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Mulheres e Meninas fazem Ciência!

Cientistas têm histórias e descobertas formidáveis, mas ainda pouco reconhecidas

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Soraya Smaili, Maria Angélica Minhoto e Pedro Arantes
São Paulo

Hoje, 11 de fevereiro, é o Dia Internacional das Mulheres e Meninas na Ciência. Uma data para comemorar avanços, mas também refletir sobre as dificuldades que persistem. E, mais importante do que isso, uma data para propor novas ações que continuem a transformar essa realidade e dar visibilidade às cientistas do gênero feminino.

A Ciência ganhou grande destaque recentemente, especialmente no contexto da pandemia e da evidência de que é uma chave para a garantia do direito à vida. Presenciamos descobertas importantes e necessárias de um lado, acompanhadas pelo crescimento do negacionismo de outro. Temos visto o esforço de pesquisadoras e pesquisadores, mas, sem dúvida, o empenho e dedicação das mulheres cientistas merece destaque.

Há tempos, o gênero feminino está na Ciência, mas durante longo período ficou invisível, mesmo quando mulheres foram responsáveis por grandes descobertas. Mas isso está mudando, pois alguns dos mais importantes estudos para combater o coronavírus vieram de mulheres, que também são maioria na linha de frente do cuidado dos pacientes com a covid-19.


Dentre as descobertas mais relevantes, está o trabalho da Dra. Katalin Karikó, cujos estudos de mais de três décadas com o RNA (ácido ribonucleico) levaram a uma tecnologia aplicável a vacinas para covid-19. Mais um destaque é a Dra. Sarah Gilbert, pesquisadora da Universidade de Oxford e principal responsável pelo desenvolvimento de outro imunizante. No Brasil, os estudos desta vacina foram conduzidos pela Dra. Lily Weckx, que junto com sua equipe da Unifesp coordenou todos os dados que levaram aos estudos de fase 3 e ao registro da vacina Astrazeneca pela Anvisa. Ainda em nosso país, contamos com o essencial trabalho da Dra. Ester Sabino que, com a pesquisadora Jaqueline Goes de Jesus, possibilitou a identificação e sequenciamento do primeiro Sars-Cov-2 que chegou ao Brasil.

Entretanto, foi também na pandemia que as mulheres cientistas viveram suas maiores dificuldades. As duplas ou triplas jornadas de trabalho passaram a ser acompanhadas por outra dura realidade, a do isolamento. Alguns achados recentes do MaternaCiência, grupo de mulheres que conciliam o trabalho científico com a maternidade, mostram que mulheres pesquisadoras perderam posições em relação ao número de trabalhos publicados e, em comparação com os homens no mesmo período, também tiveram mais atrasos na finalização de suas teses ou artigos científicos.

Relatos mostram a infinidade de tarefas que as mulheres são submetidas devido às necessidades de distanciamento, o pouco auxílio nos trabalhos familiares e domésticos e de cuidados com a própria saúde. Dificuldades sempre presentes no cotidiano das mulheres que trabalham e se destacam, mas que se tornaram muito mais evidentes durante a pandemia.

O trabalho científico requer concentração e horas de dedicação aos experimentos ou rigorosos procedimentos, leitura, trabalho de campo e pesquisa em acervos, dependendo da área de conhecimento. E isso não deveria representar a priori uma sentença de incompatibilidade com a maternidade e os afazeres familiares. Entretanto, a discriminação está presente no meio acadêmico como em toda a sociedade.

Mesmo diante desses percalços, a atuação das mulheres cresceu em quase todas as áreas de pesquisa e atualmente elas representam 54% da população atuante no sistema nacional de ciência e tecnologia. No entanto, apenas um pequeno número assume cargos de lideranças. De fato, quanto mais elevados os postos, menos mulheres são vistas. Por exemplo, dentre os pesquisadores do CNPq, apesar de o número de mulheres ter aumentado, menos de 40% chega ao nível mais elevado do rigoroso sistema de avaliação.

