quarta-feira (15), esteve à frente da cidade em dois mandatos: de 1973 a 1976 e de 1982 a 1988.

Manchete do Notícias Populares publicada em 2 de agosto de 1998
Manchete do Notícias Populares publicada em 2 de agosto de 1998 - Folhapress

Na rua Mickey, que faz esquina com a Minie (grafada assim mesmo, com apenas um “ene”), um terreno vazio era usado como depósito de lixo por parte dos moradores, o que contribuiu para o aumento de roedores no bairro, já marcado pela sujeira nas calçadas.

Na ocasião, os moradores contaram que não aguentavam mais deparar com tantos ratos e ratazanas transitando "tranquilamente" pelas ruas esburacados e pelas residências. “Acho os nomes engraçados, mas aqui tem rato demais”, afirmou a aposentada Osmirinda dos Santos Zanella, 54, moradora da rua Mickey.

Segundo Osmirinha, a ousadia dos roedores era tanta que ela era obrigada a se “armar” todos os dias, espalhando veneno com comida por toda a casa como isca.

O vizinho da aposentada, Cavalini, 51, contou que tinha matado mais de 30 roedores em menos de três meses. “Rato eu não perdoo. Teve um dia em que eu armei uma ratoeirinha e em 5 minutos consegui pegar um”, garantiu o morador.

Na rua Minie, a situação também não era das melhores, afirmou Benedita da Silva, também de 51 anos. “Às vezes eu ouço barulho de rato embaixo da pia”, disse a moradora, que contou ainda gostar de andar pelas ruas do bairro, apesar dos vizinhos roedores. “Ninguém entende quando eu falo meu endereço. Aí eu explico que é a namorada do Mickey”, disse.

No bairro, o personagem Gastão, representado no desenho como o primo sortudo do Pato Donald, não é só o nome de uma das vias do bairro, mas também o apelido do barbeiro Manoel Gomes do Santos, 51, que ganhou o epíteto há mais de 20 anos, desde quando começou a morar naquela rua.

O local de trabalho de Manoel não podia ter outro nome. A “Barbearia do Gastão” já era uma velha conhecida dos moradores. No entanto as semelhanças entre o barbeiro e o sobrinho do Tio Patinhas eram poucas. “Na verdade eu sou ‘gastudo’, gasto tudo o que posso. Mas eu também sou sortudo: tive 11 filhos", contou o barbeiro.

Na rua Tio Patinhas, batizada com o nome do personagem milionário da Disney, os moradores estavam “longe de poder nadar na grana”, informou o NP. “Morar por aqui não me trouxe mais dinheiro”, afirmou Aparecida de Jesus Guedes, 39.

Mãe de sete filhos e viúva havia dez anos, o terreno da faxineira era dividido com casas de vários parentes.

Moradora do bairro desde 1978, Aparecida já não acreditava que o nome do personagem poderia trazer sorte. Mas ela ainda sonhava com uma virada. “Se eu tivesse o dinheiro do Tio Patinhas, eu só ia querer mergulhar nas moedas. Mas, por enquanto, a gente vai ficando no seco mesmo”, disse.​

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.