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Como a matemática pode predizer o futuro

Entre Berlim e Salvador, Dirk Erhard se dedica a facilitar previsões

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Murilo Bomfim

A quem pertence o futuro? Para a ciência, à matemática — ela nos oferece algumas formas de predição, sobretudo por meio das probabilidades. Um exemplo clássico é o jogo de cara ou coroa: ao lançar uma moeda para o alto cem vezes, espera-se que, em metade das ocasiões, ela caia com o lado cara para cima (e, na outra metade, o lado coroa, é claro).

Sabe-se, no entanto, que essa previsão não é muito precisa. Se de fato se lançasse a moeda uma centena de vezes, talvez o lado cara aparecesse em 46 das ocasiões. Ou em 58. Essa variação também não escapa à matemática: é analisada pela chamada distribuição normal. O conceito é bem ilustrado por um gráfico — a curva de Gauss — que mostra, nesse exemplo, as oscilações mais prováveis da moeda (por exemplo, quarenta caras e sessenta coroas) e as mais improváveis (como oitenta caras e vinte coroas).

Arte ilustra uma pessoa pulando de um trampolim em uma piscina; sua imagem se repete em diversas posições de salto, formando uma linha que remete à geometria/ às curvas de Gauss.
Ilustração: Julia Jabur - Instituto Serrapilheira

Mas prever a face aparente da moeda não é tão difícil, afinal as opções são apenas duas. Como antever o comportamento de sistemas mais complexos, que dependem de muitas variáveis, como o organismo humano ou uma colônia de bactérias? Essa é a pergunta que orienta a pesquisa do matemático Dirk Erhard.

Apaixonado por probabilidade, o próprio Erhard foge à curva de Gauss: são raros os matemáticos medalhistas em salto de trampolim. Nascido e criado em Berlim, aos sete anos ele foi descoberto por um caça-talentos de ginástica olímpica. Depois de quase uma década de treinamentos intensos, o jovem percebeu que o sonho de ser campeão mundial em trampolim seria eternamente um sonho. "Eu não era ruim, mas sabia que não era bom o suficiente para chegar ao topo", lembra o alemão. Entre os onze e os dezessete anos, ele chegou a ser pentacampeão da modalidade na Alemanha — ele diz, porém, que a categoria juvenil não revela muito sobre o potencial do atleta.

Com baixas chances de se tornar um ginasta de sucesso, ele apostou suas fichas na matemática. Erhard é tão improvável que, nos primeiros anos de graduação, não gostava de probabilidade. À época, tinha afinidade mesmo com análise funcional — disciplina que trata do estudo das funções. Em um intercâmbio em Paris, o rapaz deu sorte: teve aulas com um ótimo professor, que explicava, justamente, as intersecções entre a análise funcional e a probabilidade. "Foi a melhor disciplina que tive na vida, ensinada de uma maneira fácil de entender", lembra o matemático, que optou por seguir carreira acadêmica na área.

Entre mestrado, doutorado e programas de pós-doutorado, Erhard passou pela Alemanha, França, Holanda e Inglaterra, até finalmente chegar ao atual trabalho de professor na Universidade Federal da Bahia — a ideia era ficar mais perto da família da esposa baiana, por quem se apaixonou nas andanças europeias. Mesmo morando em vários países, o matemático se dedicou a uma mesma investigação: tornar predições mais simples, principalmente de sistemas complexos. Em vez de analisar lançamentos de moeda, Erhard se concentra em sistemas com diversas partículas que interagem entre si e apresentam comportamentos diferentes em pontos distintos do tempo e do espaço.

A pesquisa ainda tem caráter teórico, mas mostra seu potencial quando aplicada a situações práticas, ainda que hipotéticas. Um exemplo seria um lago amplo e profundo, onde peixes se reproduzem e, para isso, precisam de uma temperatura ideal. Em cada ponto do lago, a temperatura vai ser um pouco diferente, influenciada por variáveis como profundidade, incidência do sol, presença de cardumes. Erhard trabalha na criação de um modelo matemático que facilite a previsão da temperatura nas diferentes regiões do lago.

Enquanto o alemão investiga o movimento de partículas, ao menos uma possibilidade mais concreta de aplicação de seus estudos já esteve em pauta. "Há alguns meses, tive uma conversa com um grupo de físicos que buscam entender mais sobre o cérebro humano", conta Erhard. Se será possível prever comportamentos do cérebro, ainda não se sabe — mas, se depender do matemático, a probabilidade é grande.

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Murilo Bomfim é jornalista.

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