Quadro-negro

Uma lousa para se conhecer e discutir o que pensa e faz a gente preta brasileira

Quadro-negro - Dodô Azevedo
Dodô Azevedo

Nunca existiu Estado de Direito de fato para negros no Brasil

Que tal uma carta em defesa do Estado democrático de Direito para o povo preto?

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Fachada da faculdade de Direito da USP no Largo Sao Francisco (Foto: Eduardo Knapp/ Folhapress, COTIDIANO). - Folhapress

A Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP) publicou e agora mobiliza a sociedade para que seja assinada um documento chamado "Carta às Brasileiras e aos Brasileiros em Defesa do Estado Democrático de Direito!"

O ponto de exclamação no fim do título é compatível com a urgência da situação.

Um golpe a ser dado pelo executivo, legislativo, setores militares e militantes civis vem por aí.

Nosso Estado de Direito está em perigo.

Nosso quem, caras-pálidas?

Um estudo da própria USP, feito no ano passado, cravou: 705 mil homens brancos têm renda maior que a de todas as 33 milhões de mulheres negras do Brasil.

O mesmo estudo também informou que sete em cada dez brasileiros mais pobres são negros.

O 14º Anuário Brasileiro de Segurança Pública, divulgado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública 2020, apontou que dois de cada três presos no Brasil são negros.

O mesmo relatório informa que oito a cada dez pessoas mortas pela polícia no Brasil têm a pele preta. O dossiê Mulheres Negras e Justiça Reprodutiva, realizado pela ONG Criola, diz que, entre 2029 e 2020, de 10,1 milhões de pessoas que deixaram de estudar entre 14 e 29 anos, 71% são pessoas pretas.

Índice de mortes por abortos, o dobro de mulheres negras comparando-se à mulheres brancas.

Das pessoas que morreram na ação da polícia no Complexo do Alemão, uma semana atrás, a maioria era negra. E a maioria dos policiais, também.

Como uma grande arena de gladiadores, pessoas pretas se matam e se tornam matérias na TV cheias de adrenalina.

Nas telas, a representação do corpo do homem e da mulher negra é submetida a uma erotização inventada pela ideia colonial de desumanização de pessoas de pele preta. Para nos destacarmos, temos que ser belos corpos sem alma.

Estado democrático de Direito, de fato, nunca tivemos.

E estamos ainda muito distantes de conseguir.

Os anos Bolsonaro fizeram aumentar em minha cidade a quantidade de pessoas que procuram comida no lixo dispensado por pessoas de classe média, como eu.

Todas as pessoas que reviram o lixo que deposito às terças e quintas na caçamba da compania de lixo têm a pele preta.

Tento, de alguma forma, organizar a comida que sai daqui de casa em quentinhas a serem distribuídas durante a hora que costumam vir as pessoas. Oito e meia da noite.

Os donos do comércio que fica na vizinhança, todos brancos, não gostam. Disseram que "isso vai atrair mais deles".

Mas quem são "eles"?

São o nosso quem.

Os que para a democracia nunca chegou, e em tempos conservadores, se afasta ainda mais.

Os que não têm condições de escrever ou assinar uma carta.

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