Com democratas no controle da Câmara, Trump enfrentará oposição inédita

Poucos dias após as eleições legislativas de novembro, o presidente dos EUA, Donald Trump, recorreu ao Twitter para manifestar sua frustração com a perda da Câmara para a oposição democrata : "A perspectiva de perseguição presidencial pelos democratas já está derrubando a bolsa de valores".

Um deputado democrata recém-eleito, Eric Swalwell, deu uma amostra do que está por vir. "Os dias de imunidade presidencial acabaram", disse, também pelo Twitter. "Acabou o passe-livre para lucrar dando acesso ao Salão Oval. Chega de conluio com a Rússia. E vamos descobrir se você é um sonegador de impostos. A América está colocando um freio em seus abusos. Bem-vindo à democracia."

Depois de reinar inconteste durante quase dois anos, com a Câmara e o Senado controlados pelo Partido Republicano, Trump agora se prepara para uma avalanche de investigações. Ao conquistar o controle da Câmara, os democratas ganharam o poder de fiscalização –podem abrir várias comissões parlamentares de inquérito e intimar integrantes do governo para depor.

Flancos não faltam. Vários legisladores eleitos já anunciaram que irão escarafunchar as declarações de imposto de renda de Trump, que o presidente, contrariando a tradição, não divulgou.

Os democratas também pretendem turbinar a investigação sobre a interferência russa na eleição de 2016 e o possível conluio com a campanha de Trump. O deputado republicano que supervisionava o caso, Devin Nunes, estava mais preocupado em achar uma conspiração contra Trump do que averiguar as trapaças russas.

A oposição ainda quer apurar se Trump está usando o poder da presidência para retaliar veículos de imprensa críticos ao seu governo, como CNN e The Washington Post.

Na chefia da Câmara, os democratas podem até abrir um processo de impeachment, precisam apenas da maioria simples dos votos. Mas quem realmente "julga" o presidente e decide se ele será afastado é o Senado –para isso, são necessários dois terços dos cem votos, e os democratas estão na minoria.

É bom lembrar que Trump não perdeu todo o seu poder. Com os republicanos no controle do Senado, ele mantém a capacidade de aprovar indicados para a Suprema Corte, por exemplo.

Trump já escolheu dois juízes bastante conservadores –Neil Gorsuch e Brett Kavanaugh–, que foram devidamente confirmados pela maioria republicana no Senado. Se outros se aposentarem, poderá indicar mais magistrados, consolidando maioria conservadora no tribunal, que decide sobre temas caros aos eleitores como direito ao aborto, casamento gay e porte de armas.

Patrícia Campos Mello é repórter especial e colunista da Folha. É formada em Jornalismo pela USP e tem mestrado em Business and Economic Reporting pela NYU. Foi correspondente em Washington de 2006 a 2010.

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