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Descrição de chapéu Folhajus

Novo estatuto beneficia Flávio Bolsonaro, afirma site jurídico

Transparência Internacional vê maior risco de serviços fictícios para lavagem

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O novo Estatuto da Advocacia, sancionado pelo presidente Jair Bolsonaro, foi aplaudido pela advocacia, mas gerou sérias dúvidas.

Questiona-se na Lei 14.365/2022, publicada na sexta-feira (3/6), um artigo que poderá beneficiar o senador Flávio Bolsonaro, filho do Presidente. Teme-se também os efeitos de um artigo sobre honorários dos advogados no caso de bloqueio de patrimônio do cliente.

Novo Estatuto da Advocacia beneficia senador Flávio Bolsonaro, diz site jurídico
Jair Bolsonaro, presidente da República, e senador Flávio Bolsonaro. No destaque, Marcus Vinicius Furtado Coêlho, ex-presidente da OAB - Valter Campanato/Agência Brasil e OAB

Eis como o Migalhas, informativo jurídico que circula entre advogados, tratou a primeira incerteza:

A quem interessar possa

Estes dias voltou nos jornais a discussão acerca de como o senador Flávio Bolsonaro comprou uma mansão no Lago Sul de Brasília. Na explicação da origem do dinheiro para fazer frente ao vultoso gasto, Flávio Bolsonaro disse que seria fruto de uma frutífera atividade advocatícia, embora não se encontre uma petição assinada por este "jurista" nos fóruns.

Pois bem, vejamos agora o que hoje o amoroso pai do rapaz sancionou, alterando o Estatuto da Advocacia. Consta agora que "as atividades de consultoria e assessoria jurídicas podem ser exercidas de modo verbal" e "independem de outorga de mandato ou de formalização por contrato de honorários".

Esse é o novo § 4º, do art. 5º, da lei 8.906/94, que sugerimos chamar agora de parágrafo Flávio Bolsonaro. 'E la nave va'.

Em artigo no Valor, a jornalista Maria Cristina Fernandes cita o Migalhas e afirma que o novo estatuto "pode respaldar a justificativa apresentada pelo filho senador, Flávio Bolsonaro, para seus rendimentos com os quais comprou uma casa de R$ 6 milhões em Brasília".

"Em resposta a uma ação popular no TJDFT, movida pela deputada Erika Kokay (PT-DF), o senador disse ter se valido da renda de seu trabalho como advogado para financiar parte da compra. Seu salário como senador é de R$ 33 mil. E o patrimônio declarado à justiça eleitoral, em 2018, R$ 1,74 milhão".

Não há processos em tramitação em que conste como advogado nas duas praças em que Flavio Bolsonaro tem registro da Ordem dos Advogados do Brasil (Rio e Distrito Federal), diz a jornalista.

Diz o Migalhas: "As alterações na lei, como dito, são importantes e significam uma vitória da advocacia e do Conselho Federal da OAB, o qual merece aplausos. Nesse sentido, enviamos nossos parabéns a todos os que lutaram pela aprovação, e o fazemos na pessoa do ex-bâtonnier, Marcus Vinicius Furtado Coêlho".

O ex-presidente Marcus Vinicius Coêlho preside a Comissão de Estudos Constitucionais do Conselho Federal da OAB. Foi um dos apoiadores da indicação do conterrâneo piauiense Kassio Nunes para a vaga de Celso de Mello no Supremo Tribunal Federal. A madrinha do então juiz do TRF-1 foi a juíza federal Maria do Carmo Cardoso, tida como conselheira jurídica da família Bolsonaro e citada como amiga do senador Flávio Bolsonaro.

Em 2014, Marcus Vinicius Coelho apoiou a frustrada candidatura de Kassio Nunes à vaga do ex-corregedor nacional Gilson Dipp, no Superior Tribunal de Justiça. Havia resistência no Judiciário a candidaturas de magistrados oriundos da advocacia, concorrendo com juízes de carreira.

