Frederico Vasconcelos

Interesse Público

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Descrição de chapéu Folhajus

Se persistirem os sintomas de corrupção, consulte o especialista

Procurador e juiz avaliam a importância das varas especializadas em lavagem

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"Se a pessoa tem um nódulo na tireoide, não vai a um clínico geral. Quer um especialista em cabeça e pescoço." (Vladimir Aras, procurador regional da República)

"Imagine que você tem um problema cardíaco e vai a um hospital. Você prefere ser atendido por um clínico geral ou por um cardiologista?" (Danilo Fontenelle, juiz federal)

Diante da decisão do Tribunal Regional Federal da 3ª Região de extinguir varas especializadas em julgar crimes financeiros e lavagem de dinheiro, o blog pediu ao procurador Vladimir Aras e ao juiz Danilo Fontenelle textos sobre a importância dessas varas.

As opiniões de ambos sobre preferências na medicina, a título de comparação, foram espontâneas. Uma mera coincidência.

Aras oferece exemplos de países que desenvolveram e mantêm boas práticas no Judiciário e no Ministério Público para o enfrentamento do crime organizado.

Como há impedimento para magistrados criticarem decisões judiciais, Fontenelle preferiu tratar da desejável experiência em cada área, sem comentar especificamente as mudanças no TRF-3.

Danilo Fontenelle, Vladimir Aras, Varas especializadas
Danilo Fontenelle, juiz federal no Ceará, e Vladimir Aras, procurador regional da República em Brasília - Divulgação

Vladimir Aras foi Secretário de Cooperação Jurídica Internacional da Procuradoria-Geral da República (2013-2017). Foi membro do Grupo de Trabalho em Crime Organizado e do Grupo de Trabalho em Lavagem de Dinheiro e Crimes Financeiros da PGR.

Procurador Regional da República em Brasília (MPF), é mestre em Direito Público pela UFPE, especialista (MBA) em Gestão Pública (FGV), professor assistente de Processo Penal na Universidade Federal da Bahia (UFBA).

Danilo Fontenelle é titular da 11ª vara da Justiça Federal do Ceará. Fez parte do primeiro grupo de juízes especializados em crimes financeiros e lavagem de dinheiro, ao lado de Fausto Martin De Sanctis, Sergio Fernando Moro, Jorge Gustavo Macedo Costa, Abel Fernandes Gomes, Gerson Godinho Costa e Cassio Granzinolim.

Foi advogado, procurador do Município de Fortaleza e procurador da República. Possui especializações na Universidade Federal do Ceará, Universidade de Brasília, Universidade Federal Fluminense, MBA pela FGV/RJ, mestrado pela UFC/CE e doutorado pela PUC/SP. É autor de livros e artigos jurídicos e de contos.

É professor da graduação e mestrado no Centro Universitário 7 de Setembro- Uni7

Aras: especialização continua prioritária em vários países

Acho que não é uma boa ideia a extinção de varas especializadas. A especialização continua sendo uma tônica no enfrentamento da lavagem de dinheiro, da corrupção e do crime organizado em vários países.

A especialização tem sido apontada como boa prática para a organização judiciária e também do Ministério Público. Tanto é assim que a França (com o Parquet National Financier - PNF), a Noruega (com o Økokrim) e o Reino Unido (com o Serious Fraud Office - SFO) têm suas unidades especiais nos seus MPs para enfrentar a delinquência econômica.

A Romênia criou a sua Divisão Nacional Anticorrupção- DNA, dentro do MP local.

Recentemente, na União Europeia, entrou em funcionamento a Procuradoria Europeia (European Public Prosecution Office - EPPO), cuja missão é exatamente enfrentar fraudes financeiras contra os interesses da União, de forma muito especializada.

Vários países também incorporaram aos seus sistemas judiciários juízos ou tribunais especializados ou especializaram, às vezes com competência nacional, certas unidades judiciárias, como é o caso da Espanha, com a competência da Audiência Nacional em matéria de terrorismo, ou da Special Criminal Court (SCC) da Irlanda, que julga crime organizado e terrorismo.

Se há vícios sistêmicos aqui ou ali, esses podem ser superados ou mitigados com contramedidas adequadas e controle disciplinar.

Fontenelle: juiz especializado avalia as provas em menor tempo

Imagine que você tem um problema cardíaco e vai a um hospital. Você prefere ser atendido por um clínico geral ou por um cardiologista?

Agora imagine você com as duas pernas quebradas, sendo uma operada por um ortopedista e outra por um psiquiatra. Em ambas as hipóteses, você estará sendo atendido por um médico formado, concursado e experiente, mas será que temos dúvidas sobre qual atendimento será melhor, mais rápido e efetivo?

Pois bem, guardando as proporções, o mesmo ocorre quando um juiz analisa um processo.

Juízes especializados e não especializados são concursados e experientes, todos competentes academicamente, responsáveis e cônscios de seus deveres, mas é óbvio que o especializado em determinada matéria será capaz de, em menor tempo, analisar as provas, sopesar os depoimentos, ponderar testemunhos, avaliar perícias e, até mesmo, saber o necessário para o melhor esclarecimento dos fatos.

Assim, a mesma lógica indica as várias especializações na justiça estadual, com suas varas, por exemplo, de família, do tribunal do júri e de violência doméstica, bem como a própria especialização constitucional da justiça federal, do trabalho, militar e eleitoral.

As varas especializadas em lavagem de dinheiro surgiram por compromissos que o Brasil assumiu internacionalmente para o combate ao crime organizado, iniciando suas implementações sob a orientação do então ministro do Superior Tribunal de Justiça, Gilson Dipp, no início dos anos 2000.

De lá para cá, os juízes não apenas se especializaram na interpretação da legislação específica, mas, principalmente, no julgamento de casos com operações financeiras intricadas, provas periciais contábeis de altíssima complexidade e tiveram contato com a imensa criatividade de quem se dedica a acobertar crimes e tornar o lucro ilícito invisível às autoridades públicas.

Não há dúvidas que um psiquiatra pode se tornar um excelente ortopedista, nem que um clínico geral é capaz de, com o tempo e a especialização necessária, fazer operações cardiológicas. Apenas não sei se os pacientes podem esperar.

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