Frederico Vasconcelos

Interesse Público

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Descrição de chapéu Folhajus STF

Secretário-geral do CNJ defende 'juiz cigano' e 'juiz de fora'

"Não há previsão legal que proíba o intercâmbio", diz Valter Shuenquener

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O secretário-geral do CNJ (Conselho Nacional de Justiça), Valter Shuenquener, publicou artigo no site Conjur em que defende a Resolução 441, que permite o intercâmbio profissional de juízes.

O programa anunciado pelo ministro Luiz Fux, presidente do CNJ, prevê que magistrados poderão atuar em tribunais de outros estados no período de até seis meses. O objetivo é disseminar boas práticas e compartilhar conhecimentos.

Luiz Fux e Valter Shuenquener em sessão do CNJ
Ministro Luiz Fux, presidente do Conselho Nacional de Justiça, e juiz Valter Shuenquener, secretário-geral do CNJ - Divulgação

Shuenquener diz que se trata de "novidade no Poder Judiciário, mas já conhecida pela iniciativa privada, que, de longa data, faz uso de secondments e intercâmbios profissionais".

"Nas polícias e no Ministério Público, são comuns treinamentos, investigações e operações conjuntas de longa duração, inclusive em parceria com instituições estrangeiras", afirma.

Shuenquener é professor de Direito da UERJ. É juiz federal do Tribunal Regional Federal da 2ª Região. Foi juiz auxiliar e juiz instrutor no gabinete de Fux no Supremo Tribunal Federal.

Críticas e contraditório

O secretário-geral não menciona reportagem publicada neste Blog e artigo do professor e jurista Lenio Luiz Streck, no Conjur, no último dia 10. Os dois textos criticam a resolução.

A título de estimular o debate, reproduzimos algumas dessas críticas e trechos de opiniões no artigo de Shuenquener:

Blog: Pergunta de um juiz federal: se um juiz de vara previdenciária vai para outra vara previdenciária o que ele vai aprender lá que já não sabia?

Shuenquener: Se o juiz já era especializado em um tema no tribunal de origem, o que ele vai aprender no novo local? Por mais que a matéria seja a mesma, cada juiz desenvolve suas técnicas, sua metodologia e sua gestão. O intercâmbio criado tem, assim, o elevado objetivo de que todos saibam a melhor forma de se fazer aquilo que deve ser bem feito. O juiz que tenha sólidos conhecimentos em uma matéria poderá receber colegas de outras localidades para que aprendam, na prática (hands on experience), a maneira mais eficiente de atuar com aquele tema.

Blog: "Não há lei que ampare esta figura do juiz cigano; mas a este STF, ausência de lei não é óbice a suas imposições", diz o procurador da República Celso Três, de Novo Hamburgo (RS).

Shuenquener: Mas as leis, como a Loman, proíbem essa prática? Não há previsão legal nem constitucional que proíba o Poder Judiciário de incentivar o aprimoramento profissional de seus magistrados por meio de intercâmbio profissional. Ao revés, o princípio constitucional da eficiência, que é um dos princípios basilares da Administração Pública brasileira, fundamenta a iniciativa.

Blog: Kenarik Boujikian, desembargadora aposentada do Tribunal de Justiça de São Paulo, diz que "a resolução do CNJ fere o princípio constitucional do juiz natural, um dos mais caros ao sistema democrático". Segundo ela, trata-se de uma garantia que não é dirigida aos magistrados, mas para a garantia do jurisdicionado e da democracia, com a salvaguarda de regras legais de competência, de acesso ao cargo etc.

"O que está na Constituição é o princípio do juiz natural e o CNJ deveria ser o primeiro a defender o princípio, assim como todos os juízes", afirma Boujikian.

Lenio Streck: Por mais que subsistam nobres interesses — e não duvido disso — por trás da Resolução 441/2021, a Constituição garante o princípio (não raras vezes esquecido) do juiz natural. Que não é um direito do juiz e que não é um adorno que pode ser trocado, mas sim uma garantia do jurisdicionado.

Se é para o jurisdicionado, juiz não pode renunciar ao que não é seu. Não há no sistema constitucional e nem legal a possibilidade de um juiz exercer jurisdição em outro Estado: o acesso ao cargo é por concurso. Como todo mundo legisla no Brasil — do Carf à CBF — a Resolução 441 pretende sacrificar algo que não pode ser sacrificado e que sequer tem condição de possibilidade para tanto. Se abrir mão do Juiz Natural é uma questão administrativa e financeira dos tribunais, logo mais se poderá abrir mão de qualquer coisa em nome da administração.

Shuenquener: A novidade também não viola o princípio do juiz natural. É que a atuação do juiz no novo local será formalizada por um ato do tribunal que o receber e, partir de então, ele será inamovível do juízo e só poderá julgar processos novos. Não podemos confundir a pessoa do juiz com o juízo para o qual o processo é distribuído. Ninguém tem o direito de escolher o juiz do seu processo, mas apenas o de exigir a distribuição da ação para o juízo previsto, o que, aliás, é plenamente observado pelo programa instituído.

Nepotismo e juricidade

Em abril de 2020, quando ocupava a vaga do Supremo no CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público), Shuenquener extinguiu Procedimento de Controle Administrativo instaurado para impugnar portarias do procurador-geral da República. Augusto Aras alterou estatuto e interrompeu os mandatos em exercício de 16 conselheiros e coordenadores da Escola Superior do Ministério Público da União (ESMPU).

Shuenquener entendeu que não é atribuição constitucional do conselho controlar os atos praticados pelo procurador-geral, que preside o CNMP.

Em seu artigo no Conjur, Shuenquener afirma que o "CNJ foi autorizado pelo Supremo Tribunal Federal a editar atos para a concretude do texto constitucional". Cita como exemplo "a proibição da contratação de parentes que, mesmo na ausência de lei, tornou-se proibida com amparo no princípio da juridicidade administrativa".

"Referido princípio, aliás, veio em boa hora para assumir o protagonismo da legalidade estrita dos anos 1990", diz o secretário-geral.

Em má hora, digamos assim, a Resolução 441 foi aprovada em sessão ordinária do CNJ com aval, inclusive, do recém-empossado conselheiro Mário Henrique Nunes Maia, filho de Napoleão Nunes Maia, ministro aposentado do STJ (Superior Tribunal de Justiça).

A nomeação do conselheiro somou nepotismo e filhotismo, graças a alterações do regimento do CNJ no primeiro dia da gestão do ministro Dias Toffoli na presidência do órgão de controle externo do Judiciário.

Na ocasião, um magistrado ex-conselheiro do órgão desabafou: É uma vergonha! O órgão que empunhou a bandeira contra o nepotismo agora o acolhe!

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