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O que pensam os jovens cientistas no Brasil?

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Descrição de chapéu universidade tecnologia

Os próximos simuladores quânticos

Tommaso Macrì representa o país em uma das áreas mais promissoras da física

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Pedro Lira

Quando Tommaso Macrì chegou à Espanha, aos 23 anos, sua vida mudou. Nascido em 1984, em Pádua, no norte da Itália, o pesquisador nunca tinha cogitado morar fora de sua cidade natal, onde se graduou em física e ingressou no mestrado. A oportunidade de estudar na Universidade Autônoma de Madri veio no semestre final do mestrado. Depois de seis meses conhecendo estudantes de diferentes culturas, sentia-se "outra pessoa": "Sem esse intercâmbio eu não teria criado coragem para tomar decisões mais arriscadas", conta. Hoje, o risco faz parte do cotidiano do físico, cuja área de pesquisa quase ninguém no mundo investiga: a simulação quântica.

De lá para cá foram muitas escolhas ousadas. Com quatro países na bagagem e uma linha de pesquisa na fronteira do conhecimento da física quântica - teoria fundamental que obtém sucesso no estudo dos sistemas cujas dimensões são próximas ou abaixo da escala atômica - Macrì, no Brasil desde 2015 como professor da UFRN, pode contribuir para o desenvolvimento da próxima geração de processadores quânticos.

Arte ilustra uma mão segurando um objeto redondo vermelho; no segundo plano, um mapa mostra parcialmente a região nordeste do Brasil, com um ponto vermelho no Rio Grande do Norte.
Ilustração: Maria Palmeiro - Instituto Serrapilheira

Sua jornada começou cedo. Ainda na infância, a aptidão para os números já sinalizava um futuro como cientista. Aos quinze anos o jovem optou pela física. "Na Itália, tive o privilégio de contar com uma educação pública de qualidade que me deu uma formação muito completa", disse. "É preciso fornecer às crianças as ferramentas básicas para que elas conheçam diferentes carreiras."

Não foi de imediato que ele ingressou no universo quântico. Até ir para Madri finalizar o mestrado, Macrì estudava a física de altas energias, uma área que investiga as forças fundamentais da natureza. "Mas no último semestre percebi que queria experimentar outros caminhos", lembra. "Então, apostei na física estatística para o doutorado, e, mais tarde, na tecnologia quântica."

Terminado o intercâmbio em Madri ele voltou para a Itália, mas dessa vez se fixou em Trieste, onde fez o doutorado na Escola Superior Internacional de Estudos Avançados. Foram quatro anos "num dos ambientes com maior fluxo de pessoas e ideias" em que já esteve.

Foto mostra o físico Tommaso Macrì, um homem branco, de cabelos escuros curtos, que sorri e veste uma camisa azul claro
O físico da UFRN Tommaso Macrì - El Tigre Studio/ Instituto Serrapilheira

O destino seguinte foi a Alemanha. Em 2011, recebeu uma proposta para um pós-doc no Instituto Max Planck para Sistemas Complexos, em Dresden. Lá consolidou-se sua paixão pela tecnologia quântica, área em que o pesquisador atua até hoje. "Foi uma experiência excelente, os cientistas estão em toda parte, nos bares e nas ruas."

Ainda explorando diferentes linhas na mecânica quântica, ingressou em um segundo pós-doc, dividido entre Florença e Munique. Macrì viveu o "privilégio", ele diz, de trabalhar no instituto Quantum Science and Technology, em Arcetri, onde lecionou ninguém menos que Galileu Galilei.

A vinda ao Brasil se tornou oficial após três visitas para congressos e parcerias científicas com a Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Em uma dessas conheceu sua atual mulher, uma produtora de eventos brasileira por quem se apaixonou. O concurso para o departamento de física da universidade foi apenas a consolidação dos planos.

Na universidade potiguar, seu grupo investiga algo que pode soar incompreensível para quase todo mundo - a simulação quântica para aplicações em tecnologia quântica, em especial os sistemas com interação de longo alcance, nos quais partículas interagem mesmo distantes umas das outras. "Esse é um campo de pesquisa que abrange várias áreas da física: atômica, molecular, óptica, da matéria condensada, nuclear, gravitacional e de alta energia", explica. Macrì é um dos poucos representantes do Brasil que produzem conhecimento nessa área.

Suas simulações já demonstram grande potencial para aplicações. Avanços na área podem ser úteis em redes de comunicação quântica, giroscópios, relógios atômicos, sensores e os tão esperados computadores quânticos. "A maior parte do meu tempo é na física fundamental, mas sempre de olho em possíveis aplicações", conta.

A tecnologia quântica tem avançado nos últimos anos em todo o mundo. O campo, descrito em 1997 pelo australiano Gerard J. Milburn, pode ser dividido em quatro grandes áreas: a da informação, que investiga a criptografia quântica; a da computação, que busca criar os computadores quânticos; a dos sensores, que promete fazer medições precisas de frequências, campos magnéticos e até do tempo; e, por último, a área da simulação quântica, a favorita de Macrì, linha que se dedica a entender a matéria de forma mais elementar. "Como dizia o grande Richard Feynman, ‘a natureza não é clássica, e se você quiser fazer uma simulação, é melhor fazer mecânica quântica. É um problema maravilhoso, porque não parece tão fácil’."

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Pedro Lira é jornalista e social media no Instituto Serrapilheira.

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