Angústia. Nervosismo. Esperança.
É o Enem.
Estão para chegar as notas do temido teste estudantil.
Luís Gillian tinha um sonho.
–Estudar Medicina.
O colegial no Instituto de Ensino Médio Professor Pintassilgo não prenunciava bons resultados.
–E a mensalidade do cursinho eu não consegui pagar.
Ele ajudava nas contas da família.
–Serviço de entrega.
A moto de Luís Gillian avançava pela Amaral Gurgel. Sentido Zona Leste.
–Tudo parado. O que será?
Um morador de rua vertia sangue no asfalto da cidade.
–Se eu fosse médico… podia ajudar.
Curiosidade. Interesse humano. Bom coração.
Luís Gillian encostou a moto no meio-fio.
–Nossa… parece ser multitraumatismo vascular.
–Foi tiro mesmo, moço.
Uma briga entre traficantes, policiais e consumidores de crack.
–Veio bala de todo lado…
Luís Gillian tinha noções de primeiros socorros.
–Claro.
Um torniquete aqui, outro ali, e parte da hemorragia diminuiu.
Ao longe, ouviu-se uma sirene.
–Aguenta que a ambulância está chegando.
Era uma viatura policial.
Luís Gillian foi abordado sem simpatia.
–Documentação da moto. Rapidinho.
–Mas… o cara aqui está morrendo.
Já era tarde.
Os olhos do morador de rua se fecharam com um vago brilho de gratidão.
Os documentos da moto estavam em nome de outra pessoa.
–É meu primo, pô.
O fato de Luís Gillian ser negro não contribuiu para a situação.
A revolta do rapaz terminou com costelas quebradas e traumatismo craniano.
No pronto-socorro, Luís Gillian continua sua luta.
–Esse anestésico é opioide? Ou só paracetamol?
--Fica quietinho, meu amor.
Luís Gillian faz de conta que já está na residência médica.
Para passar no Enem, muitos jovens racham de estudar.
Mas, quando se trata de rachar a cabeça, a polícia tem diploma de mestrado e doutorado.
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