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Luiza Pastor
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Ele quer ser o primeiro brasileiro no cume do Broad Peak

Moeses Fiamoncini está no Paquistão atrás de conquista inédita

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O leitor já ouviu falar do Broad Peak? A montanha paquistanesa, localmente conhecida como Faichan Kangri, fica na região de Karakoram, no Himalaia, e é a 12.ª mais alta do mundo, com 8.051 m de altitude. Por ficar próxima do mais famoso K2, com seus 8.511 metros, muitas vezes é ignorada por montanhistas que vão atrás de grifes para carimbar a carteirinha de escalador top das galáxias. Mas esse, certamente, não é o caso do paranaense de Rio Negro Moeses Fiamoncini, 42. No momento em que estas letrinhas estão sendo digitadas, ele está empenhado em ser o primeiro brasileiro a chegar a seu cume —e sem apoio de oxigênio, sabidamente rarefeito àquela altitude.

Moeses Fiamoncini, no alto do Kala Pattar, montanha de frente para o Everest, acompanhado de cão que o seguiu pelo caminho
Moeses Fiamoncini, no alto do Kala Patthar, montanha de frente para o Everest, a 5.500 metros de altitude, acompanhado de cão que o seguiu pelo caminho - Acervo pessoal

Moeses falou ao blog por meio de uma complicada operação que lhe exigiu um deslocamento de uma hora e meia para chegar ao sinal de internet mais próximo do ponto onde está acampado em meio aos fortes ventos do Himalaia . No dia em que trocamos informações, ele estava à espera da janela meteorológica, o momento ideal para o ataque ao cume, previsto para algum dia entre 17 e 22 de julho. Enquanto o tempo não colabora, ele vai subindo e descendo pelos flancos da montanha, aperfeiçoando a aclimatação e a paciência.

Mas por que o Broad Peak, afinal, e não o instagramável Everest ou o K2? Bom, para começar, essas duas ele já escalou, dentro do projeto que se propôs de subir todas as 14 montanhas do planeta acima de 8 mil metros, todas localizadas na cordilheira que permeia Nepal, Paquistão e China. Além delas, já carimbou o pico do Nanga Parbat (8.125 metros), também no Paquistão, e o Manaslu (8.163 metros), no Nepal. Mas pretende ainda este ano voltar a esta última.

"Gostaria de escalar novamente o Manaslu porque no ano passado um montanhista chegou ao cume com um drone e nas filmagens foi descoberto que todos os que haviam chegado até lá haviam alcançado o cume errado", conta Moeses, que vai cumprir a tabela, agora sim, no ponto máximo corretamente designado. Porque com montanhista raiz não tem propaganda enganosa, vocês sabem.

O montanhista Moeses Fiamoncini, a caminho do Broad Peak
O montanhista Moeses Fiamoncini, a caminho do Broad Peak - Acervo pessoal

Além do fato de o Broad Peak estar na lista das 14 mais altas, Moeses tem um motivo a mais para chegar lá. "Eu a escolhi porque um grande amigo, Sergi Mingote, alpinista espanhol que sofreu um acidente fatal em 2021, falava muito dela como um lugar especial, lindo. Então, estar aqui neste momento é como estar trilhando os passos que meu amigo trilhou", explica.

Como escalar esses colossos gelados não é exatamente um passeio no parque, Moeses também coleciona histórias de perrengues variados. Um dos mais assustadores, conta, foi em 2019, quando tentava escalar o Dhaulagiri (8.167 metros), no Nepal. "Faltando em torno de 60 metros para o cume, estava escalando uma parede, mas havia muita neve e decidi ir por uma parte com mais gelo. Acabei escorregando, despenquei 20 metros e só não morri porque havia muita neve fofa, que acabou me segurando". Com dores nas mãos e sem apoio de sherpas ou carregadores (sim, ele quer fazer isso sempre que possível sozinho, além de sem oxigênio), decidiu voltar ao acampamento. "Só que me perdi e passei uma noite inteira vagando pela montanha até encontrar minha barraca", lembra. "Só dois dias depois consegui chegar ao campo base, de onde fui resgatado e levado ao hospital".

Ele não chegou a sofrer fraturas, "apenas frosbite nos dedos das mãos e dos pés, mas nenhuma amputação", ressalta. Frosbite é o congelamento provocado pelo frio nas extremidades do corpo onde a circulação do sangue é menor, e que não raro levam montanhistas a perderem pedaços de dedos, nariz e orelhas.

Não tem mistério —mas também não é brincadeira

A quem pretende se dedicar ao montanhismo em sendas mais extremas, Moeses garante que "não há muito mistério, o ideal é começar devagar, com montanhas mais baixas, na casa dos 4 mil e 5 mil metros de altitude, e ir aumentando altitude e nível de dificuldade".

Se ele faz a coisa parecer tão simples, ressalta que é muito importante "ter bons mentores e guias de confiança, pessoas que tenham experiência com cada nível de montanha, para entender como cada região funciona e aprender a reconhecer a hora de parar, de voltar, de desistir de um cume". Mas, acima de tudo, ele considera essencial "ter determinação, preparo psicológico e humildade, a grande base de um verdadeiro montanhista".

Moeses, que é dono da agência Vertex Treks, que leva grupos a vários perfis de montanhas faz questão de ressalvar que, "embora as redes sociais acabem atraindo para as montanhas pessoas pouco preparadas física e psicologicamente (e isso é um problema para a pessoa e para seu grupo), montanhismo não é brincadeira".

"É claro que fatalidades acontecem", comenta. "Uma pessoa superexperiente pode sofrer um acidente, mas a vulnerabilidade é maior entre aventureiros inexperientes em busca de fotos bonitas, e há uma longa polêmica sobre se montanhas como as de mais de 8 mil metros devem ser lugares para pessoas só em busca de um feed bacana", acrescenta. Para ele, há 13 anos batendo pernas pelas montanhas, e guia de grupos com diferentes níveis de experiência, o mais importante é as pessoas estarem "em busca da verdadeira conexão com a natureza e com a expansão de si mesmo".

"Talvez você me questione se não dá para fazer as duas coisas", pondera, "e eu vou dizer que, sim, claro que dá. Só que não é o que estamos vendo nas montanhas nestes últimos tempos".

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