Na última sexta-feira, o fundo imobiliário Vinci Offices FII divulgou fato relevante, informando a aquisição de 100% da sede da Globo em São Paulo. Esta operação é emblemática para explicar várias dúvidas que recebo de leitores. Hoje vou avaliar a perspectiva da vendedora e, amanhã, comentarei a operação pela visão da compradora.
A Globo vai receber pela venda o total de R$ 522 milhões, o equivalente a R$ 13.369/m². Também assinou um contrato de aluguel atípico por 15 anos, no qual se compromete a pagar, mensalmente, R$84,67/m², corrigido anualmente pelo IPCA.
A diferença entre um contrato típico, utilizado para aluguéis residenciais e um contrato atípico é que o primeiro pode ser rompido com uma pequena multa. Já no caso do contrato atípico, a multa costuma ser o pagamento do aluguel até o fim do contrato, ou seja, pelo restante dos 15 anos.
Neste momento, surge sempre a dúvida: compensa para uma empresa se desfazer de seu imóvel próprio e pagar aluguel? Pagar aluguel não seria jogar dinheiro fora?
As pessoas físicas deveriam pensar mais como pessoas jurídicas nas decisões de investimentos. Um imóvel é um tipo de ativo financeiro. Assim, é preciso avaliar sobre esta perspectiva.
Por exemplo, imagine que você tem R$ 1 milhão em dinheiro e lhe seja oferecido duas alternativas de investimento, nomeadas de "A" e "B", de risco equivalentes e com retorno esperado de 12% e 15% ao ano, respectivamente. Em qual das duas alternativas você investiria?
Colocando dessa forma, a resposta parece óbvia. Todos escolheriam a alternativa "B" com retorno esperado de 15% ao ano.
No entanto, quando o assunto é imóvel, usualmente parece que a maioria das pessoas pensa diferente. Principalmente, se o imóvel é a própria residência ou a sede da empresa.
Agora imagine-se no lugar da empresa. Você tem R$ 522 milhões na mão e pode decidir entre investir em um imóvel ou em seu próprio negócio. Em qual dos dois você investiria?
Se a resposta for investir no imóvel, venda sua empresa e vá trabalhar no ramo de locação de imóveis.
A decisão da Globo demonstra que a empresa acredita que seu negócio deve gerar retorno maior que 7,6% ao ano corrigido pelo IPCA, pois é este retorno que o imóvel deve produzir ao preço que ela vendeu.
Em 15 anos, considerando que ela esteja certa, os R$ 522 milhões investidos hoje em seu negócio vão valer muito mais que o imóvel que ela ocupa.
Pagar aluguel não é jogar dinheiro fora, é você financiar a operação de seu negócio com o capital de terceiros. Explico a seguir.
Imagine que a Globo não tivesse esse imóvel, esta operação equivaleria a ela pegar R$ 522 milhões emprestados e pagando IPCA + 7,6% ao ano por 15 anos. A taxa de um título público de mesmo prazo está em IPCA + 5,1% ao ano. Ou seja, ela estaria pagando um prêmio de apenas 2,5% ao ano pelo risco de crédito.
Da próxima vez que você se sentir angustiado por morar de aluguel, entenda como alguém te "emprestando" dinheiro. O que você realmente deveria se preocupar é quão bem você está empregando este "empréstimo".
É importante entender que qualquer operação deve ser sempre avaliada à luz das informações, do cenário econômico e das taxas de juros e riscos do momento.
Em algum instante no futuro, com a dinâmica da economia, alguém pode até dizer que uma das partes foi beneficiada. Por exemplo, se o negócio de TV não tiver sucesso, o terreno teria sido algo mais valioso em se manter.
Entretanto, no atual momento em que a operação está sendo executada, parece que a Globo fez um bom negócio.
Michael Viriato é assessor de investimentos e sócio fundador da Casa do Investidor
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