De 1994 a 2014 as eleições presidenciais foram polarizadas entre PSDB e PT. Essa polarização era político-eleitoral e não político-ideológica. Estritamente, nem PSDB era direita, nem PT era esquerda.
O PSDB estava situado entre centro e centro-esquerda. Fernando Henrique Cardoso e Mário Covas, dois de seus expoentes, foram dos mais atuantes líderes na Constituinte, para que tivéssemos a atual Constituição de inspiração social-democrata.
O PT, versão da social-democracia assentada nos sindicatos, portanto de centro-esquerda, não fez governos fundamentalmente diferentes do PSDB. Sem tantas restrições orçamentárias da conjuntura do início do Plano Real, os governos petistas puderam ampliar iniciativas tucanas, como o Bolsa Escola e o Fundef, além de fortalecer o SUS, implantado a partir de Itamar Franco, então do MBD e de perfil de centro-esquerda. No plano da economia, mantiveram o chamado tripé macroeconômico dos tucanos, com câmbio flutuante, metas de superávit primário e de inflação, só burlado no governo de Dilma, principalmente por motivação eleitoral. Os governos petistas também não reverteram privatizações e nem o fim do monopólio da Petrobras, reivindicações da esquerda, então pouco representativa no Congresso Nacional.
Enquanto o PSDB defendia o estado regulador, o PT propunha o estado indutor da economia, mas não estatizou empresas. Ao invés, favoreceu várias empresas privadas na controvertida política de "campeões nacionais". Mesmo no pré-sal, com maior participação da Petrobras, o setor privado não foi excluído.
Mas nem PSDB nem PT promoveram a reforma tributária progressiva, essencial para financiar justiça e bem-estar social. A base de apoio dos governos de ambos no Congresso era majoritariamente conservadora. O sociólogo Luiz Werneck Vianna escreveu que o PT trocou a social-democracia pelo populismo getulista. Mesmo considerando essa análise, ela não retira o PT da centro-esquerda.
Tanto Marina Silva no PV, em 2010, quanto Eduardo Campos, do PSB, em 2014, foram críticos dessa polarização eleitoral, que consideravam negativa para o país. Propunham uma nova aliança em que fosse possível juntar PSDB e PT, além de outras agremiações políticas.
Desde 2018, temos uma outra polarização eleitoral. Em um polo, Jair Bolsonaro, próximo da extrema direita. No outro, o PT, na centro-esquerda, movendo-se ao centro. Porém o partido não detém o monopólio da centro-esquerda. Ciro Gomes, do PDT, corre por fora. E nem todo o centro fechou com Lula. Simone Tebet, da coligação MDB-PSDB-Cidadania-Podemos, tenta se colocar como alternativa.
Em um eventual segundo turno, é possível uma polarização que saia do campo meramente eleitoral em direção ao terreno ideológico: de um lado, forças políticas apegadas ao autoritarismo, de outro, aquelas que defendem o regime democrático. Mesmo tendo votado contra a atual Constituição e enfraquecido o sistema representativo com a compra de parlamentares – não uma exclusividade sua –, o PT está no campo democrático.
Entretanto, a polarização não se restringe à questão democrática. Os atuais manifestos pela democracia evidenciam um movimento importante na sociedade civil. Desde 2013, como em vários outros momentos, a sociedade brasileira deseja justiça social, serviços públicos de qualidade, responsabilidade ambiental, além de aperfeiçoamentos institucionais propícios a um poder público longe do velho patrimonialismo e da corrupção. A meu ver, é essa força da sociedade que poderá desencadear mudanças positivas no Brasil
Cláudio Hebdô
Um jornal de humor ao contrário: só não sai uma vez por semana
Polarização, democracia, manifestos e mudanças
Quer que eu desenhe? É que hoje o cartunista resolveu escrever sua análise política...
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