Com mais de 70 anos de fundação, chama a atenção que o CNPq não tenha tido mulheres na sua presidência, o mesmo ocorrendo com várias agências de fomento, tal como a Finep e a FAPESP. Nas reitorias de universidades federais, atualmente, há apenas 13 reitoras dentre as 69 universidades, ocupando, portanto, menos de 20% dos cargos. Dentre as universidades estaduais paulistas, apenas a USP teve uma reitora em mais de oito décadas de existência. São inúmeras as posições de comando do sistema acadêmico que precisam se abrir à participação de mulheres.

Em nível internacional, muitos se lembram de Marie Curie, responsável pela descoberta da radioatividade e que se destacou como a primeira mulher a receber dois Prêmios Nobel em áreas da Ciência, prêmio prestigioso com mais de 120 anos de existência. Entretanto, em mais de um século, a situação pouco mudou nessa premiação. Apenas 23 mulheres foram laureadas em áreas da Ciência (excluindo os prêmios de Literatura e Paz) em toda a história do Nobel. Surpreendentemente, os anos de 2016 e 2017 passaram sem que mulher alguma fosse premiada.

ilustração com fundo roxo contendo mulheres em atuação como astronauta, cientista, química
Edson Ikê/SoU_Ciência

Nem por isso as mulheres cientistas deixaram de fazer grandes contribuições ao longo da história. A lista é grande, apenas para mencionar algumas: Ada Lovelace na matemática, Nettie Stevens na genética, Luise Meitner na física, Rosalind Franklin na genética e Katherine Johnson na matemática. No Brasil, destacam-se muitas pesquisadoras históricas, como Nise da Silveira na psiquiatria, Carolina Bori na psicologia, Bertha Lutz na biologia, Elisa Frota Pessoa na física, Elsa Gomide na matemática, Niede Guidon na arqueologia, Berta Becker na geografia, Maria da Conceição Tavares na economia, Emília Viotti na história, Lélia Gonzales na antropologia, Heleieth Saffioti na sociologia e tantas outras que merecem ser citadas e ter as suas histórias divulgadas.

A criação em 2015, pela do ONU, do Dia das Mulheres e das Meninas na Ciência permite celebrarmos os feitos das mulheres cientistas e, com isso, encorajar as meninas de hoje a buscarem a carreira científica.

No mundo contemporâneo, as mulheres ocupam todos os lugares, trabalham para fazer a diferença, podem e devem estar na vanguarda de muitas atividades, utilizando suas capacidades analítica, intelectual e conectiva. Mas ainda há muito a fazer para aumentar o incentivo e a sua visibilidade. É preciso caminhar lado a lado dos colegas cientistas, e valorizar e respeitar as mulheres em posição de liderança.

O SoU_Ciência celebrou o Dia Internacional das Mulheres e Meninas na Ciência com a representação de pesquisadoras do centro e de cientistas de diferentes áreas que participaram de uma transmissão ao vivo para mostrar o trabalho incrível de algumas mulheres cientistas e pesquisadoras que atuaram para combater a pandemia, como as médicas Ester Sabino e Gulnar Azevedo; para analisar e combater as desigualdades sociais, o racismo estrutural e o lugar de direitos dos negros e negras em nosso país, como Nilma Lino Gomes, para analisar a polarização política na sociedade brasileira, como Esther Solano, e para expressar a paixão pela ciência e o apoio para viabilizá-la, como Luiza Helena Trajano.

Mulheres aliadas, falando de lugares e estágios diferentes, atuando juntas para avançar em suas carreiras e criando oportunidades para outras mulheres por meio de uma importante rede de relacionamentos. Falando de maternidade e de pesquisa, e da criação de estratégias para garantirmos igualdade de direitos e acesso.

É preciso reconhecer e intensificar a formação de redes que auxiliem as mulheres a romperem barreiras e aumentem as conexões entre todos os pesquisadores para que, juntos, atuem pela Ciência, Cultura e toda formação humana.

A realização de mais debates e da formulação de políticas públicas que garantam a formação em ciências para as meninas é essencial. Com isso, estaremos não só cumprindo a meta número 5 dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), que visa a igualdade de gênero, como também criaremos espaços para que o futuro seja de nossas mulheres e meninas cientistas.

foto de rostos das pesquisadoras que fazem parte do SoU_Ciência
SoU_Ciência

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