A cobrança para estarmos sempre produzindo aparece em todas os lugares e situações na nossa sociedade. Seja na escola, na faculdade, no trabalho ou mesmo em algum projeto da vida pessoal. Se não conseguiu é porque não se esforçou o sufiente.
Nas redes sociais, é comum nos depararmos com posts de influenciadores ou coaches de carreira que usam o termo "trabalhe enquanto eles dormem". Esses textos, que têm a pretensão de serem motivacionais, focam a lógica do sucesso ou fracasso como sendo apenas uma questão de esforço pessoal e excluem os contextos sociais, financeiros, raciais e mesmo de rede de apoio que cada pessoa tem.
Como se isso não bastasse, a ideia de trabalhar até a exaustão e não tirar um tempo para descanso e lazer, além de gerar transtornos como ansiedade, depressão e burnout, também não é uma boa atitude do ponto de vista da neurociência. O ser humano precisa relaxar e dormir bem para que a memória, o aprendizado, a criatividade e a motivação funcionem direito.
"Dormir mal afeta todos os sistemas do cérebro, inclusive os envolvidos com a motivação. Se a pessoa dorme mal, ela se sente menos motivada e procrastina mais, fica preguiçosa. Com o estresse é a mesma coisa. O estresse muda a forma de como o cérebro vai calcular o custo-benefício das tarefas, fica mais difícil ter motivação", diz o neurocientista Andrei Mayer, professor do Departamento de Ciências Fisiológicas da UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina) e administrador do podcast A culpa é do cérebro.
Livia Ciacci, neurocientista do método Supera – Ginástica para o Cérebro, chama a atenção para o fato de que, além de subestimar a importância do descanso, esse discurso aumenta o ritmo de cobrança.
"Primeiramente acontece a tensão física e o cansaço mental motivado pela rotina repetitiva e a pressão dos prazos. A pessoa se mantém em um ritmo de cobrança constante e vai se tornando cada vez mais sensível aos estímulos, levando, por exemplo, a irritações em circunstâncias em que normalmente não se irritaria", observa.
Ciacci explica que é preciso levar o descanso a sério. Quando essa pausa não acontece e a pessoa fica o tempo todo tentando dar conta de tudo, a mente passa a entender tudo como ameaça. "Isso leva a um aumento do estado de alerta, o cérebro manda o corpo liberar hormônios, como a adrenalina por exemplo, que faz com que os músculos se contraiam", afirma.
"Músculos contraídos comprimem nervos, levando ao surgimento de dores no corpo. Os pensamentos acelerados começam a alterar a qualidade do sono porque, nessas condições, o cérebro não consegue passar pelas fases normais do sono, não conseguindo, de fato, descansar. Daí começam a aparecer as mudanças comportamentais, como perda de interesse em coisas que davam prazer e outros sintomas de ansiedade."
A neurocientista diz que essa é uma questão fisiológica. "Descansar seu corpo e mente vai, na verdade, colaborar com o seu desenvolvimento já a curto prazo."
Abaixo, Ciacci aponta cinco benefícios do cérebro descansado para não cair na cilada da frase "trabalhem enquanto eles dormem":
Descanse para tomar melhores decisões
Vários experimentos demonstraram que a fadiga faz com que nossas decisões sejam ruins e isso é levado muito a sério em algumas profissões, como os pilotos de avião
Descanse para sua memória funcionar melhor
As emoções e o estado de ânimo influenciam diretamente na capacidade de memorização de episódios e informações. Quanto mais cansado você estiver, pior estará sua memória.
Descanse para ser mais criativo
Criatividade é uma ação que depende de processamentos em segundo plano, fora da consciência, e eles acontecem principalmente nos momentos de descanso.
Descanse e previna o mal de Alzheimer
Manter um ritmo saudável de descanso e sono facilita os processos de limpeza dos restos metabólicos que ficam no tecido cerebral após a atividade mental intensa. Isso previne desordens e doenças como o Alzheimer
Descanse e tenha mais amigos
Um cérebro descansado é mais bem-humorado e será capaz de socializar melhor, uma vez que terá mais chances de ver a vida com empolgação e motivação
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