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Como medir a trajetória econômica brasileira?

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Thales Zamberlan Pereira

O atraso econômico do Brasil possui múltiplas causas. Uma delas, em destaque nos últimos anos, é a baixa escolaridade dos brasileiros. No entanto, a teoria do capital humano, que estabelece a relação entre educação e crescimento econômico, também contempla a saúde da população. Além dos efeitos sobre a qualidade de vida, pessoas saudáveis também são mais produtivas.

As nações mais prósperas não só educaram sua população antes que as demais, mas também a tornaram mais saudável. Inicialmente, a melhora veio com investimentos em saneamento, como rede de esgotos e tratamento de água. Historicamente, doenças transmitidas pela água sempre estiveram entre as principais causas de mortalidade. Morte por diarreia, por exemplo, era e continua a ser uma das principais causas de mortalidade infantil.

O indiano Amartya Sen, prêmio Nobel de Economia, durante palestra em São Paulo; ele estudou a relação entre mortalidade e desenvolvimento econômico
O Nobel Amartya Sen estudou a relação entre mortalidade e desenvolvimento econômico - Marlene Bergamo - 29.abr.22/Folhapress

A compreensão sobre e os benefícios de investir em saneamento aumentou com o desenvolvimento da teoria microbiana das doenças, no final do século 19. Antes disso, o médico John Snow ganhou notoriedade internacional quando descobriu a relação entre água contaminada e cólera na década de 1850. A população global, portanto, se beneficiou imensamente desses conhecimentos durante o século 20. Uma das principais causas de morte no Brasil, a tuberculose, praticamente desapareceu das estatísticas após a campanha internacional de vacinação na década de 1970.

Apesar desse impacto, o investimento em saneamento não possui destaque nos livros-texto de história econômica do Brasil. Tradicionalmente, o foco dos debates econômicos para o século 20 envolve temas como câmbio e juros. Algo compreensível, aliás, em um país com um histórico de inflação sem controle e problemas fiscais crônicos. Mas essas variáveis não explicam desenvolvimento de longo prazo, elas apenas nos lembram como o curto prazo define o nosso passado.

Poucos países do mundo possuem livros de história econômica que são povoados por temas como as instruções da Sumoc —​Superintendência da Moeda e do Crédito, antecessora do Banco Central do Brasil. A presença constante daquilo de deveria ser efêmero, portanto, evidencia a baixa prioridade de debater e propor políticas que vão além dos ciclos políticos. O debate sobre industrialização talvez seja o mais próximo que temos de uma análise histórica de mais longo prazo, mas esse debate não apresenta respostas sobre como o bem-estar dos brasileiros mudou ao longo do tempo.

A primeira dificuldade em utilizar informações que vão além das variáveis macroeconômicas tradicionais é a disponibilidade de dados. Dados históricos de investimento público são fragmentados e normalmente estão disponíveis para regiões, como o Sudeste, onde as melhorias ocorreram antes e em maior escala. Não vemos, portanto, o efeito da ausência do investimento em saneamento.

Além disso, é importante analisar o Brasil em um contexto internacional, ou seja, será que realmente tínhamos um investimento mais baixo que nossos pares, com renda semelhante à nossa? Uma resposta para essas questões se encontra no gráfico abaixo, que usa dados de mortalidade infantil para o Brasil e outros países das Américas e Europa em 1940.

O gráfico apresenta uma dimensão do nosso atraso. O Brasil tinha a maior mortalidade infantil entre os 28 países em 1940. Mesmo levando em conta a diferença no nível de renda, a mortalidade infantil brasileira era acima da média. Nossas taxas de mortalidade infantil se equipararam às da Venezuela, em 1940, apenas três décadas depois. Essa métrica sugere que, em um país tão desigual, o crescimento do PIB per capita não é uma medida suficiente para entender a nossa trajetória. Além disso, esses dados escondem uma realidade ainda mais preocupante.

Estimativas sugerem que, durante esse período, a mortalidade infantil para a população negra era cinco vezes maior que para a população branca. Compreender o nosso país hoje requer uma visão mais ampla sobre como chegamos até aqui.

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