Vidas Atípicas

Em busca de respostas para dúvidas profundas e inesgotáveis sobre o autismo

Vidas Atípicas - Johanna Nublat
Johanna Nublat

Para entender os três níveis do autismo

O que quer dizer autismo leve, moderado e severo ou níveis 1, 2 e 3 de suporte?

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Quando comecei na jornada da maternidade atípica, aprendi que existiam três níveis possíveis dentro do espectro autista: leve, moderado e severo (termos tidos como já em desuso) ou níveis 1, 2 e 3 de suporte.

As duas classificações são intuitivas, e eu me perguntava se seriam idênticas. Leve é igual a nível 1? A resposta não, não são equivalentes.

"Quando falamos de leve, moderado e severo, frequentemente falamos de níveis de sintomas. Quando a gente fala de nível 1, 2 e 3, a gente está falando do suporte necessário para garantir o bem-estar e o funcionamento daquele indivíduo. Não é tão equivalente", explica Thiago Lopes, doutor em psicologia pela Universidade do Quebec e o responsável por introduzir, no Brasil, o modelo Denver de intervenção precoce.

"Às vezes, eu tenho um indivíduo cuja gama de sintomas não é tão ampla, então pode dar uma impressão de severidade baixa. Mas, quando você vai ver, os poucos sintomas que ele têm são tão intrusivos, que, na prática, o nível de suporte que ele precisa é maior. Eu tive crianças com uma cognição bastante preservada, mas que tinham uma busca sensorial tão intensa, que, no dia-a-dia, elas precisavam de suporte igual crianças de nível 3", diz Lopes.

Imagem do livro 'Menino Baleia', de Lulu Lima
Imagem do livro 'Menino Baleia', de Lulu Lima, sobre o autismo - Reprodução

Os termos leve, moderado e severo vêm do senso comum, não são oficiais, segundo explica Lucelmo Lacerda, doutor em educação com um pós-doutorado em psicologia, em um vídeo publicado em seu canal nas redes sociais. Por outro lado, esses termos podem passar a ideia equivocada que alguém com autismo leve, por exemplo, precisa de pouca carga horária de terapia ou não precisa de acompanhamento na escola, completa Lopes.

Já os níveis de suporte estão descritos no DSM-5 (Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais da Associação Americana de Psiquiatria), publicado originalmente em 2013. O manual divide o transtorno em três níveis de gravidade: 1 ("exigindo apoio"), 2 ("exigindo apoio substancial") e 3 ("exigindo apoio muito substancial").

O manual traz alguns exemplos práticos. Na comunicação social, por exemplo, o nível 2 seria: "Uma pessoa que fala frases simples, cuja interação se limita a interesses especiais reduzidos e que apresenta comunicação não verbal acentuadamente estranha". Já o nível 3: "Uma pessoa com fala inteligível de poucas palavras que raramente inicia as interações e, quando o faz, tem abordagens incomuns apenas para satisfazer as necessidades e reage somente a abordagens sociais muito diretas".

Os exemplos, no entanto, podem não responder às dúvidas mais específicas.

"É preciso complementar com outras observações, porque nós estamos falando de comunicação verbal e não verbal. Vou perguntar: Ele aponta? Faz o gesto de ‘tchau’ nem que seja com o dedo? Como é o contato visual? Contato visual é uma comunicação não verbal. Ele entende os nossos gestos comunicativos? Com qual frequência ele inicia a interação? É igual fazer o diagnóstico de autismo. Eu preciso de vários critérios. Quando eu olho um aspecto só, fica muito confuso", explica Lopes.

Para Fred Volkmar, professor da Universidade de Yale, os níveis acabam sendo usados de maneira inconsistente e, por isso, ele próprio evita usar a classificação. "Eu procuro falar da pessoa e das suas necessidades", disse ao blog.

No vídeo mencionado acima, Lacerda explica outra classificação existente, essa prevista no CID-11 (Classificação Internacional de Doenças), de 2022, que não separa o espectro por níveis, mas define especificadores: tem fala funcional preservada, prejudicada ou ausente?; tem deficiência intelectual ou não?

É bastante recorrente, quando se fala dos graus do autismo, a dúvida sobre a possibilidade de se definir um nível para crianças pequenas. Segundo Lacerda, como a eventual presença da deficiência intelectual acaba sendo identificada ou descartada mais claramente apenas na segunda infância, não seria muito adequado atribuir um nível para crianças pequenas.

Já Lopes pontua que o DSM-5 não traz nenhuma informação sobre idades mínimas para se determinar o nível de suporte. "É uma observação comportamental. Se eu olho os critérios de forma objetiva, o que me impede de definir qual o nível em que a criança se encontra naquele momento?" Em sua avaliação, não determinar o nível de suporte pode refletir o desconforto do profissional que avalia a criança. "Como se fosse ‘é autismo, mas é leve, tá, mãe e pai’. Como se fosse uma palavra de reconforto."

Por fim, é importante ressaltar, nas palavras do próprio Lopes, que a definição do nível de suporte é "uma fotografia do momento", que varia a depender das habilidades que vão sendo desenvolvidas pela pessoa, muito em função das terapias, do desenvolvimento e maturação natural, além do suporte oferecido pelas pessoas do seu entorno.

"A intervenção permite que a gente mude essas fotografias, reduzindo muitas vezes o nível de suporte que a pessoa precisa no seu dia-a-dia", diz ele.

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