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29/11/2011 - 13h27

Mesmo em crise, Reino Unido evita "peso" do euro sobre confiança

ROGERIO WASSERMANN
DA BBC BRASIL, EM LONDRES

A economia britânica anda mal das pernas --desemprego em alta, ameaça de recessão com inflação, deficit público entre os mais altos da União Europeia e uma dívida pública em nível recorde e crescente.

Nesta terça-feira, o governo anunciaria um pacote para cortes de gastos públicos após reconhecer que o crescimento econômico deve ficar abaixo do previsto neste ano, e o déficit público, mais alto.

No entanto, o país tem se mantido fora do radar dos mercados financeiros para países cuja capacidade de pagar suas dívidas vem sendo colocada em xeque --um grupo que começou com Portugal, Irlanda e Grécia, avançou para Espanha e Itália e já ameaça envolver todos os 17 países da zona do euro.

Na manhã esta terça-feira, os juros dos títulos da dívida britânica negociados no mercado secundário apresentavam uma leve alta, para 2,23%, marginalmente mais baixos que os juros de títulos equivalentes da Alemanha (2,26%), tradicionalmente considerados os mais seguros da Europa e tidos como referência para os demais.

O Reino Unido é a maior das dez economias da União Europeia que não adotam o euro como moeda. Para analistas ouvidos pela BBC Brasil, isso tem ajudado esses países, que têm conseguido evitar os piores efeitos da crise.

"Creio que o Reino Unido estaria numa situação muito pior se não tivesse uma política monetária e cambial independente, o que seria o caso se tivesse aderido ao euro", observa o economista americano Mark Weisbrot, co-diretor do Center for Economic and Policy Research, de Washington.

Jennifer McKeown, economista-sênior para Europa da consultoria Capital Economics, de Londres, concorda. "O Reino Unido não está imune ao que ocorre no restante da Europa, mas certamente estaria em uma situação mais difícil se estivesse na zona do euro", diz.

"Se compararmos o país com a França, que não tem uma situação tão diferente em termos de indicadores econômicos, a Grã-Bretanha está melhor", observa.

ILHA DE PROSPERIDADE

Outros países da UE que não adotaram o euro também vêm se beneficiando disso e têm passado até aqui quase incólumes na onda de perda de confiança entre os investidores.

A Suécia, que como o Reino Unido e a Dinamarca faz parte do grupo no bloco que optou por manter sua própria moeda, é vista como uma "ilha de prosperidade" na região, como um dos poucos países do bloco a registrar superavit público e com uma perspectiva de crescimento de 4% neste ano.

A Polônia é outro país que mantém uma perspectiva de forte crescimento econômico, em contraste com as previsões de uma nova recessão em vários países do bloco. A Polônia é o maior país do grupo de nações do Leste Europeu que se juntaram mais recentemente à UE e estão em processo de cumprimento das condições para se juntar à zona do euro.

Apesar de fortes cortes de gastos para reduzir o deficit público, dos 7,6% do PIB registrados em 2010 para estimados 5,5% do PIB em 2011, a economia polonesa deve crescer cerca de 4% neste ano, de acordo com a última estimativa do relatório Perspectivas da Economia Europeia, divulgado no dia 10 de novembro pela Comissão Europeia.

"Assim como o Reino Unido, esses países certamente têm uma maior flexibilidade em políticas monetárias do que os países da zona do euro individualmente", observa Neil Prothero, analista para Europa Ocidental da Economist Intelligence Unit, o braço de pesquisas da revista britânica The Economist.

DÉFICIT ALTO

A proporção da dívida pública da Grã-Bretanha em relação ao PIB é a 8ª maior entre os 27 países da zona do euro, e o governo britânico é também o 8º que mais gasta com o pagamento de juros de sua dívida, mas tem um deficit público de 8,8% do PIB, inferior apenas ao da combalida Grécia.

Ainda assim, o país vê os juros para o financiamento de sua dívida permanecerem estáveis, enquanto os juros dos títulos das dívidas dos países da zona do euro atingem níveis recorde.

O Reino Unido tem uma dívida equivalente a 84% do PIB e gasta 3,1% de suas riquezas anuais com o serviço dessa dívida, segundo estimativa do Conselho Europeu. Como termo de comparação, a Espanha tem uma dívida estimada em 69,6% do PIB e gasta 2,2% com o pagamento de juros.

No entanto, os juros para os títulos da dívida britânica de referência, com prazo de dez anos, vêm se mantendo estáveis, pouco acima da casa dos 2%, enquanto os títulos da dívida espanhola chegaram a ultrapassar os 7% na última semana.

Mesmo a França, cuja dívida é praticamente do mesmo tamanho que a britânica - 85,4% do PIB -, mas gasta menos com juros (2,6% do PIB), vê seus juros em elevação, chegando à casa dos 3,7% na última semana.

"A principal razão pela qual o governo espanhol, por exemplo, está pagando mais de três vezes mais para tomar empréstimos que o governo britânico é que os governos endividados são muito mais vulneráveis dentro de uma união monetária do que fora, porque eles emitem dívida efetivamente em uma moeda estrangeira sobre a qual eles têm pouco ou nenhum controle. Os investidores compreensivelmente temem que tais governos sejam obrigados a dar o calote", explica Prothero.

Para ele, o país "está numa posição diferente". "Tendo mantido sua própria moeda e com um banco central com a capacidade de imprimir essa moeda, a possibilidade de o país dar calote algum dia é muito remota", diz.

Mark Weisbrot vê também um impacto negativo das políticas de corte de gastos preconizadas pelo Banco Central Europeu (BCE) para os países em crise como um fator para seu agravamento.

"Os mercados não veem um grande risco de calote na Grã-Bretanha porque realmente não há muito risco, e esse também seria o caso da Espanha se não fosse o fato de que as autoridades europeias, incluindo o BCE, estão forçando as economias mais fracas ao calote ao as encolherem e as forçando a adotar medidas de austeridade que pioram o problema da dívida", observa.

DECISÃO ACERTADA

A atual crise das dívidas na zona do euro pode comprovar que a decisão britânica (e também sueca e dinamarquesa) de não adotar a moeda única europeia foi acertada, na avaliação de Jennifer McKeown, da Capital Economics.

Ainda assim, ela destaca que um eventual colapso do euro poderá ter um impacto negativo em todo o mundo e que a Grã-Bretanha, pelos seus laços comerciais e forte relação no setor financeiro com os demais países da UE, deverá sofrer ainda mais.

Prothero, da EIU, destaca 40% das exportações britânicas vão para os países da zona do euro, o que trará um impacto forte à economia do país. Além disso, ele diz, "uma decomposição da zona do euro quase certamente precipitará uma nova crise bancária na Grã-Bretanha".

Segundo ele, nesse possível cenário, "as autoridades (britânicas) terão poucas opções de políticas disponíveis para combater seus efeitos", já que as taxas de juros já vêm sendo mantidas em seu menor nível histórico (0,5%) desde março de 2009 e a situação fiscal do governo é frágil demais para promover um novo resgate substancial dos bancos, como na crise de 2008.

Para Prothero, o Reino Unido deve enfrentar "enormes desafios econômicos e financeiros nos próximos anos, com um período prolongado de desemprego alto e padrão de vida em queda". "Dito isso, poucos discordariam de que a Grã-Bretanha estaria em uma situação ainda pior se tivesse adotado o euro", afirma.

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