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Mudanças climáticas vão criar novos ecossistemas

Como redesenhar estratégias de conservação de biodiversidade em meio à crise do clima

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Danilo Neves

Não é possível, hoje, bater o martelo a respeito da evolução das tendências climáticas — exatamente como e onde vão ocorrer, e em que grau de intensidade —, mas modelos científicos já predizem que os biomas ao redor do mundo sofrerão grandes alterações na composição de suas espécies. Ou seja: haverá novos ecossistemas, mas ainda existem incertezas sobre quais vão permanecer, e em que lugar do planeta. Por isso os dados de que dispomos são de difícil implementação em políticas públicas de preservação e uso da terra. De qualquer modo, é urgente que se enfrentem os desafios com as armas que temos à mão.

E por que as mudanças climáticas põem em risco as espécies? Porque as condições do clima nas regiões onde elas vivem se tornam inadequadas à sua sobrevivência. Assim, sua subsistência pode depender de elas serem bem-sucedidas em alcançar regiões favoráveis, mas esse processo pode ser interrompido por paisagens que dificultam sua dispersão, como terras agrícolas e cidades. Dado esse contexto, uma das melhores e menos exploradas opções para evitar as extinções decorrentes de mudanças climáticas seria estabelecer uma rede sólida de reservas biológicas e parques nacionais, dentre outros.

Are ilustra um urso carregando uma mochila, uma árvore com uma bolsa, uma ave e um roedor caminhando juntos, como se estivessem migrando.
Ilustração: Valentina Fraiz - Instituto Serrapilheira

Historicamente, as áreas protegidas são cruciais para a biodiversidade, e deveriam ser a principal estratégia de formadores de políticas ambientais e gestores de uso da terra. A Convenção sobre Diversidade Biológica, em vigor desde 1993 e hoje um dos mais relevantes fóruns do planeta para discutir questões do meio ambiente, apoia a proteção de áreas como uma ferramenta fundamental, tanto que reafirmou sua importância por meio de metas do Tratado de Aichi.

O problema é que em alguns casos o motivo de proteção e conservação de uma determinada área é sua beleza paisagística, e raras vezes elas são sistematicamente demarcadas em locais que poderiam facilitar o movimento de espécies ou a dispersão de seus diásporos (sementes, por exemplo), sobretudo daquelas consideradas altamente vulneráveis. Um exemplo no Brasil seria o Mosaico Sertão Veredas-Peruaçu, no norte de Minas Gerais. Englobando unidades de conservação públicas, reservas privadas e terras indígenas, o Mosaico funciona como um verdadeiro corredor de vida silvestre. No entanto, praticamente nenhum sistema nacional de áreas protegidas foi projetado para funcionar como corredores que facilitariam a dispersão de plantas como consequência de alterações climáticas.

Se as espécies precisam chegar a novas regiões conforme o clima muda, a atual rede de áreas protegidas serão esforços de preservação efetivos? A resposta, talvez uma das mais cruciais aos gestores preocupados com os ecossistemas naturais, urbanos e agrícolas, exige o uso de dados massivos (big data), supercomputadores e abordagens de ciências sociais que considerem a implementação dos modelos de mudanças climáticas e seu contexto de aplicação. Afinal, decisões sobre prioridades de subsistência são tomadas em ambientes do mundo real, onde a biodiversidade e seus movimentos são apenas um dos conjuntos de preocupações.

É possível que existam milhões de pessoas em terras que seriam de interesse para políticas de preservação. Como promover a autonomia e a autodeterminação das pessoas que chamam essas terras de sua casa? Como integrá-las aos esforços para mitigar os impactos das modificações climáticas?

Projetos para o futuro devem integrar o uso de dados massivos de biodiversidade e cenários de mudanças climáticas com a participação das partes interessadas e insights de ciências sociais já no processo de concepção. Essa abordagem multifacetada é do interesse de todos, pois tem o potencial de otimizar o cumprimento de metas relacionadas ao bem-estar humano no curto e longo prazo. Mas, considerando a enorme lacuna que ainda existe entre ecologia, ciências sociais e governança ambiental, será que chegaremos lá a tempo de minimizar os impactos das alterações do clima?

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Danilo Neves é ecólogo e professor da Universidade Federal de Minas Gerais.

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