Sobre o novo estatuto, o advogado comentou no site da OAB: "A lei cumpre a Constituição Federal quando estabelece que o advogado é indispensável e essencial à Justiça. Fortalecer o advogado é valorizar o cidadão".

Estatuto e lavagem

O segundo item questionado nas redes sociais é o artigo que trata dos honorários dos advogados nos casos de bloqueio de patrimônio do cliente:

Art. 24-A. No caso de bloqueio universal do patrimônio do cliente por decisão judicial, garantir-se-á ao advogado a liberação de até 20% (vinte por cento) dos bens bloqueados para fins de recebimento de honorários e reembolso de gastos com a defesa, ressalvadas as causas relacionadas aos crimes previstos na Lei nº 11.343, de 23 de agosto de 2006 (Lei de Drogas), e observado o disposto no parágrafo único do art. 243 da Constituição Federal.

Em comentário nas redes sociais, o procurador regional da República Bruno Calabrich considerou esse artigo uma "inovação preocupante".

"Se o criminoso conseguiu formar um patrimônio de R$ 10 milhões desviando dinheiro público (ou qualquer outro crime que não tráfico de drogas), R$ 2 milhões serão reservados ao advogado", observou Calabrich.

"Será possível lavar através de honorários advocatícios"?, perguntou um magistrado, em lista de discussões. Outro acrescentou: "Criaram o Estatuto da Lavagem de Dinheiro"?

A ONG Transparência Internacional avalia que, ao autorizar expressamente a prestação de serviços apenas verbais e sem requisitos básicos de formalização e documentação, o novo Estatuto da Advocacia "agrava muito mais o risco de serviços fictícios para lavagem de dinheiro".

Em notas nas redes sociais, a TI cita artigos da Lei 14.365/2022 que "retiram do Ministério Público e do Poder Judiciário a competência de analisar e decidir sobre a prestação de serviços e cobrança de honorários suspeitos de lavagem de dinheiro e outros crimes, transferindo esse poder à própria OAB".

A ONG também considera controverso o estatuto impor que "o pedido de desbloqueio dos recursos para pagamento dos honorários advocatícios seja sempre sigiloso, o que violaria a regra geral de publicidade dos atos processuais".

Posição da OAB

A Ordem dos Advogados do Brasil publicou a seguinte nota sobre o novo estatuto:

"A Ordem dos Advogados do Brasil recebeu com satisfação a sanção da lei que atualiza o Estatuto da Advocacia. O texto publicado no Diário Oficial da União foi possível graças ao trabalho da diretoria da OAB Nacional e de presidentes de seccionais, conselheiras e conselheiros federais e seccionais, membros de comissões e de caixas de assistência junto ao Legislativo e ao Executivo".

A conselheira federal Cristiane Damasceno (DF) considera o reforço à essencialidade alimentar dos honorários o ponto alto da lei.

"É um grande ganho porque o advogado não precisa mais ficar esperando desbloquear os bens, ou mesmo saber se haverá esse desbloqueio. Honorários constituem quase um salário, a renda do advogado. Quem está trabalhando, precisa receber. Isso, por si só, já foi um ganho importante dentro da nova legislação, especialmente às advocacias criminal e tributária, que são áreas reiteradamente sujeitas a essas medidas. É um ponto de extrema relevância", disse Damasceno.

Em relação à verba honorária, a OAB vê como principal novidade o asseguramento expresso do pagamento de honorários de acordo com o previsto pelo Código de Processo Civil (CPC), nos termos da decisão recente da Corte Especial do STJ.

Assim, passa a ser previsão legal a aplicação dos percentuais previstos nos §§ 2º ou 3º do artigo 85 do CPC, vedada a fixação de honorários advocatícios por apreciação equitativa em causas de valor elevado.

A Lei 14.365/2022 também garante o destaque dos honorários dos advogados, ou seja, a verba honorária já é destacada do valor principal da respectiva causa processual e expedida em nome do advogado, afastando a burocracia da necessidade de requerimento formal por parte dos profissionais da advocacia.

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