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Canoa centenária deixa fundo do São Francisco em Alagoas

Restauração da peça tombada, agora, provoca embate entre Iphan e ONG

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Maceió

Do fundo do rio São Francisco, em Alagoas, marinheiros e pesquisadores resgataram um pedaço da história do Brasil do início do século 20.

A canoa de tolda Luzitânia, que data dos anos 1920, foi retirada do fundo do rio São Francisco para passar por processo de restauro. Quando recuperada, pode ser o indicativo da última embarcação desse tipo apta a navegar no país.

canoa colorida de madeira escrita Luzitânia no rio, com outro barco ao fundo
Canoa de tolda Luzitânia, que deve datar dos anos 1920, é resgatada do fundo do rio São Francisco, na divisa entre Alagoas e Sergipe - Iphan-AL/Marinha do Brasil

O processo de remoção da canoa centenária do fundo do rio, ocorrido em março, enfrenta agora uma discussão jurídica, entre o Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) e a ONG Canoa de Tolda. Por conta do impasse, a restauração da Luzitânia está sem previsão.

Embarcação com capacidade de 200 sacos (cada saco equivale a 60kg), a Luzitânia foi tombada pelo Iphan em 2010, em um processo que durou cerca de dez anos. Ela foi registrada na Agência Fluvial da Capitania dos Portos de Alagoas, em Penedo, somente na década de 1970, mas os registros orais remontam os anos 1920.

A Luzitânia e canoas desse tipo tem uma tolda, espécie de pequeno abrigo na popa. Esta é feita de madeira. Essa solução é bastante usual em barcos orientais.

Ela foi comprada pela ONG Canoa de Tolda em 1999, com o objetivo de restaurá-la para que voltasse a ser utilizada para estudos e historicidade na região do São Francisco.

De acordo com o relato da época, estava quase totalmente desmantelada, mas com condições de navegar, e foram feitos esforços para restaurá-la.

barco de madeira Luzitania em rio
Processo para trazer à tona embarcação centenária ocorreu em março - Iphan-AL/Marinha do Brasil

Em decorrência do aumento das vazões da Usina Hidrelétrica de Xingó, a canoa de tolda ficou submersa na divisa entre Sergipe (município de Brejo Grande) e Alagoas (município de Pão de Açúcar), no dia 24 de janeiro deste ano. Antes, ela estava fora da água por falta de recursos para sua manutenção.

Ex-diretor do Depam (Departamento de Patrimônio Material e Fiscalização), do Iphan, Dalmo Vieira participou do processo de tombamento da Luzitânia e hoje é uma das pessoas que luta para que ela seja restaurada e volte a navegar, já que é a última com essa capacidade.

"A Luzitânia é parte do patrimônio cultural e precisa ser reconhecido como tal. Acredito que ela seja a última com capacidade de navegar, porque temos outras duas, menores do que ela, em museus", diz Vieira.

Para o ex-diretor, a peça tem muita qualidade e representatividade na história local e do país. "Caso não seja restaurada, considero que teremos extinguido um objeto de suma importância para a história do Brasil. A Luzitânia é uma embaixadora e temos que pensar nela para além do restauro. Ela deve ser reinserida na dinâmica do rio São Francisco".

A ONG de mesmo nome solicitou, via ação judicial, que o Iphan se tornasse obrigado a transladar a embarcação a um lugar seguro.

Após sucessivas medidas na justiça, a Luzitânia foi retirada da água no dia 16 de março. Ela está em uma marina no município de Traipu, de acordo com relatório do Iphan.

"O problema é que já são semanas que nós não temos notícias das condições em que a canoa está armazenada", diz o presidente da ONG, Carlos Eduardo.

A reestruturação da embarcação não está garantida em juízo. Na petição inicial, a ONG argumentou que havia solicitado ajuda ao Iphan em setembro, quando se sabia do aumento da vazão do Xingó.

O órgão, porém, diz que caberia à ONG, proprietária e protetora primária do bem, ter garantido o translado da embarcação em segurança.

O Iphan informou que a Chesf (Companhia Hidrelétrica do São Francisco) também deveria ter tido parte nas ações de resgate, mas que sua total falta de resposta "expunha sua completa indiferença ao fato ocorrido e que afetou negativamente o patrimônio histórico, apesar de sua singular relevância". Ao órgão, conforme preconizou a Justiça, cabe armazenar a Luzitânia em segurança por três meses.

De acordo com os advogados que representam a ONG, será feita uma nova ação para que o Iphan explique as condições em que está a canoa, sua localização exata e fotos que comprovem as informações.

O órgão enviou três fotos à reportagem, com créditos para a marina em que a embarcação está armazenada.

De acordo com o Ipahn, foram procuradas diversas marinas em Alagoas e a escolha se deu pela JM Marina, em Traipu, em Alagoas, porque ela tinha condições de abrigar uma canoa com essa dimensão (15,3 metros). Acrescenta, ainda, que a empresa está regularizada e tem toda a documentação comprobatória para a guarda.

Ainda segundo o Iphan, a Luzitânia está em local seguro e que o órgão está em fase de aprovação de recursos para o restauro.

"A responsabilidade por sua conservação, uso e gestão continua sendo do proprietário, que, nesse caso, é a Sociedade Socioambiental do Baixo São Francisco – Canoa de Tolda. Isso vale para qualquer bem tombado, seja de uso público ou privado".

​Ainda segundo o Ihpan, a judicialização do processo se deu por parte do proprietário, e que o órgão está realizando todos os trâmites determinados pelo poder judiciário.

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