Não foram confirmadas até o momento as mortes do indigenista brasileiro Bruno Araújo Pereira e do jornalista inglês Dom Phillips, desaparecidos desde o dia 5 de junho na Amazônia, mas o nosso projeto de democracia certamente morreu.
E nós estamos tão exaustos.
É muito mais do que o sentimento de luto neste mesmo país que não aguenta mais perder ninguém e, mesmo assim, as pessoas seguem morrendo e nós seguimos perdendo.
Estamos perdendo ainda mais do que as pessoas, estamos perdendo o futuro.
Morreu Marielle, morreram as vítimas da chacina de Jacarezinho, morreram os filhos das mães de Vila Cruzeiro e nós não temos qualquer perspectiva de que os responsáveis por todas essas mortes sejam punidos.
Como é que um país pode seguir de pé quando sabe que continuará em luto mais e mais vezes e não pode colocar a culpa por esse luto em quem tem a culpa, porque não nos dão o direito de saber quem são?
Atribuir tudo a governos de morte, embora seja tentador, é muito pouco e pode tornar as coisas bem mais fáceis para quem quer nos matar. Há muito mais interessados e beneficiados na manutenção das estruturas fratricidas do que os governos de ocasião, mesmo os que são ostensivamente favoráveis a elas.
Antes a gente falava que o Brasil era o país da impunidade, porque via pessoas condenadas por crimes graves escapando do cumprimento de penas que já considerávamos leves - ainda que tenhamos, por outro lado, a terceira maior população carcerária do mundo. Agora não vemos nem mesmo essa condenação: paramos antes de conseguir dar nomes aos culpados.
Quem tem medo de cometer crimes, os piores deles, em um cenário desses? Quem tem medo de matar no Brasil?
É tarde demais para acreditar que compartilhar milhares de tweets que dizem milhares de vezes que vivemos projetos governamentais de extermínio e genocídio pode nos ajudar a interromper esse ciclo.
A nossa democracia morreu antes mesmo de nascer para a maior parte da população brasileira. Seguimos morrendo diariamente junto dela - e já não podemos sequer nos dar ao luxo de saber quem nos mata.
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