"É uma forma de honrar nossa verdadeira história, mas também um compromisso conosco, com as gerações futuras", define a artista Íldima Lima sobre uma das motivações para a criação da série de oito telas "Negras Cabeças".
As pinturas, expostas virtualmente até 29 de dezembro, transmitem a expressividade de mulheres africanas através dos seus cabelos na cultura das etnias Betsimisaraka (Madagascar), Mangbetu (Congo), Suri e Mursi (Etiópia), Mwila (Angola), Mbalantu e Himba (Namíbia), e Fulani (Nigéria).
Em penteados e adornos, se conjugam ética, técnica, estética. Expressões de status, situações, sentimentos. Comunicação entre pares e com objetivos terrenais, mas também conexão com o divino.
"O resgate da nossa ancestralidade é muito mais do que apenas lançar um olhar temporal para uma memória que carrega símbolos e signos. Acredito que perpassa a habilidade de extrair modelos replicáveis ao que pensamos e fazemos agora", diz Lima ao Preta, Preto, Pretinhos. "Digo isso no sentido de entender que o nosso povo foi violentado e interrompido em seu processo de evolução enquanto indivíduos, mas também nas múltiplas camadas que compõem nossa experiência humana e validam uma história, um legado."
A experiência proposta pela artista soteropolitana se desdobra também em um game em que Lima convida o visitante à imersão, a uma "viagem no tempo". Em um passeio entre mar, vegetação e construções, encontramos suas obras e informações sobre as funções sociais e culturais desempenhadas pelas diferentes formas de apresentar o cabelo. De representações de majestade e inteligência superior a expressões de júbilo ou luto.
"O processo de colonização e escravização foram responsáveis pelo apagamento da história que já se construía até aquele momento. As riquezas, as tecnologias, o conhecimento, a cultura foi subjugada, dilacerada e usurpada. Por isso, esse movimento de conexão com esse momento que antecede esse período nefasto nos coloca como responsáveis por resgatar e permanecer avançando com os instrumentos e ferramentas disponíveis hoje", diz Lima.
A artista trabalha em uma segunda etapa do projeto, que, segundo conta, deverá ganhar uma "apresentação visual mais contemporânea". O propósito de reconexão continua, mas a partir de um diálogo entre ancestralidade e elaborações de identidade cotidianas.
"A proposta é seguir a trilha que nos trouxe até onde estamos, mas também provocar uma reflexão sobre os dinamismos, as efusões provenientes do intercâmbio resultante da diáspora e por conseguinte as amplas formas de expressão cultural que os novos posicionamentos desses corpos criaram", pondera. "Quais são os elos que realmente nos mantêm conectados com essa africanidade?"
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