Sempre me chamou a atenção aqueles jornaizinhos, panfletos ou até outdoor em que políticos costumam postar mensagens de que trouxeram dinheiro para uma região. Aqueles milhões que foram usados em uma ponte que nunca foi erguida, em um gramado de futebol society colocado no parque, na ambulância para aquele hospital.
Mas como esse dinheiro chega? E ele realmente chega?
Durante seis semanas, nos debruçamos sobre o novo tipo de repasses criado nos últimos anos por deputados e senadores, as emendas do relator, que ganharam o apelido de "orçamento secreto".
Antes dessa medida, cada deputado tinha um valor fixo para propor ao orçamento e tudo ficava registrado. Com o orçamento secreto, os parlamentares destinam as emendas sem haver transparência para onde vai o dinheiro e o que vai ser feito com esses recursos. Não há limite e também não ficam claros os critérios para quanto um deputado pode encaminhar no orçamento.
Em reportagem que fiz ao lado de Renan Omura, Cleberson Santos e Renan Cavalcante, identificamos para onde foram enviadas o dinheiro da chamada ‘emenda do relator’ na região metropolitana de São Paulo.
Para conseguir apurar esses repasses não foi um processo simples. A Câmara dos Deputados só disponibilizou informações depois de uma cobrança feita pelo STF (Supremo Tribunal Federal). O que foi disponibilizado foi um PDF, sem os nomes dos parlamentares, mas com as cidades e o valor destinado em 2020 e 2021.
Com base nesse arquivo PDF, conseguimos acessar os dados, transferi-los para uma planilha e filtrar cada cidade. Depois, separamos as cidades que eram do estado de São Paulo e, por fim, da Grande São Paulo, para chegar a quanto foi destinado.
Por fim, cruzamos com quantos moradores vivem em cada município, para ter ideia da proporção dos repasses.
O resultado dessa apuração foi entender quais cidades foram mais beneficiadas com esse tipo de forma secreta de enviar o dinheiro público na região metropolitana.
Inicialmente, a capital paulista foi a cidade que mais recebeu verbas - o que é natural pelo número de habitantes. No entanto, o restante dos repasses mostra como os critérios não eram mais relacionados claramente a políticas públicas.
As cidades administradas pelo PL, partido que passou a ter Jair Bolsonaro como presidente no ano passado, foram as que mais receberam proporcionalmente valores das emendas, caso de Suzano e Ribeirão Pires, com mais de R$ 25 milhões. Outras muito populosas, como Guarulhos e São Bernardo do Campo, embolsaram R$ 500 mil e R$ 1,5 milhão, respectivamente.
Também descobrimos que até para pagar gasolina há deputados se debruçando em Brasília para acrescentar ao orçamento.
O correspondente de Suzano Renan Omura esteve nos locais que deveriam ter as obras descritas, a Avenida Robert Simonsem. Por lá, ainda não há sinal da melhoria ou da aplicação do recurso.
Uma questão fundamental desse trabalho foi entender como a falta de transparência no repasse do dinheiro público prejudica tanto a cobrança, como impede a fiscalização.
Todos os repasses foram detalhados na reportagem, e também disponibilizamos essa informação para nossa audiência com uma novidade: a possibilidade de baixar os dados clicando em "como fizemos". É uma forma tanto de inspirar novas pesquisas que envolvam os dados públicos e também mostrar à audiência que transparência e acesso à informação é um direito de todos os cidadãos..
Em um ano em que a eleição presidencial será o grande tema do ano, é preciso estar alerta ao caminho do dinheiro.
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